O Tribunal de Santarém começa a julgar na quarta-feira o Centro Social Interparoquial de Abrantes, o seu presidente e um antigo técnico por burla e falsificação, por, alegadamente, terem inscrito indevidamente utentes para beneficiarem de apoios máximos do Estado.

Segundo a acusação do Ministério Público, a que a Lusa teve acesso, o presidente do Centro Social Interparoquial de Abrantes (CSIA), pároco da diocese de Abrantes (distrito de Santarém), e o técnico da instituição que coordenou o Projecto Homem, destinado à prevenção, tratamento e reinserção social de toxicodependentes acordaram entre si que as listas mensais para obtenção de apoios dos Ministérios da Saúde e da Solidariedade e Segurança Social “deviam ir sempre completas” para que o CSIA recebesse sempre a comparticipação máxima.

Nesse sentido, ambos são acusados de terem inscrito nas listas pessoas que estavam presas, que nunca tinham frequentado a valência indicada, que já tinham abandonado o projecto, que não acabaram a reabilitação e, por isso, ao contrário do indicado, não passaram à fase de reinserção, ou que eram alcoólicas e foram registadas como toxicodependentes.

Estas situações foram identificadas em processos de averiguações que abrangeram o período entre Janeiro de 2011 e Julho de 2012 e que se realizaram na sequência de uma denúncia feita em Janeiro de 2013 pelo técnico que é também arguido no processo depois de ter cessado funções na instituição.

As averiguações realizadas pela Inspecção-Geral das Actividades em Saúde detectou o pagamento indevido, no ano de 2011, de perto de 20.000 euros relativos à permanência no centro terapêutico de dois utentes num período em que estavam detidos e de quatro que estavam ausentes.

Nas averiguações do Instituto da Segurança Social foram detectados recebimentos indevidos de mais de 150 mil euros relativos a utentes declarados simultaneamente em mais do que um dos três apartamentos de reinserção do CSIA, simultaneamente no centro terapêutico e nos apartamentos e ainda de utentes que não concluíram a reabilitação e que, por isso, estavam impossibilitados de passar à fase seguinte (reinserção).

No total, a acusação identificou um valor de 199.216 euros recebidos indevidamente por dois Ministérios entre 2011 e o primeiro trimestre de 2013, sendo que o CSIA restituiu 143.437 euros aos Centros Distritais da Segurança Social de Santarém, Portalegre e Castelo Branco, no mês em que estes determinaram a devolução das verbas indevidamente recebidas.

O Projecto Homem, criado em 1997 pelo CSIA, possui a Comunidade Terapêutica João Guilherme, destinada à fase de tratamento e reabilitação, com 65 camas, 52 delas comparticipadas pelo Ministério da Saúde, e três apartamentos – em Abrantes, Ponte de Sor e Castelo Branco – destinados à reinserção social, com um total de 29 camas, comparticipadas pelo Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social.

No interrogatório feito em Julho de 2015 pela Polícia Judiciária, o presidente do CSIA remeteu para o coordenador do Projecto Homem, pessoa em quem depositava “total confiança”, a responsabilidade pela elaboração das listas, negando qualquer envolvimento em qualquer irregularidade.

O padre afirmou ter ficado “surpreendido” e “estupefacto” quando soube das denúncias contra si, o CSIA e o Projecto Homem em Janeiro de 2013, atribuindo-as à intenção do coordenador do projecto de o prejudicar “difamando-o”, o que motivou a apresentação de uma queixa-crime.

Segundo o pároco, a demissão do coordenador do projecto em Julho de 2012 ocorreu depois de uma série de desentendimentos iniciados em 2010, quando “boatos” sobre “comportamentos impróprios” daquele o levaram a tomar medidas às quais o técnico “não reagiu bem”, culminando na sua saída.

Os dois são acusados da prática, em co-autoria, de um crime de burla tributária, de um crime de burla qualificada e de um crime de falsificação, todos na forma continuada.

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