Reabilitação, repovoamento, mobilidade e cultura. Estas são as grandes linhas pelas quais a cidade de Santarém se deve guiar nos próximos anos. O passado não se esquece, mas é preciso cuidar do futuro. Foi nesse sentido que a Associação de Moradores do Centro Histórico de Santarém (AMCHS) e Associação Comercial, Empresarial e Serviços (ACES) promoveram quinta-feira, 9 de Julho, um debate com o mote: “Santarém – Centro Histórico com Futuro”.

Os promotores da iniciativa justificam a razão de ser deste encontro “face às últimas decisões camarárias de requalificar a Av. 5 de Outubro e o Largo da Alcáçova e da Av. António dos Santos, mas também de outras obras anunciadas para o Centro Histórico”.

O debate, moderado por João Paulo Narciso, director do Jornal Correio do Ribatejo, realizado na plataforma Zoom – e transmitido em directo nas redes sociais – colocou, pois, em diálogo, várias perspectivas sobre a temática.

O encontro contou com as participações de Ricardo Gonçalves, presidente da Câmara de Santarém, Carlos Marçal, presidente da União de Freguesias da Cidade de Santarém, Hugo Pedrosa, presidente da ACES, Francisco Pombas presidente da AMCHS, do arquitecto e residente no centro histórico de Santarém Carlos Guedes de Amorim e de Luís Farinha, arquitecto e ex-vereador da Câmara Municipal de Santarém.

Nesta sessão, o autarca de Santarém, Ricardo Gonçalves, elencou uma série de projectos que estão a ser pensados para o Centro Histórico da cidade que pretendem tornar o espaço mais atractivo e contrariar o declínio que a zona tem assistido ao longo dos últimos anos.

Um declínio que todos – moradores e agentes económicos – devem combater, participando neste “desafio colectivo”, que é o da revitalização do casco velho da cidade.

Para que o CH “volte a ser um território vivo e vivido, pleno de habitantes de diferentes gerações, multifuncional, assegurando as respostas necessárias à população para ali viver, estar, trabalhar e visitar”, Ricardo Gonçalves disse ser necessário “o envolvimento dos cidadãos”.

“À semelhança do que se passa por todo o País, salvo raras excepções, os centros históricos sofrem de despovoamento e abandono. Problemas que têm de ser invertidos porque o nosso Centro Histórico simboliza a nossa história e a nossa memória”, afirmou.

Ricardo Gonçalves, Presidente da Câmara Municipal de Santarém

“O nosso CH mudou e temos um desafio colectivo que é revitaliza-lo”, disse, apontando que, nos últimos anos, a autarquia teve a preocupação de “requalificar toda a envolvente” do centro, preparando-se agora para actuar no casco da cidade.

Santarém, cidade e concelho, proporcionam múltiplas leituras do seu território mas, numa cidade, que se deve conhecer a pé, a calçada irregular não ajuda.

Nesse sentido, e segundo anunciou, será criada uma “via partilhada” nas principais artérias do Centro Histórico, com colocação de uma faixa de pedra de 1,5 metros.

“A primeira fase deste projecto, pensado para facilitar a mobilidade, vai ser implementada brevemente”, garantiu Ricardo Gonçalves.

Requalificação da Avenida António dos Santos, da Avenida 5 de Outubro, do Largo da Alcáçova, do bairro de Alfange e do Largo Visconde Serra do Pilar são outros dos projectos na agenda da Câmara de Santarém.

Em relação à Rua 15 de Março, a requalificação vai começar ainda este mês, numa intervenção da Águas de Santarém que vai colocar novas condutas de água e saneamento na zona. Será depois colocado novo pavimento em calçada.

“É preciso atrair moradores”
Medidas que os arquitectos Carlos Guedes de Amorim e Luís Farinha aplaudem, mas, advertem, apenas fazer-se obra poderá não ser suficiente: é preciso atrair moradores para o CH e promover a reabilitação imobiliária.

Carlos Guedes de Amorim, Arquitecto

Para Guedes de Amorim, a “escala humana” do CH vai jogar a favor da revitalização da zona: “a pouca densidade populacional, a relação de proximidade com o chão – edifícios de poucos pisos – criam condições de habitabilidade diferentes e uma relação diferenciada com a rua, com a esquina, com a praça, o jardim”, exemplificou.

“Daí a grande importância de chamar as pessoas ao centro, sobretudo casais jovens que querem sair de Lisboa e das suas imediações. O CH está muito degradado, mas a situação pode ser combatida, porque existem instrumentos para isso”, declarou.

Mas, na óptica do arquitecto, para além das obras anunciadas, a autarquia terá que desalojar os habitantes prementes da cidade, “os pombos, uma autêntica praga que, como tal, tem de ser tratada”.

Para o arquitecto, outro dos grandes problemas da cidade está relacionado com a limpeza e com os contentores de recolha de resíduos, tendo sugerido que sejam substituídos por “contentores subterrâneos”.

Luís Farinha, Arquitecto

É com um misto de optimismo e pessimismo que Luís Farinha, ex-vereador da Câmara de Santarém e arquitecto olha para o CH: “pessimismo, porque acho que os próximos anos serão difíceis, por causa das ondas de choque da pandemia e o comércio será fortemente afectado. Mas, para o CH existem boas perspectivas. Para além do aspecto do turismo, que tem sido uma oportunidade – embora tenhamos visto que as cidades não podem viver exclusivamente do turismo – temos a questão da habitação, face à proximidade que temos a Lisboa”.

“Vivemos num momento em que as pessoas estão mais sensíveis para a questão do CH e há muita gente que, efectivamente quer vir morar para aquela zona. Sob esse ponto de vista, acho que pode ser uma batalha ganha”, declarou.

Hugo Pedrosa, Presidente da ACES

Para o presidente da Associação Comercial, Empresarial e Serviços (ACES), Hugo Pedrosa, a “decadência” do CH deve-se, precisamente, ao movimento que levou à saída de moradores e de serviços, e à incapacidade de adaptação dos próprios comerciantes: um problema comum a várias cidades em que “todos têm uma quota de responsabilidade”.

“Todos nós, ao circularmos na cidade conseguimos detectar os principais problemas, que são bem visíveis, mas as soluções continuam por implementar de forma a inverter o percurso de degradação que ainda está a decorrer”, declarou.

“É necessário definir um plano de acção que seja feito, não pontualmente, mas ao longo do ano. O que está em causa aqui é a capacidade de atracção de pessoas. O CH precisa disso”, rematou.

Francisco Pombas, Presidente da AMCHS

Segundo a Associação de Moradores do Centro Histórico de Santarém, os principais problemas da zona “continuam a aguardar resolução”, e prendem-se com a falta de segurança, especialmente durante a noite, limpeza, sobrepopulação de pombos e outras pragas, a degradação de passeios e pavimentos e estacionamento anárquico.

“Santarém está, actualmente, perante um desafio irrepetível. Ou aproveitamos, ou estaremos durante mais uma década estagnados. a pressão imobiliária e turística em Lisboa é enorme e torna a cidade de Santarém atractiva para viver e fazer turismo”, declarou Francisco Pombas, presidente da associação.

O responsável referiu ainda que o Governo se prepara para lançar um programa, com uma dotação de 150 Mil ME, 110 Mil ME dos quais para imóveis residenciais, para reabilitação do edificado. Uma autêntica “bazuca financeira” prevista na Estratégia de Longo Prazo para a Renovação de Edifícios (ELPRE) que “Santarém tem de aproveitar”, afirmou.

“Olho para tudo isto com um sentimento misto porque estamos entusiasmados perante a possibilidade de se concretizarem obras estruturantes no CH. Mas estamos desiludidos perante a realidade de hoje: um CH descuidado, com problemas visíveis a olho nu, todos os dias”, acrescentou.

A associação propõe, assim, que a câmara elabore um plano de pormenor de salvaguarda do centro histórico, criando regras iguais para todos de modo a facilitar os licenciamentos, sugerindo também que a autarquia sirva de exemplo e não deixe que os edifícios públicos apresentem sinais de degradação. Nesse sentido defende também que se deve implementar programas de incentivos à reabilitação de casas, sobretudo para fins de habitação permanente.

Na área do património, a associação defende ainda que a câmara penalize os proprietários de casas devolutas, agravando-lhes as taxas de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI). Outra das ideias é que se mande retirar as cablagens de electricidade e telecomunicações das fachadas, solicitando ainda o emparedamento de prédios devolutos e um programa de controlo de pragas, sobretudo de pombos e a criação de uma “Brigada de Cuidadores” que actue na resolução imediata de problemas, como a reparação de calçadas e pavimentos.

No capítulo da segurança, os moradores pedem o reforço do policiamento no centro histórico, implementação de câmaras de videovigilância e de sistemas de detecção automática de incêndios

O trânsito e o estacionamento é outra matéria que preocupa a associação, propondo-se a marcação de lugares no pavimento no largo Padre Chiquito e o reforço de acções de policiamento que controlem o estacionamento anárquico. Defende ainda a associação que sejam criadas zonas de estacionamento para moradores.

“Todos podemos contribuir para resolver estes problemas de insegurança, degradação do espaço público, limpeza, mobilidade e estacionamento”, concluiu Francisco Pombas.

Problemas que, diz Carlos Marçal, presidente da União de Freguesias da Cidade de Santarém, estão “perfeitamente identificados” e, por isso mesmo, existe uma “base de trabalho” para que se possam melhorar estes aspectos.
“Os problemas não são de hoje”, reforçou Marçal, dizendo que já num documento de Salvaguarda e Valorização do CH de Santarém, datado do início do século, mencionava estas fragilidades: “se quisermos ‘agarrar’ no CH temos as ferramentas para o fazer”, declarou.

Carlos Marçal, Presidente da União de Freguesias de Santarém

Revitalização do CH “à vista de todos”
Nos últimos três anos Santarém tem visto um grande investimento na reabilitação de imóveis, nomeadamente no Centro Histórico, mas também na Ribeira de Santarém. Só no CH (Centro Histórico) deram entrada cerca de 100 projectos nestes dois últimos anos.

Quem o diz é Ricardo Gonçalves, presidente da Câmara de Santarém, que não partilha da visão pessimista que muitos têm sobre esta zona da cidade “autêntica jóia da coroa”.

“Temos muitas recuperações de particulares que querem viver no centro histórico, mas também muitas recuperações para investimento, seja para arrendamento ou para actividades económicas relacionadas com o turismo e a restauração, o que vai ao encontro da estratégia do município para a requalificação”, afirmou.

“Durante muitos anos, houve um abandono e hoje há um inverso: há um regresso ao Centro Histórico. Há uma dinamização, com entrada de muitos processos de privados para recuperação de imóveis, mas também temos investimento público. Aliás, muitos dos milhões de euros que temos de fundos comunitários são para o CH”, contrapôs o autarca.

Em particular, a autarquia vai lançar obra no Largo de Alcáçova, junto das Portas do Sol na Avenida 5 de Outubro e no Largo de Marvila. “Teremos também a primeira fase do projecto dos Passeios Acessíveis, que envolverá a zona do Largo Padre Chiquito que está muito degradada. Temos tido ao longo dos anos muitas queixas sobre a questão da mobilidade e temos tentado tomar medidas para mitigar esta situação: recordo que o município de Santarém, há uns anos atrás, lançou o Projecto Rampa, onde foram identificadas todas as barreiras arquitectónicas na nossa grande área urbana e que vão ter que ser ultrapassadas”, lembrou.

Com estas grandes obras e com aquilo que os privados estão a fazer, “vamos ter aqui aquela requalificação que era desejada há muitos anos. Irá trazer mais pessoas para o centro, atrair mais comércio e dinamismo económico”, disse.

“Nós começamos este processo há uns anos atrás com a delimitação da área de protecção urbana, que permite a quem faça obras usufruir de taxas de IVA mais baixas, isenção de IMI e de IMT. O município tem feito a sua parte: já requalificamos o Palácio João Afonso, o Palácio do Landal, a Sé e o Museu Diocesano. Tem havido, portanto, um processo de regeneração do CH que hoje é irreversível. A procura por casas de habitação está a intensificar-se e, com o investimento que vai ser feito, temos a certeza que Santarém terá um CH diferenciador e será o coração do nosso concelho: requalificado, bonito, do ponto de vista da atracção turística e da qualidade de vida”, acrescentou.

“Até há uns anos atrás, não havia construção em Santarém e hoje o cenário inverteu-se. Temos um novo paradigma. Essas obras já estão no terreno, à vista de todos”, afirmou o presidente da Câmara de Santarém.

FILIPE MENDES

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