Uma quarta gravura com mais de 20 mil anos, que representa um cavalo, foi descoberta no vale do Ocreza, em Mação, sendo o segundo cavalo representado sem cabeça ali encontrado, anunciaram os arqueólogos.
Em declarações à agência Lusa, a investigadora e arqueóloga do Instituto Politécnico de Tomar e Instituto Terra e Memória em Mação, Sara Garcês, disse que a arte paleolítica encontrada gravada na rocha é representativa de um cavalo sem cabeça, a exemplo da primeira gravura encontrada naquele vale, no ano 2000 – o ‘Cavalo do Ocreza’ – e que, apesar de ser mais pequena em dimensão, pode indiciar “um padrão” de estilo rupestre.
“É bem mais pequena do que aquelas que temos estado a encontrar, e também não mostra evidências de ter cabeça, o que é bastante peculiar. Começamos a achar que, neste vale em particular, é um padrão, é uma escolha de estilo não representar a cabeça dos animais”, disse.
Destacando “a forma e a figura do cavalo” representado, a arqueóloga classificou-o de “muito interessante” pela novidade.
A primeira gravura paleolítica encontrada no vale do Ocreza foi um cavalo sem cabeça, no ano 2000, e foi também a primeira encontrada abaixo do Côa e na área do complexo de arte rupestre do Vale do Tejo.
Poucos meses depois, arqueólogos portugueses e internacionais referenciavam mais de 50 gravuras no vale do rio Ocreza de cronologia mais recente, que originaram visitas turísticas à zona.
Hoje, mais de uma centena de gravuras estão identificadas no vale do Ocreza, com diversas tipologias e cronologias, quatro das quais do Paleolítico Superior: a do ‘cavalo do Ocreza’, descoberta em 2000, a de um painel com vários animais, incluindo um auroque, em 2021, de novo um auroque, em 2023, e agora, em 2024, outro cavalo.
“O facto de sentirmos que este vale tem um potencial arqueológico bastante grande, fez-nos começar este novo projecto muito direccionado para as figuras do Paleolítico e que nos mostra também que, em contexto de escavação, é possível encontrar este tipo de figuras e que o vale do Ocreza tem apresentado cada vez mais evidências de que, debaixo dos sedimentos, as gravuras também se encontram”, destacou Sara Garcês.
A arqueóloga referia-se a um trabalho de prospecção que decorre até 2026 no fundo do vale do Ocreza, com um tipo de rocha composto por xistos, “extremamente fácil de gravar e que mostra uma conservação bastante boa das gravuras”.
O arqueólogo Telmo Pereira, da Universidade Autónoma de Lisboa (UAL) que participa com Sara Garcês na coordenação dos trabalhos de prospecção, destacou à Lusa a “imensa satisfação” pela descoberta e importância de um “olho treinado” para o que se procura, dadas as dificuldades impostas pela luminosidade, com as gravuras a serem perceptíveis apenas em determinadas horas do dia.
“É sempre um momento especial, porque elas normalmente não são assim [descobertas] de caras… este, como era mais pequeno e até está numa posição mais discreta, nós não o vimos logo até porque é muito mais fácil encontrar estas gravuras quando a luz é rasante”, disse o investigador.
“Existem ali várias gravuras que, a determinadas horas do dia, nós podemos estar a olhar para a pedra e não as vemos. Há uma que tem uma particularidade que tem ali meia hora, onde se vê mesmo muito bem e o resto do dia praticamente não se vê e, portanto, tendo isso em conta, foi mesmo ganhar o dia”, declarou.
Segundo o arqueólogo, o objectivo agora é associar às gravuras artefactos com sedimentos ou outra matéria que possam ser datadas.
“Portanto, associar, digamos assim, um acampamento, mesmo que fosse temporário, a essa arte rupestre”, afirmou.
“Esse será o próximo objectivo (…) encontrarmos esse acampamento que nos permita fazer a associação entre a idade, os artefactos, a arte rupestre e o comportamento das pessoas e a sua sobrevivência em determinado período, que sabemos que provavelmente terá sido de crise climática”, disse.