Um ex-presidente da Associação de Utilizadores do Sistema de Tratamento de Águas Residuais de Alcanena começa a ser julgado terça-feira pelo Tribunal de Santarém pelo desvio de 960.000 euros, sendo acusado da prática de um crime de peculato.

Na acusação proferida contra Fernando Fernandes, de 65 anos, o Ministério Público pede que a quantia de 960.000 euros seja perdida a favor do Estado, “sem prejuízo dos direitos da associação ofendida, caso os exerça”.

Segundo a acusação, consultada pela Lusa, no ano de 2008, quando era presidente do Conselho de Administração da AUSTRA – Associação de Utilizadores do Sistema de Tratamento de Águas Residuais de Alcanena (no distrito de Santarém), Fernando Fernandes concebeu um plano para se apossar de recursos financeiros da associação “em seu próprio benefício e das sociedades comerciais” que representava, em que detinha participação social ou em que tinha interesses comerciais.

Assim, diligenciou para que fossem emitidos cheques (que requeriam a assinatura de mais dois administradores) para obter quantias que canalizava para aquelas sociedades ou para contas bancárias por si movimentadas, fazendo crer que se destinavam a realizar investimentos financeiros com retorno superior aos juros das normais contas bancárias.

Neste esquema, entre 2008 e 2010, terão sido emitidos cheques num valor total de 1.940.000 euros, que utilizou para depósito nas contas bancárias da companheira e da mãe, que o arguido movimentava, e das empresas Fertrade Leather (de origem panamiana e representada pelo seu irmão), Asial e Alberto de Sousa Lda, estas duas fornecedoras das sociedades Unalco Leather e Mercolusa, nas quais detinha participações sociais ou interesses comerciais.

Para “ocultar o real destino por si dado às quantias monetárias tituladas pelos cheques”, o arguido utilizou as contas bancárias que movimentava para fazer entrar quantias monetárias numa das contas da AUSTRA (associação que integra essencialmente indústrias de curtumes e o município), “como se as mesmas fossem o retorno financeiro de tais investimentos”.

“Da diferença entre as quantias monetárias que o arguido, através da descrita actuação, retirou da AUSTRA e fez coisas suas, e as quantias monetárias depositadas na referida conta bancária desta associação, persiste em desfavor da AUSTRA a quantia monetária global de 960.000 euros, que o arguido fez sua e utilizou em seu proveito pessoal e das sociedades que representava ou em que detinha interesses comerciais”, afirma a acusação.

Num processo cível movido na sequência da descoberta do desfalque no exercício contabilístico de 2012, Fernando Fernandes assumiu a culpa, tendo o tribunal determinado na altura (2017) o pagamento do valor em falta.

Com a assunção da culpa por parte de Fernando Fernandes, a AUSTRA desistiu da queixa contra os outros réus no processo movido em 2012, entre os quais se encontrava o antigo presidente da Câmara Municipal de Alcanena Luís Azevedo, que integrava por inerência o conselho de administração (CA) da associação à época, e o técnico (TOC) e o revisor oficial de contas (ROC).

No processo criminal que começa a ser julgado na terça-feira, o MP decidiu pelo arquivamento dos autos quanto a estes três arguidos, arquivando igualmente a queixa apresentada pela actual presidente da Câmara de Alcanena, Fernanda Asseiceira, contra o seu antecessor por alegada usurpação de funções (por ter assinado cheques quando já não era presidente do município).

O Ministério Público teve em conta o facto de Luís Azevedo ter assinado os cheques por não ter sido ainda alterada no banco a sua substituição no CA por Fernanda Asseiceira, na sequência das eleições de Outubro de 2009, de modo a possibilitar a movimentação da conta, não tendo obtido daí qualquer proveito.

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