Celestino Graça, um Homem de excelsas qualidades que, como, em luminosa síntese sublinhou o saudoso Amigo António Cacho, “Disse não à mediocridade e superou os seus próprios defeitos”, nasceu no lugar do Graínho, no concelho de Santarém, a 9 de Janeiro de 1914, vindo a falecer em 24 de Outubro de 1975. 

Na oportunidade da evocação de tão proeminente figura, não poderemos deixar de referir a sua empenhada acção na fundação da “Briosa” Associação Académica de Santarém (1931), de que foi dirigente, atleta e seu representante na Associação de Futebol de Santarém; a criação da Feira do Ribatejo, em 1954, certame regional de que Celestino Graça foi o principal obreiro e dinamizador à frente de uma plêiade de notáveis ribatejanos – entre os quais pontificavam os saudosos Dr. Luís Hilário Barreiros Nunes, presidente da Comissão Executiva durante os primeiros anos, Caetano Marques dos Santos, António Ferreira Madeira Cacho, João Gomes Moreira, José Júlio Rosa Eloy, Luís Carlos da Silva, Joaquim Peralta Fernandes, Joaquim Ferreira Campos e Dr. Carlos Augusto de Castro – e que dez anos volvidos sobre a edição inicial haveria de ver a sua importância reconhecida oficialmente com a elevação ao estatuto de Feira Nacional de Agricultura; a edificação da Praça de Toiros de Santarém, inaugurada a 7 de Junho de 1964, e a sua exploração a favor da Santa Casa de Misericórdia local, nas temporadas de 1970 a 1975; a realização do Festival Internacional de Folclore de Santarém, no âmbito da Feira do Ribatejo, em 1959, e a fundação do CIOFF – Conseil International des Organizateurs de Festivals de Folklore, em 1970, de que foi delegado nacional até à data da sua morte; e o seu valioso estímulo na constituição de diversos ranchos folclóricos no Ribatejo, para além dos que ele próprio fundou – o Rancho Folclórico dos Pescadores do Tejo, nas aldeias avieiras de Faias e Cucos (Benfica do Ribatejo), o Rancho Folclórico do Bairro de Santarém (Graínho e Fontaínhas), e os Grupos Infantil de Dança Regional e Académico de Danças Ribatejanas, de Santarém, estes últimos que dirigiu até à data da sua morte. 

Regente Agrícola de formação, Celestino Graça foi um dos mais conceituados técnicos da sua geração, tendo prestado serviço na X Brigada Técnica Agrícola onde foi responsável pelos cursos de podadores de olival e de tractoristas e pela introdução da cultura do cânhamo em Portugal, sendo autor do livro “A Cultura do Cânhamo”, publicado em 1945, pela Livraria Sá da Costa.

O seu empenho em valorizar a região do Ribatejo levou-o a intervir activamente na imprensa e na rádio, no que sempre evidenciou uma enorme capacidade de comunicação, destacando-se a sua colaboração na antiga Rádio Ribatejo, onde apresentou um programa sobre agricultura, e no Jornal “Correio do Ribatejo”, onde versava os assuntos mais diversos, relacionados com a cultura ribatejana e os interesses de Santarém e da nossa província. Porém, também na Televisão teve oportunidade de exaltar as potencialidades de Santarém e do Ribatejo, o que sempre fez de forma eloquente e credível, designadamente no Programa “25 Milhões de Portugueses”, de tão grata memória.

Celestino Graça, pelo empenho posto em tudo o que se propôs realizar e pelo exemplo que constituiu a sua abnegada intervenção, exerceu grande influência a nível regional, despertando Santarém para um período de expressivo progresso, colocando-a a par das cidades mais desenvolvidas do nosso país.  

Numa afirmação de inegável competência e determinação Celestino Graça foi capaz de congregar em seu torno vontades e pessoas para desenvolver a nossa terra. Foi um Homem vanguardista no seu tempo, que, no entanto, continua a ser ignorado por muitos que o consideram retrógrado, apenas pelo facto de defender as nossas tradições culturais e de haver logrado fazer obra durante o regime deposto pelo 25 de Abril, acusando-o, injustamente, de conivência com o Estado Novo, com o qual, bem ao invés, não se identificava e nunca serviu.

Mas, Celestino Graça recusou honrosos convites, nomeadamente para o cargo de Presidente da Câmara Municipal de Santarém, de Governador Civil do Distrito de Santarém e até para Deputado na Assembleia Nacional. Alguns destes convites formulados em mais do que uma circunstância. Aliás, quando Celestino Graça foi agraciado, em 29 de Junho de 1959, por Decreto do Presidente da República Almirante Américo Tomás, com o grau de Oficial da Ordem do Mérito Agrícola, só aceitou esta distinção se na mesma oportunidade fossem distinguidas outras personalidades relacionadas com a organização da Feira. O mesmo sucedeu a 18 de Julho de 1972, quando o Presidente da República lhe concedeu o grau de Comendador da Ordem do Mérito.

Na área do folclore Celestino Graça pugnou sempre por uma fiel representação dos usos e costumes dos nossos antepassados, não consentindo o seu abastardamento, pois, a estima e o respeito que nutria por esta gente simples – com quem convivia diariamente na sua actividade profissional ou como empresário agrícola – não lhe permitia outra atitude que não fosse esta.

Quando apresentava os seus grupos folclóricos Celestino Graça preocupava-se em contextualizar a realidade social do nosso Povo, exaltando-o pelas suas virtudes e pelas aptidões de que sempre deu provas, e nestas oportunidades todos podiam ficar a conhecer melhor como era a vida pobre e difícil dos camponeses ribatejanos.

Nunca se eximiu a desconfortos, mesmo de cariz político, de que é um eloquente exemplo a apresentação em público do “Fadinho do Pobre”, cantiga escrita pelo categorizado músico Bertino Coelho Martins e que era cantada por Ivone Faria da Silva, com quadras recolhidas no “Cancioneiro do Ribatejo”, compilado por Alves Redol. As quadras escolhidas para esta cantiga revestiam-se de uma subtil crítica social.

A PIDE-DGS (Polícia Internacional e de Defesa do Estado – Direcção Geral de Segurança) advertiu Celestino Graça de que não deveria apresentar esta cantiga em público, e quando os Grupos Infantil e Académico actuavam em Santarém era normal aparecer algum agente que consultava o reportório a exibir. Celestino Graça nunca incluía esta cantiga no programa, porém acabava por a apresentar quase sempre, tanto mais que esta era uma cantiga muito apreciada pelo público.

Também ao nível da organização do Festival Internacional de Folclore de Santarém Celestino Graça conseguiu integrar no elenco dos países estrangeiros alguns grupos do leste europeu com os quais Portugal não mantinha relações diplomáticas. Esta situação exigia uma grande responsabilidade de Celestino Graça, que tinha de empenhar a sua honra e a sua palavra perante as entidades oficiais, e foi assim que grupos da Checoslováquia, da Arménia, da Hungria e da Jugoslávia puderam actuar em Santarém ainda antes do 25 de Abril de 1974.

Em 17 de Setembro de 1977 foi inaugurado um busto erigido em sua memória nas imediações da Praça de Toiros, que também nessa época passou a ser designada por Monumental “Celestino Graça”, e o Festival por si fundado em 1959 passou a denominar-se Festival Celestino Graça – A Festa das Artes e das Tradições Populares do Mundo.

Construir o futuro com o respeito pelo passado é a melhor homenagem que se pode prestar a um Homem como foi, é e será Celestino Graça, que continua presente no nosso coração e na nossa grata memória. 

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