O Montepio e sete antigos administradores conhecem hoje a decisão do Tribunal da Concorrência sobre os recursos que interpuseram às coimas superiores a 5 milhões de euros aplicadas em 2019 pelo Banco de Portugal.
A leitura esteve agendada para o início de fevereiro, mas acabou por ser adiada devido à suspensão dos prazos de prescrição, no âmbito das medidas “excecionais e de caráter urgente” decretadas devido à evolução da pandemia da covid-19.
No julgamento, que decorre desde o final de outubro de 2020 no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, estão em causa infrações por alegadas violações das regras de controlo interno e incumprimento nos deveres de implementação de controlo interno, referentes à concessão de crédito, que originaram as coimas aplicadas em fevereiro de 2019 pelo Banco de Portugal (BdP).
Nessa decisão administrativa, o BdP condenou a Caixa Económica Montepio Geral (CEMG), Caixa Económica Bancária, SA a uma coima de 2,5 milhões de euros, o seu antigo presidente António Tomás Correia a 1,25 milhões de euros e outros sete ex-administradores a valores entre 17,5 mil e 400 mil euros, sendo que, na sessão preparatória realizada em 21 de outubro de 2020, foram declaradas prescritas as infrações contraordenacionais relativas a Rui Amaral.
A este processo foi apenso o recurso da condenação proferida em fevereiro de 2020 pelo Banco de Portugal, sobre irregularidades nos mecanismos de prevenção de branqueamento de capitais ocorridas em 2015, que originaram uma coima de 400.000 euros ao Banco Montepio e de 150.000 euros a Tomás Correia e, de igual valor, ao ex-administrador que também teve responsabilidades na área do compliance, José Almeida Serra.
Num longo depoimento prestado ao longo de três dias no início do julgamento, António Tomás Correia procurou explicar a sua atuação em cada um dos factos que lhe são apontados, num processo que considerou não ter “ponta por onde se pegue”.
Tomás Correia não escondeu a sua “indignação” pela condenação a uma multa “superior ao que obteve como rendimento líquido” nos 16 anos que esteve no Montepio (entrou em 2004 para a Associação Mutualista, e por inerência para a Caixa Económica, com Silva Lopes, assumindo a presidência quando este saiu em 2008, cargo que deixou em 2015).
“Não me apropriei de nada e surpreende-me que seja invocado o ter sido presidente da Associação Mutualista para agravar a coima. Uma brutalidade”, disse, sublinhando que, quando assumiu a liderança do Montepio acabou com os prémios, com os cinco administradores a auferirem apenas 14 salários por ano.
Atualmente reformado, o jurista afirmou que nunca o banco recebeu qualquer alerta do supervisor e que conseguiu resolver todos os problemas com que se defrontou, na maioria “herdados” do Finibanco, “sem pedir um cêntimo aos contribuintes”, salientando ainda que a CEMG foi a única instituição financeira que nada perdeu com a queda do BES.
Tomás Correia afirmou ainda que, durante a sua gestão, o Montepio gerou sempre provisões económicas elevadas, declarando o seu “grande orgulho” na instituição.
Nas alegações finais, o mandatário dos ex-administradores do Montepio, Alexandre Mota Pinto, pediu a absolvição e que o Tribunal pondere o efeito da sua decisão sobre “o último grande banco português que resiste à invasão estrangeira”.
Sublinhando que a CEMG “é o último grande banco português que resiste à invasão estrangeira”, o advogado questionou se não será vontade do Banco Central Europeu que assim não seja.
“Vai o Tribunal participar nisso?”, questionou, alertando para os efeitos de uma condenação de milhões de euros tanto em mais uma eventual “corrida aos depósitos”, dando de “mão beijada” o banco a “interesses estrangeiros”, como por passar a ideia de que, também no Montepio, houve “um bando de malfeitores bancários”, alimentando os discursos que levam o povo a fazer “escolhas arriscadas” para a democracia.
Nas suas alegações, a procuradora do Ministério Público, Edite Carvalho, defendeu a “absolvição total” de Tomás Correia e “uma mera admoestação” a Almeida Serra no caso do branqueamento de capitais.
Já em relação ao primeiro processo, Edite Carvalho considerou provado que da ação dos administradores poderá ter resultado “dolo eventual”, mas pediu a “absolvição parcial” de todos os arguidos, uma “redução das coimas” aplicadas a cada um e a “suspensão da execução de metade das coimas” que vierem a ser decididas pelo tribunal.
O mandatário do BdP, Henrique Salinas, alegou que o tribunal “deverá manter a condenação” de todos os arguidos, que contribuíram “causal e dolosamente” nos processos de concessão de crédito, “sabendo que os mecanismos de monitorização de risco não foram suficientes nem eficazes”, bem como quanto aos mecanismos de prevenção de branqueamento de capitais.
Já o mandatário do Montepio, Nuno Casanova, apontou, nas suas alegações, “erros graves” ao processo, considerando que a condenação assenta numa visão redutora da análise de risco.