Fundada em 1978, a Associação de Estudo e Defesa do Património Histórico-Cultural de Santarém (AEDPHCS) completou, no passado ano, os seus 40 anos de existência. Tendo sido alvo, nos últimos anos, de um cuidado trabalho de recuperação, a Associação acabou por tomar nova sede na antiga Escola Prática de Cavalaria, nomeadamente, em sala disponibilizada pela Câmara Municipal, quase por debaixo da Torre da Trindade. Gustavo Pacheco Pimentel, Eduardo Tavares, Celso Braz, Susana Veiga Branco e Ana Carina Azevedo, são os seus novos dirigentes, segundo o último acto eleitoral, do dia 11 de Abril deste ano, pelo que os viemos conhecer, assim como as suas perspectivas e projectos.

A Associação esteve em risco de desaparecer. Entretanto, a direcção anterior conseguiu a sua reactivação. Como avaliam o trabalho que foi feito? Neste momento, a AEDPHCS está consolidada?
Eduardo Tavares – Sempre nos podemos e devemos interrogar sobre o que fazemos, pessoalmente e em conjunto, e por isso será sempre útil a uma associação olhar para o que tem feito ao mesmo tempo que avança. Nunca tudo corre bem, nem nunca ficará tudo por fazer. A actual direcção, que tem como Presidente o Gustavo Pacheco Pimentel, é quase a mesma da direcção anterior, em que fui eu Presidente. Houve apenas uma substituição. Não nos propusemos nunca fazer tudo o havia que ser feito, nem fazer melhor que ninguém. Mas quisemos que coisas importantes ficassem feitas. A primeira, e a mais importante, que fosse possível criar uma equipa de pessoas dispostas a ir fazendo o que era possível, não um trabalho de fazer vista, mas um trabalho de preparação a longo prazo. Uma equipa que se provou, não apenas capaz de realizar, mas sobretudo de realizar em conjunto, e de preparar o futuro.
Preparar o futuro significou criar condições para que a AEDPHCS possa vir a ser lugar de encontro de dois vectores fundamentais. O vector do conhecimento, sem o qual não existe defesa do património, e o vector da ligação aos jovens, desde a escola até à universidade. Todos são necessários. Para o vetor do conhecimento precisamos das pessoas mais velhas, que sabem aquilo que nunca poderemos saber… Ao mesmo tempo, para tudo precisamos dos jovens, da sua energia, sem a qual nada se faz. A Associação procurou ligar-se às outras entidades relevantes na área da defesa do património, aqui em Santarém, e a nível nacional. Ligação ao Museu Diocesano, à Fundação Passos Canavarro, ao Centro de Investigação Professor Doutor Joaquim Veríssimo Serrão, à ESES, assim como ao Círculo Cultural Scalabitano e ao Centro Cultural Regional – e participação na comissão organizadora do Fórum do Património.
Do que fizemos, destacaríamos talvez as Comemorações dos 40 anos da Associação, os Colóquios com Deolinda Folgado, com António Valdemar, com Padre Anselmo Borges e Guilherme d’Oliveira Martins, e com Jorge Custódio, e o trabalho piloto com as freguesias protocoladas no Projecto Património e Freguesias, as Uniões de Freguesias de São Vicente do Paúl e Vale de Figueira, e de Romeira e Várzea – mais avançado na primeira, com um excelente trabalho da Susana Veiga Branco, e que continuará por certo. Também o Protocolo para colaboração em estágios curriculares de formação num futuro curso de Artes e Património Cultural, da ESES, e a Participação da AEDPHCS no FÓRUM DO PATRIMÓNIO, foram momentos importantes para a preparação do futuro da Associação. Ponto fundamental da estratégia de futuro da Associação foi o reequilíbrio das contas, diminuindo as despesas ao mínimo necessário, e estabelecendo como princípio ter todos os custos das actividades cobertos de antemão. A Associação não tem grandes despesas e pode ter pois uma gestão prudente, evitando as situações que no passado a fizeram perigar.
O capital maior da Associação tem que ser o das pessoas, sócios e amigos, e das suas boas vontades… e nesse sentido temos que referir que a consolidação final da Associação está ainda dependente de conseguirmos trazer mais gente para a Associação. Gente com peso, com conhecimento científico, e vontade de participar – e gente com juventude e energia. Para o projecto que temos em mãos, de criação do nosso Observatório do Património, toda a ajuda será bem-vinda.

Quais são os principais objectivos e actividades elencadas, da actual gestão?
Gustavo Pacheco Pimentel – Em primeiro lugar, quero partilhar que quando integrei a direcção, no anterior mandato, tornou-se claro para mim qual o objectivo em que melhor poderia vir a colaborar: o crescimento pela descentralização. Eu sou formado em História, estudo o grande termo de Santarém na Idade Média, e por isso vinha com uma ideia dimensional de Santarém muito além da que vim encontrar. O Estudo e Defesa do Património Histórico-Cultural de Santarém, era tão claro para mim que se referia à totalidade da sua história, no tempo, mas também, inclusive, no espaço. Por isso, uma das maiores razões que considero ter contribuído para o isolamento da Associação, foi ter sido pensada, ao longo do tempo, apenas dentro da cidade, com as pessoas e para as pessoas, só da cidade. Santarém não é só isto, nem tão pouco só o seu concelho, nos actuais limites (datados de 1836 apenas). É preciso atender que nos séculos XII-XIII, por exemplo, estendia-se das zonas de Rio Maior a Montargil, e da Golegã a Benavente. Pelo que todo este território interessa, todas as histórias destes lugares interessam, pois constituem a própria história de Santarém, nomeadamente, na relação cidade-campo, como nos demonstra a História em qualquer cidade antiga. Pelo que, de todos, julgo ser este o meu, maior e mais caro, cavalo de batalha, para a Associação e para a Cidade: o crescimento pela afirmação descentralizada do património histórico-cultural scalabitano.
Nesta medida, não elencando o programa de actividades (que fastidioso seria), remeto-me a apresentar as principais linhas do programa da equipa, que se poderá encarar em três frentes distintas. Uma primeira, para “Expandir a Associação” em associados (e receitas), em área geográfica de influência (segundo o que já expliquei e que permita a identificação regional com a velha capital), assim como em relações institucionais (especialmente com as universidades, um dos maiores prejuízos da cidade nas últimas décadas). Uma segunda, para “Investir no Estudo” do património, desenvolvendo a compilação da bibliografia historiográfica (e não só) de Santarém, a reedição dos estudos mais importantes, a edição e apoio de novos, a promoção do estudo de temas scalabitanos junto das universidades, tal como a organização de colóquios e congressos (1 previsto). E uma terceira, para “Melhorar a Defesa” do património, com a criação de um Conselho Científico (para o pronunciamento de qualidade em matérias específicas) e de comissões temáticas de trabalho (a começar por um “Observatório do Património”, como já referiu acima o Eduardo, de modo que possamos dar resposta às situações mais urgentes de ameaça patrimonial). Como próxima actividade, fica o convite para a sessão inaugural do ciclo de conferências (que estamos a lançar sobre) “Os Historiadores de Santarém”, que contará com a presença do senhor professor João Carlos Brigola, Sábado 23 de Novembro, pelas 16 horas, na nova sede.

Recentemente foi adjudicada, pela autarquia, a obra de recuperação da Igreja de S. João de Alporão. Será, na óptica da Associação uma peça-chave para se começar a olhar para o património da cidade de outra forma? Faz falta um Museu em Santarém?
Gustavo Pacheco Pimentel – Uma peça-chave, não sei. Mas, mesmo tarde, é nosso dever louvar sempre o trabalho de salvaguarda. Agora, que faz falta um Museu, completamente. A começar pelo simples facto de que, além do Museu Diocesano de Arte Sacra, não existe por cá mais nenhum. É preciso assumir e reconhecer que uma Reserva Museológica – escondida, temporária e selectivamente exposta, onde as peças não estão ao contínuo alcance dos cidadãos, nem sequer dos investigadores, mas só de algumas poucas pessoas – não deve, de maneira nenhuma, ser (como tem sido) confundida com um Museu Municipal. Especialmente, porque isto, hoje em dia, para se ser “museu” é preciso ter e corresponder à categoria. Reparar, por exemplo, que uma ou mais “colecções visitáveis” não são automaticamente “museus”, pois então muito distintos, quer em requisitos ou capacidades.
Pelo que, sim, continua a ser uma grande falha, uma questão de atraso na Cidade, não com um, mas muitos responsáveis ao longo do tempo. Quanto a mim, o mais importante a reter, desta questão, é que não há sentido algum na autarquia promover quaisquer projectos museológicos para a Cidade, sem antes atender à prioridade da constituição de um bom Museu Municipal, decentemente instalado em lugar vocacional e próprio – como, por exemplo, o Convento de São Francisco (que a juntar às dependências anexas da antiga EPC, teria espaço mais que suficiente, quer para o efeito, quer para continuar a acolher eventos culturais). Mas o que falta não é só um museu. É preciso pensar mais além. E Joaquim Veríssimo Serrão pensou. Tinha um projecto cultural para Santarém, que constituiu ao longo da vida, e para o qual apelou na conferência proferida nos Paços do Concelho, a 22 de Dezembro de 1969, por ocasião da cerimónia de encerramento das Comemorações do Centenário da Elevação de Santarém a Cidade – já no mês que vem, portanto, há precisamente 50 anos. Pelo que a este assunto tornaremos, em tempo oportuno e semelhante intervenção.

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