«Aqui jaz Pedrálvarez Cabral e Dona Isabel de Castro, sua mulher, de cuja é esta capela e de seus herdeiros, a qual depois da morte de seu marido foi Camareira-Mor da Infanta Dona Maria, filha d´El-rei D. João Nosso Senhor… (c.1538). Reza em letra gótica o epitáfio da campa do Descobridor do Brasil (1468-1520) na igreja da Graça, em Santarém. Na Catedral do Rio de Janeiro existe outra lápide sepulcral que elucida «Aos 30 de Dezembro de 1903, sendo Arcebispo desta Arquidiocese, D. Joaquim Arcoverde de Albuquerque Cavalcanti, foi aqui depositada uma urna de chumbo e madeira contendo os resíduos mortuários de Pedro Álvares Cabral, descobridor do Brasil, extraídos aos 14 de março de 1903 da sua sepultura na igreja de Nª. Srª da Graça, de Santarém, Portugal, onde desde 1529 se achavam em jazigo de família.» Explica este segundo epitáfio – mandado colocar pelo Arcebispo Arcoverde que os restos mortais foram levados da Graça em 1903 e já lá estavam, desde 1529. Acontece que nesta data Dona Isabel de Castro (sobrinha do grande Albuquerque), que jazia junto do marido, segundo a lápide da Graça, ainda era viva (f. 1538) e viúva de Cabral (sepultado provisoriamente na igreja de Vera Cruz da Ribeira – vidé túmulo vazio lá), do qual o epitáfio pouco diz em comparação com o que adianta da esposa. Além de terem enterrado esta senhora em vida, isto da trasladação em 1903 coloca vários problemas legais que deixo de lado para que a/o leitor/a ilustre, que os conhece, não desista – enfastiada/o com tanta erudição transposta dalgum smarphone ou I. A. a martelo – , de ler esta crónica até ao fim, a qual tem, ao diante, coisas ainda mais estranhas não conhecidas destas duas modernas digitais entidades, apanhadas a cão. Há em Belmonte, desde 1962, outro lugar com as cinzas de Cabral lá nascido, parece que doados pela edilidade scalabitana do remanescente levado para o Brasil em 1903, se é que não levaram tudo. E já não devia restar muito nesse ano, daquilo que foi encontrado na sepultura da Graça no ano de 1882. Nesta última data, a primeira de que há memória em que vasculharam os restos mortais do imortal capitão-mor da maior armada que até àquele ano de 1500 foi mandada à Índia – sim o Brasil foi descoberto numa viagem à Índia – descobriram na sepultura de Santarém, três esqueletos humanos, dois do sexo masculino (de Cabral e do filho António, já que o Fernão como é sabido morreu no naufrágio da nau S. Bento, capitão desta e matalote que tinha sido do Poeta), um do feminino, e…uma cabra. Se não foi graça dalgum violador de túmulos anterior – ou pré anti-colonialista/islamo-esquerdista europeu avant-la- lettre de hoje –, dos túmulos da Graça, arremessando para o sepulcro dos Cabrais o seu símbolo, não sei que fosse. Dizem os heráldicos saberes, a desculpar aquela profanação meio diabólica, herética etc. que a cabra mais não era que um dos símbolos do brasão da família, duas cabras passantes, armadas de púrpura e preto, tendo por timbre uma das cabras do escudo. Aqui está o que foi. O que não se sabe é do paradeiro que levaram, além da cabra, os esqueletos humanos, e se no túmulo da Graça, com tanto remexer ainda resta algum osso ou grão de cinza do Inventor do Brasil. Que o foi, embora lhe chamem na Rede dos parvos e fora dela, coisa piores. Vejam-se alguns exemplos destas.
Abra a insigne leitora o seu computador, digite a Wikipédia sobre a Igreja da Graça de Santarém, e leia «Neste templo, monumento nacional, desde 1910, encontra-se sepultado Pedro Álvares Cabral, INVASOR DO BRASIL». Percebeu Vª Exª? Eu não. Não entendi se é o «invasor do Brasil» que está sepultado desde 1910 ou a igreja monumento nacional. Quanto ao infame aposto de Cabral não tenho dúvidas. Paira sobre esta Terra, Europa e Américas sobremodo, um espectro. O espectro de um wokismo ignaro, infelizmente mascarado de sapiente, humanista e progressivo. De Esquerda sobremodo, com mágoa o digo. A base são conclusões abusivas de conceitos que começaram a tomar corpo na Europa com Rousseau, filósofo, contra Aristóteles, da teoria do «bom selvagem» numa Arca de Noé a vogar no Sena com lobos e pombas de braço dado; Diderot e a crítica dos regimes monárquico-ultramontanos que seguiram por Voltaire contra um cristianismo afogado no luxo dos prelados e papas – que o Arcebispo Bartolomeu dos Mártires já apontara –, que viria a desembocar na Revolução Francesa cujos ideais de igualdade, liberdade e fraternidade têm vigorado até agora; tudo sistematizado de forma genial, ainda que inválida na síntese, por Marx, com a luta de classes, emancipação proletária e etapas necessárias para a alcançarem através do materialismo dialéctico, versão apurada do evolucionismo de Hegel. O problema está naquilo da passagem da tese para a antítese e desta para a nova síntese. Aqui é que está o gato mais a ascensão moderna do wokismo e cegueira dele, política, histórica e antropológica com os respectivos antolhos. Os heróis do passado passaram a vilões machistas e colonialistas do presente. A Mulher vai ser o futuro do Homem, anunciado por Aragon, e muito melhor que ele, mesmo de burka. A Europa onde foi inventada a Liberdade e os Direitos do Homem – machistas, claro – e daqui levadas pelos Pais fundadores para os Estados Unidos da América com a invenção da Democracia, deve vir tudo abaixo. O lema «Proletários de todo o mundo uni-vos» mudou para «Minorias de todo o mundo ao poder» sobre o comando do islamo-esquerdismo europeu de braço dado com o feminismo assolapado de quem pugna pela liberdade da Mulher mas só do mediterrâneo para cá. Passado bom para esta gente apenas o do bife, perdão, alface biológica. Assim chegamos à ideia de que os Descobrimentos do «homem branco» mataram o «bom selvagem» rousseauniano, e que Portugal é que inventou o esclavagismo em África ainda antes de Spartacus se revoltar contra Roma, levado para o Brasil e resto do mundo. Cabral, «invasor do Brasil» etc. vem daqui. O resultado aí está na Europa e afins com imigrações sem regra, a granel, por causa da má-consciência que rói os «europeus colonialistas». Em resposta, temos agora a direita extrema por todo o lado num calcar dos valores humanistas, liberdade e fraternidade, protestando contra o denegrir da História como ela foi – deturpada pelos wokistas –, bloqueando, pouco a pouco uma esquerda que a si-mesmo se bloqueou sem consciência de si nem da albarda. A leitora ilustre desculpe o parêntesis, mas é preciso como fez o outro limpar as cavalariças de Augias em metáfora de burros. Quem lhe vai contar o que era o Brasil antes de Cabral e dos portugueses é o Damião de Goes, que Vª Exª já leu mas talvez sem atentar neste particular dum conjunto de tribos – antropófagas muitas – dialectos sem fim; ciência quase nenhuma, além da de caçarem os nossos irmãos em Darwin, os macacos, quando se lhes acabava a dispensa dos humanos caçados entre eles. Isto é importante pois já tivemos, com tanto wokista, um Presidente que quis abrir os cordões à Bolsa dos impostos pagos por Vª Exª e o resto dos portugueses para indemnizar os povos colonizados por Portugal; o Padrão dos Descobrimentos, a estátua do padre Vieira – o maior defensor dos índios daquele tempo – e dezenas de estátuas, grafitados por imbecis que até quiseram transformar a praça do Império numa sanzala com cabanas do Gungunhana e as dele quarenta mulheres ao lado. Portugal indemnizado pelo pagamento de direitos autorais da Língua Portuguesa que falam; cidades e casas que lá deixamos do Estado e colonos escorraçados e mal pagos; igrejas, estradas e barragens que construímos; a Religião que grande parte usa; a Cultura ocidental, a mais avançada do planeta que lá ficou e, mal ou bem, ajudou à invenção que os portugueses fizeram daquilo que era um cadinho de tribos inimigas numa terra sem nome; além do dinheiro já dado para o restauro das perdas que tiveram em guerras fraticidas depois de independentes etc. A tudo isto e aos costumes de canibalismo (hoje cartéis da droga, corrupção de Estado etc.), este Presidente diria nada se o deixassem pagar a décima ao wokismo. Escute-se uma pequena amostra do muito e horrendo que conta, do esclavagismo no Brasil antes de Cabral, o probo e honrado Damião de Goes (Crónica de D. Manuel, 1565), mandado mais tarde ao queimadeiro pelos wokistas da época para ilustração dos actuais.
«Começam entre eles (indígenas do Brasil), as guerras nos meses de Fevereiro e Março. Alguns dos que cativam, principalmente os velhos, comem logo, os outros vendem ou levam presos em cordas. Aos cristãos que cativam, antes de os comerem, arrancam barbas e cabelos. Quando querem fazer alguma festa matam algum destes cativos. Trazem com eles cabacinhas de cabeças humanas, postas numa flecha dentro da qual fazem fumo que tomam e se embriagam, fazendo gestos ameaçadores. Ao cativo, preso por uma corda fazem bailar e o levam até um curral arremessando-lhe pedras, dizendo pelo caminho injurias e que o vão comer. Depois, com uma espada grande de pau o ferem à sua vontade e matam. Cortam-no em pedaços que dão às mulheres para lançar no fogo, onde os chamuscam como a porco e assam (é cruento isto por isso a poupo, cara leitora, a uma pintura da época que poderá ver no «Relato da vida de Hans Staden, Marburg 1557»). No fim comem dele as crianças, mulheres e homens, fazendo presentes uns aos outros». A leitora está horrorizada mas se como Tomé quiser ver um Xavier Coutinho, capitão da Baía, devorado ate às botas pelos tupinambás, vá ao solar dele nas Beiras, onde poderá examinar um retrato elucidativo. Vª Exª leu a Carta de Pêro Vaz de Caminha, mas no mesmo dia de Maio de 1500, enviada de Porto Seguro, há uma outra mandada ao rei Manuel pelo Físico Mestre João? E o que diz este bacharel e criado d´El-rei a certa altura é que «Ontem entendemos por acenos (dos indígenas) que de outra ilha vêm aqui almadias pelejar com eles e os levam cativos». Mas, se quiser uma maior autoridade nisto poderá ler «Os Canibais» do grande Montaigne, que em 1565, conheceu no Porto de Ruão dois tupinambás, trazidos para a Europa pelos franceses, contratou um por criado o qual lhe foi contando tudo aquilo que este livro contém de horrores já descritos pelo nosso Damião, lamentado o Montaigne a rir que «só é pena não usarem calças». As/os wokistas-feministas deverão gostar disto das calças. Gente que jura que foram Cabral, sepultado na Graça, e os outros portugueses da grande Aventura dos «Descobrimentos» – para a Ciência, Geografia, Navegação e Cultura mundial, donde resultou o Brasil, uma das maiores nações do mundo (Vinicius, Chico, saravá!) –, dando novos mundos ao mundo, quem inventou a escravatura e o canibalismo. Em paz e às melgas!

