Especial 130 anos do Jornal Correio do Ribatejo
Maria Martins, natural da Moçarria, concelho de Santarém, tornou-se a primeira ciclista portuguesa a ser medalhada num europeu e num mundial de pista, em provas de scratch. ‘Tata’, alcunha pela qual é também conhecida, conquistou o bronze europeu em Apeldoorn, Holanda, em Outubro passado e voltou a fazer história, no passado dia 26 de Fevereiro, ao conquistar o bronze no Campeonato do Mundo de Pista, em Berlim, Alemanha.
Maria ‘Tata’ Martins corre actualmente na formação britânica Drops Cycling Team, que destaca a “determinação e tenacidade” da jovem atleta ribatejana.
“É um grande prazer fazer parte da equipa Drops. Estou agradecida pela oportunidade que me dão para provar aquilo que posso fazer naquilo que mais gosto de fazer”, afiança.
Desde de muito cedo que começou a praticar BTT nos passeios pelo campo com um tio e os trilhos em BTT que fazia com os amigos foram o início. Aos 15 anos integrou a equipa de BTT do Moçarria Aventura Clube, federou-se, começou a fazer provas. Hoje é uma das atletas a representar Portugal nos Jogos Olímpicos de Tóquio.
“Comecei com simples passeios com o meu tio pelo Parque de Monsanto, fazendo BTT e simplesmente desfrutando dos melhores trilhos. O gosto pela modalidade foi crescendo”, começa por contar ao Correio do Ribatejo.
Foi durante umas férias no Algarve que a jovem ‘Tata’ recebeu a sua primeira bicicleta: “os meus pais chegaram a casa com uma bicicleta para mim e para a minha irmã. Lembro-me perfeitamente como era. Compraram-na no supermercado, era da marca era Team. Era preta e vermelha, sem rodinhas. Foi o presente que me deixou mais feliz. Era muito pequenina e nunca tinha andado numa bicicleta, daí o entusiasmo”, relata ao Correio do Ribatejo.
“Nessa altura, estava longe de pensar que o meu futuro ia ser por ali, muito longe mesmo. Posso dizer que comecei a pensar em querer ciclista por volta dos 12 ou 13 anos”, afiança.
Desde então, a paixão correu sobre rodas: a atleta conquistou a medalha de bronze no Campeonato Mundial de Ciclismo em Pista no ano de 2020 na prova de Scratch e, nesse mesmo campeonato, alcançou 4.º lugar na disciplina de Omnium, que lhe garantiu apuramento para os Jogos Olímpicos.
Em 2019, também conquistou medalha de bronze no Campeonato Europeu de Pista na disciplina de Scratch, e foi 8ª na corrida de Omnium.
A Atleta Ribatejana foi também medalhada em duas Taças do Mundo, em Hong Kong onde alcançou prata na disciplina de Omnium e bronze na disciplina de Scratch. Uma semana depois, na Nova Zelândia, ficou às portas do pódio alcançando um 4.º lugar na disciplina de Omnium.
Em 2019, Maria Martins tornou-se Vice-Campeã da Europa de Sub-23 na disciplina de Eliminação, no mesmo dia que completou o seu 20 aniversário.
Em 2018, nos seus primeiros campeonatos da Europa de Sub-23 conquistou a medalha de bronze na prova de Scratch.
Em 2016, Maria Martins tornou-se, no seu primeiro ano de Júnior Vice-campeã da Europa na prova de Scratch. Passado 1 ano, nos Campeonatos Europeus em Anadia, Portugal, Maria volta a repetir o feito alcançando a Prata, mas na disciplina de Eliminação.
Habituada a subir aos pódios, Tata diz que esses momentos “são dos melhores momentos que um atleta vive, é uma imensidão. São instantes de pura felicidade e emoção. É um grande orgulho. O reconhecimento, a recompensa pelo trabalho feito. Não há nada melhor que ter o resultado na mão e sentir que todo o sacrifício valeu a pena. Especialmente, para as pessoas à nossa volta é muito gratificante”, garante a atleta.
Quando lhe perguntamos se tem algum ídolo, Tata é categórica: “Nunca fui de ter um só ídolo, admiro os atletas em geral, tanto no ciclismo como em outros desportos, no entanto tenho como regra todos aqueles que seguem os caminhos certos, progressivos e bem-sucedidos, aqueles que se mantém de cabeça erguida apesar das dificuldades que enfrentam. Para mim, todos os atletas que tenham carácter e espírito de atleta são uma inspiração e os que me transmitirem isso serão um ídolo para mim.”
Na base do seu sucesso desportivo, está o apoio da família, que sempre a incentivou e apoia nos momentos mais difíceis: “Felizmente posso dizer que sempre tive a minha família e amigos do meu lado! E sinto-me grata por isso. Sem dúvida, que é o pilar mais importante e decisivo no crescimento de uma pessoa e principalmente de um atleta. Sinto-me muito, muito sortuda por ter as pessoas que tenho ao meu redor, porque, sem eles, não estaria onde estou. O ciclismo é um desporto que exige grande capacidade financeira por parte das famílias e a minha chegou a pagar para eu correr internacionalmente”.
Um apoio que não é só financeiro, mas é, sobretudo, motivador: “a partir do momento que nos tornamos atletas de alta competição, considero que estamos naquele degrau onde só cabe excelência, resiliência, dedicação e paixão. Considero que os maiores sacrifícios que tive foram o conciliar dos estudos com o desporto. Outros sacrifícios que passei e que actualmente ainda passo são o controlo do peso corporal, a gestão psicológica em certos momentos da época e alguns relacionados com a nossa vida social.”
“Na altura em que estava a estudar”, conta Tata, “era mais difícil, mas considero que conciliar a vida pessoal e de atleta seja um dos desafios mais difíceis que os desportistas têm. Abdicamos de muitas coisas em prol dos treinos, do descanso e da recuperação para podermos estar na melhor forma. Ainda assim, não deixo de poder desfrutar das coisas que gosto de fazer. Somos pessoas e não máquinas”.
No ano passado, Tata conseguiu o apuramento para os Jogos Olímpicos, e confessa, esse foi “o momento mais bonito” da sua vida.
“Foi uma grande emoção, uma grande felicidade. Por todo o processo para me poder qualificar, foi muito duro e muito longo. Foram dois anos de muita incerteza… olhando para trás, tenho muito orgulho de ter alcançado este marco. Ir aos Jogos Olímpicos é um sonho tornado realidade”, revela.
“Vão ser os meus primeiros JO e não posso ‘meter’ demasiada pressão. Vou abordar os Jogos como uma oportunidade para o meu futuro enquanto atleta. Vou-me preparar o melhor possível para lá chegar, nas melhores condições possíveis. Quero alcançar o melhor resultado possível para Portugal. Prometo entrega e dedicação mais do que até hoje tenho tido e lutarei por um lugar honroso para o nosso país”, revela.
Resultados como o que alcançou contribuem para o ciclismo nacional seja cada vez mais considerado: “apesar de Portugal não ser uma potência no que diz respeito ao ciclismo, considero que tem estado em crescente progressão e a prova disso são os resultados que nos últimos anos temos tido. Acredito que vamos chegar longe. Ainda é preciso o ‘click’, apesar de temos vários casos no ciclismo masculino, com prestações incríveis lá fora. É uma questão de tempo, de organização e vontade. É preciso motivar jovens a acreditar que é possível chegar lá”.
Questionada sobre o ‘segredo’ dos seus sucessos desportivos, Tata revela a fórmula: “Os resultados são apenas o fruto de todo um longo e exigente processo que vem de trás. É um processo onde passamos por muitas fases, altos e baixos constantes, mas que independentemente disso não paramos porque temos os olhos postos num determinado objectivo”.
“A primeira coisa que um jovem atleta tem que pensar é: “eu gosto de fazer isto?”. Se é isso que quer fazer para a vida toda. Se sim, então, o meu conselho é: “não desistam”. É possível, mas é preciso muito trabalho, esforço e dedicação porque encontramos muitas pedras pelo caminho”, diz Tata.
Para o futuro, Maria Martins tem a ambição de tirar o brevet e seguir uma carreira de piloto na aviação comercial, uma outra paixão, a par do ciclismo.
“Gosto de pensar no futuro, organizando a minha cabeça e programando-a para cada objectivo futuro, no entanto, o meu pai sempre me ensinou a viver o presente e encarar um dia de cada vez. Como tal, é isso que tenho feito, vivo o presente, desfruto dos momentos agora mas sempre com os meus olhos no futuro”, garante.