A judoca Patrícia Sampaio conquistou a medalha de bronze em -78 kg, nos Jogos Olímpicos de Paris, a quarta medalha do judo português em Jogos Olímpicos, após as de Nuno Delgado (Sydney2000, -81 kg), Telma Monteiro (Rio2016, -57 kg) e Jorge Fonseca (Tóquio2020, -100 kg).
Nesta entrevista ao ‘Correio do Ribatejo’ a judoca, natural de Tomar, descreveu o momento da conquista e o orgulho que teve em ser porta-estandarte de Portugal nos Jogos. Elege o irmão como “primeiro ídolo e inspiração” e a Sociedade Filarmónica Gualdim Pais como clube “do coração”.
A Madrinha dos ‘Super Judocas’, abraçou o programa de Judo Adaptado da Associação de Judo do Distrito de Santarém, por o judo ser um desporto “inclusivo e para todos”: “Ser uma fonte de inspiração foi sempre algo que quis, dizerem-me que eu inspiro ou que querem ser como eu é um dos troféus mais impactantes que recebo”.
Patrícia Sampaio deixa a mensagem a quem queira seguir a modalidade: “é sempre uma mensagem de trabalho e dedicação acompanhada de humildade e vontade, porque só assim podemos progredir e levar o nosso desporto mais além, sejamos nós atletas, treinadores ou qualquer outra função”, conclui.
A Patrícia Sampaio conquistou o bronze em -78 kg em Paris2024, ao bater a japonesa Rika Takayama por duplo waza-ari. Alcançou a 29.ª medalha olímpica do desporto português, a primeira nessa edição dos Jogos. O que sentiu no preciso momento da vitória? Qual foi o seu primeiro pensamento?
No momento da vitória, confesso que fiquei apática, sem saber como reagir, ainda a tentar perceber se era realidade ou tudo não passava de um sonho. Demorei algum tempo até me “cair a ficha” daquilo que tinha acabado de conquistar. Quando isso aconteceu, senti uma emoção e felicidade imensas, e que todo o meu trajecto tinha valido a pena para chegar ali.
Teve direito a ser porta-estandarte de Portugal nos Jogos de Paris. Qual foi a sensação?
Sempre olhei para os porta-estandartes com muita admiração, por serem escolhidos para levar a bandeira do país. Ser agora eu uma dessas pessoas, a carregar um símbolo da nossa nação com tanta importância, foi para mim um orgulho e mais uma fonte de alegria gigante. Foi como se transportasse Portugal nas minhas mãos.
Os seus primeiros Jogos Olímpicos foram em Tóquio, após um período complicado, com algumas lesões que lhe condicionaram o apuramento. Até agora a lesão mais grave aconteceu em Outubro de 2020, no Grand Slam da Hungria. O que sentiu na altura? Alguma vez pensou em atirar a toalha ao chão?
Esse foi um momento muito difícil de lidar, em que era jovem e não sabia como reagir nem estava preparada para enfrentar tal coisa. Senti-me por momentos sem chão e sem forças para o desafio. No entanto tinha sempre o objectivo dos Jogos Olímpicos em mente e decidi que me iria preparar para isso o melhor possível, mediante as minhas condições e limitações físicas. Tive pessoas muito importantes do meu lado que me acreditaram e me ajudaram a continuar a acreditar em mim e que me auxiliaram de todas as formas possíveis na minha recuperação.
O ano de 2019 colocou-a como a melhor júnior mundial da sua categoria, nos -78 kg, na qual conquistou em Setembro o segundo título europeu na Finlândia, e em Outubro o terceiro bronze em Mundiais do escalão, em Marrocos. Convive-se bem com estes feitos?
Estes feitos fazem parte de um caminho percorrido em direcção a um objectivo maior – o Olimpo. Sempre fui uma pessoa ambiciosa e estas conquistas fizeram-me sempre querer mais e melhor, e foi isso que sempre me ajudou a chegar mais longe. Convivo bem com esse percurso e conquistas e sinto-me muito orgulhosa de mim mesma por elas.
Foi importante, em 2020, a conquista do prémio de Atleta Feminino do Ano da Confederação do Desporto de Portugal? Um ano antes recebeu a Medalha Municipal de Valor Desportivo, grau de ouro. Já depois de Paris a Câmara da sua cidade atribuiu o seu nome ao pavilhão municipal… Como vê todas estas homenagens e distinções?
Homenagens e distinções são sempre uma fonte de reconhecimento e de felicidade para mim. Não trabalho pelo reconhecimento ou recompensas, mas elas advêm do meu trabalho e é sempre gratificante saber que reconhecem o nosso valor e dedicação. As homenagens e distinções deste ano elevaram a fasquia, tendo em conta que foram as mais grandiosas que tive até hoje, e deixaram-me realmente feliz.
Patrícia Sampaio nasceu em Tomar, em 1999, quando é que descobriu que o Judo era o grande objectivo da sua vida?
Pratico judo desde os 9 anos e aos 15 comecei a integrar o circuito mundial de competição de cadetes. No ano seguinte,
tornei-me número 2 mundial da minha categoria e fui vice-campeã da Europa. Acho que foi aí que tive realmente o clique de que seria capaz de conquistar algo em grande no judo.
Começou a acompanhar o percurso do seu irmão, Igor Sampaio, hoje seu treinador e na altura atleta na Sociedade Filarmónica Gualdim Pais. Foi a sua grande referência no princípio da carreira? É fonte de inspiração?
O meu irmão foi o meu primeiro ídolo e inspiração. Foi graças a ele que descobri e comecei a praticar judo.
Patrícia Sampaio estuda comunicação e no futuro quer ser jornalista de desporto. Porquê jornalismo e até quando o judo continuará a ser prioridade para si?
Gosto de ter possibilidades e de criar oportunidades para o futuro, para que na altura possa decidir o que fazer mediante o que achar que me deixa mais feliz e completa, como o judo me faz actualmente.
Jornalismo foi uma opção, porque gostava muito de escrever e da área da comunicação e seria uma hipótese de continuar ligada ao desporto e ajudar a difundi-lo.
O judo, nomeadamente a alta competição, continuará a fazer parte da minha vida enquanto tiver capacidade e vontade de que assim seja.
A universidade e o investimento no judo, com dois títulos europeus em juniores e três subidas ao pódio em Mundiais, obrigam-na a concentrar a sua vida em Lisboa. O coração permanece na Sociedade Filarmónica Gualdim Pais, em Tomar?
O coração permanece em Tomar e na Gualdim Pais e, sempre que possível, é lá que eu me encontro também.
Como vê o trabalho que é desenvolvido, no distrito em geral e em Tomar em particular, em prol da modalidade?
O judo tem crescido e se destacado em termos demográficos e qualitativos a nível da cidade de Tomar e do distrito de Santarém. Penso que é, cada vez mais, uma modalidade escolhida pelas crianças e pelos próprios pais. No nosso distrito tentamos promover este desporto a todos os níveis, não apenas na vertente regular de competição, o que ajuda também a demonstrar que este é um desporto para todos, e isso é muito importante para o crescimento da modalidade.
A cidade de Tomar já entende também o potencial do judo e dos atletas que aqui temos e tem-nos dado um apoio crescente e confiança para continuarmos a investir no nosso percurso.
Aceitou ser a madrinha dos Super Judocas, um programa de Judo Adaptado da AJDS, que pretende combater a exclusão social. Acredita ser já uma fonte de inspiração e exemplo a seguir por todos eles?
Como dizia, é importante mostrar como o judo é um desporto inclusivo e para todos. Este programa de Judo Adaptado foi uma excelente iniciativa, que prontamente aceitei abraçar e que agradeço imenso o convite. Ser uma fonte de inspiração foi sempre algo que quis, dizerem-me que eu inspiro ou que querem ser como eu é um dos troféus mais impactantes que recebo. Acredito que para algumas pessoas já seja uma fonte de inspiração em alguma coisa e isso deixa-me muito satisfeita.
Que mensagem gostaria de deixar aos atletas, treinadores e clubes da região, bem como a quem queira iniciar a prática desta modalidade?
Sou suspeita para falar, porque sou uma apaixonada por judo e faço disto a minha vida, mas esta é uma modalidade muito completa, desafiante e interessante, que nos molda e torna melhores não só como atletas, mas também como pessoas. Com o judo tornei-me numa versão de mim mesma muito mais resiliente, organizada, ambiciosa e capaz de me superar e transcender. Isto porque tracei desde cedo os meus objectivos e tomei as minhas decisões em prol dos mesmos.
A mensagem que gosto de deixar é sempre uma mensagem de trabalho e dedicação acompanhada de humildade e vontade, porque só assim podemos progredir e levar o nosso desporto mais além, sejamos nós atletas, treinadores ou qualquer outra função. Claro que, sendo felizes e gostando do que fazemos, tudo se torna muito mais fácil.
JPN