O Núcleo do Ribatejo da Associação Alzheimer Portugal diz estar “no limite da capacidade”, numa altura em que regista um aumento de pedidos de ajuda e que planeava expandir o apoio.

“Estamos sobrecarregados. Para além do acompanhamento direto a pessoas com demência e cuidadores, damos formação a instituições e desenvolvemos projetos de investigação e intervenção”, disse a psicóloga clínica responsável pelo núcleo, Filipa Gomes.

Em declarações à Lusa, a responsável sublinhou a necessidade de o núcleo integrar áreas como fisioterapia ou aconselhamento jurídico, “mas não tem meios para isso”.

“O que fazemos é tentar colmatar, mas precisamos de mais recursos e de uma resposta pública estruturada. A demência vai aumentar e não podemos continuar a reagir apenas quando os casos já estão em fase avançada”, acrescentou.

Criado em 2004, em Almeirim, no distrito de Santarém, o Núcleo do Ribatejo dispõe atualmente de vários gabinetes de proximidade em parceria com municípios como Santarém, Entroncamento, Rio Maior, Mação e Salvaterra de Magos.

Essa resposta, explicou Filipa Gomes, surgiu da constatação de que “a maioria das pessoas com demência são idosas, muitas já não conduzem e os transportes públicos são escassos”, pelo que era necessário “levar os serviços às populações”.

No último ano e meio, a direção do Núcleo do Ribatejo registou um “aumento substancial” de pedidos de apoio de pessoas com demência, situação que atribui a diagnósticos mais precoces e ao combate ao estigma associado à doença.

A procura “tem crescido em todos os concelhos do distrito de Santarém”, disse a psicóloga clínica, salientando que os gabinetes de apoio existentes “estão já todos preenchidos”.

Apesar de não existirem dados estatísticos oficiais que quantifiquem o aumento de pedidos de apoio, a psicóloga sublinha que essa realidade é evidente para quem trabalha diretamente com as populações.

“É a nossa perceção, baseada na experiência acumulada de mais de 20 anos no distrito. O número de pessoas que nos procura tem crescido de forma transversal em todos os concelhos e os gabinetes de apoio estão atualmente todos preenchidos”, afirmou.

A ausência de dados formais é, aliás, uma das lacunas que a responsável identifica na resposta pública à demência.

“Muitas pessoas com sinais evidentes da doença não têm diagnóstico formal, porque os especialistas são escassos e os tempos de espera no SNS são longos. Isso impede que se conheça a real dimensão do problema”, explicou, defendendo que os médicos de família deveriam poder realizar diagnósticos, como previsto na Estratégia Nacional para a Saúde das Pessoas com Demência, cuja implementação no terreno continua limitada.

Uma maior sensibilização dos médicos para sinais precoces de demência, a crescente cobertura mediática do tema e a diminuição do estigma social são fatores que, para Filipa Gomes, explicam o aumento da procura de apoio.

“As pessoas sentem-se hoje mais à vontade para pedir ajuda, quando antes havia vergonha ou receio do que os vizinhos pudessem pensar”, afirmou.

Embora exista uma Estratégia Nacional para a Saúde das Pessoas com Demência, a responsável considera que “no terreno a sua implementação tem algumas lacunas”, pelo que defende a criação de um plano nacional para as demências, que integre saúde, apoio social e enquadramento jurídico.

“Hoje as respostas são fragmentadas: se é uma questão social, vai-se a um lado; se é de saúde, a outro. Falta uma visão pública integrada”, afirmou.

Entre os projetos atualmente em curso no Núcleo do Ribatejo da Associação Alzheimer Portugal, destaca-se o trabalho sobre contenções físicas e químicas, prática ainda comum em algumas instituições.

“Durante anos foi normal amarrar pessoas com demência a cadeiras ou administrar medicação para as manter sedadas. Nós defendemos alternativas centradas na dignidade e nos direitos da pessoa”, explicou a psicóloga.

O núcleo acompanha semanalmente pessoas com diagnóstico confirmado, através de estimulação cognitiva e apoio psicológico, e presta apoio social imediato às famílias, nomeadamente no acesso ao estatuto de cuidador informal ou ao processo legal de acompanhamento.

“É fundamental que os familiares compreendam que não podem tomar decisões em nome da pessoa sem esse enquadramento legal”, frisou.

A nível nacional, a Alzheimer Portugal conta com cerca de 150 colaboradores, delegações no Norte, Centro, Lisboa e Madeira, além de estruturas residenciais e centros de dia especializados.

Recentemente, a associação duplicou a capacidade da sua Estrutura Residencial para Pessoas Idosas, em Lisboa, passando de 36 para mais de 70 utentes.

Apesar do crescimento, Filipa Gomes alerta que há zonas do país que continuam “no vazio, sem qualquer apoio especializado”.

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