“Esta crise é única, transversal e duradoura” afirma José Gandarez, presidente da União Desportiva de Santarém SAD, ao ‘Correio do Ribatejo’, entrevistado a propósito da paragem do Campeonato de Portugal devido à crise da Covid-19.
O dirigente diz ser cedo para “avaliar os danos” causados por esta paragem forçada mas reconhece que esta poderá “afectar o orçamento da próxima época”.
José Gandarez disse ao ‘Correio do Ribatejo’ ter a situação regularizada com todos os jogadores e técnicos até ao dia 15 de Março, altura em que os treinos foram suspensos, mas vai deixando o aviso: “se o campeonato não regressar os clubes não têm condições para pagar os meses remanescentes em que não existiu competição”. Caso contrário promete “honrar os compromissos financeiros até ao fim da época”.
A concluir deixa uma mensagem a todos os escalabitanos: “fiquem em casa! Ajudem o próximo! Vamos todos ficar bem!”.
Até que ponto a crise provocada pela chegada do Covid-19 influenciará o projecto que tem para a União Desportiva de Santarém (UDS)?
Esta crise é única, transversal e duradoura. Vai sem dúvida interferir nas nossas actividades profissionais, pessoais, sociais e desportivas. O futebol não será excepção. Vamos todos ter que nos adaptar. Na presente data não sei avaliar os reais danos, nem em que modo e medida afectará a UDS. Tenho, como a generalidade dos empresários, as minhas actividades societárias paradas, com as consequentes perdas que tal implica. Contudo, agora a prioridade é salvaguardar a saúde pública, sair desta crise sanitária com o menor custo de vidas possível.
Estou preocupado, mas certo que a UDS saberá adaptar-se aos novos tempos com a garantia de que não embarcará em compromissos que não possa suportar. Se tiver que sacrificar a sua componente competitiva assim o fará. Recuperar a credibilidade e o bom nome tem sido um processo longo, não podemos deitar tudo a perder. Se tivermos que recuar para ganhar novo balanço assim faremos. Mas como a crise é universal, estou esperançoso de que todos saberemos estar à altura das necessidades.
Como se gere uma SAD em tempo de crise, com os campeonatos parados e ausência de receitas?
Estamos, como o resto de quase todas as indústrias em comunicação constante por telefone, email, sem contacto social.
A receita já era quase residual, a questão é que esta crise afecta todos os ‘stakeholders’, o que diminui a disponibilidade de meios colocados à disposição e vai afectar o orçamento da próxima época.
Qual a situação actual do plantel? Poderá haver rescisões?
Temos a situação regularizada até ao dia 15 de Março – a suspensão dos trabalhos foi no dia 10 ou 12 de Março salvo erro. Não sabemos se vai haver mais competição, mas o mais provável é o campeonato ser anulado, sem subidas, nem descidas como aplicado a todo o futebol de formação.
A situação para a maioria dos jogadores deste campeonato é dramática pois estão a contar com 10 meses de subsídios – remunerações – e vão ter perda de remuneração.
Mas se o campeonato não regressar os clubes não têm condições para pagar os meses remanescentes em que não existiu competição. Estamos perante um estado de emergência.
Mas reafirmo que com muito esforço a UDS nada deve aos seus jogadores, treinadores e colaboradores. Se o campeonato regressar honraremos os nossos compromissos financeiros até ao fim da época.
Concordaria com o regresso à competição logo que possível, ou defende que o campeonato deveria ficar por aqui, o que poderia decretar a descida aos distritais já que há data da interrupção o clube se encontrava abaixo da linha de água?
Qualquer medida que não passar pelo regresso à competição e finalização do actual campeonato será injusta, mas temo que tal não será mais possível.
Nesta altura, outros valores mais importantes se impõem.
Se a competição for até ao fim estou em crer que o clube não descerá de divisão. Se o campeonato for anulado quer a subida, quer as descidas, não poderão ocorrer.
Os financiamentos até hoje anunciados pelo governo satisfazem-no, enquanto gestor?
A pergunta já encerra o problema: financiamentos! Esta crise afecta a procura e a oferta… A retoma vai ser bastante lenta… A forma de apoiar não pode passar por mais endividamento, ainda para mais sem se vislumbrar a luz ao fundo do túnel. Se assim for vamos ter uma taxa de desemprego record e uma crise sem precedentes.
Mas com o impor da realidade, acredito que outras medidas terão que ser delineadas e apresentadas.
O futebol, nomeadamente os clubes fora das Ligas profissionais, mereceriam uma atenção especial nesta altura?
Entendo que o campeonato nacional (não profissional) ganhou muito com a criação do canal 11, mas que existe um caminho de rigor a prosseguir que exige uma maior atenção para garantir a sustentabilidade deste campeonato.
É um campeonato com demasiadas equipas (72), sem receitas, em que o modelo de subida é injusto e diminuto (2 equipas).
Será fundamental reduzir as equipas e provavelmente ter apenas três séries (com 48 ou 54 equipas), sendo o campeão de cada série apurado para o escalão profissional.
Por outro lado, e embora ainda seja um campeonato amador, é preciso criar receitas para os clubes e reduzir as despesas, nomeadamente através da diminuição dos custos de organização dos jogos, diminuir as multas e contraordenações.
É preciso olhar para a sustentabilidade deste campeonato e garantir uma concorrência sã e leal: há clubes que vivem acima das possibilidades, em incumprimento reiterado com jogadores e treinadores, sem qualquer penalização desportiva. E que ano após ano continuam a disputar o campeonato nacional sem qualquer consequência, distorcendo o mercado de jogadores oferecendo o que não podem… Há clubes que dependem de dinheiro público das Câmaras Municipais para competir e pagar salários, não me parecendo ser esse o modelo correcto. Apoio público às infraestruturas desportivas sim, apoio público à logística, transporte, alimentação sim, dinheiro público para pagar salários não me parece aceitável. Por isso, é fundamental reduzir globalmente o orçamento médio de um clube que participe no campeonato de Portugal.
Espero que no próximo campeonato as regras básicas que garantam equidade e uma competição justa entre clubes já estejam em vigor. O futuro do futebol português e dos jovens jogadores portugueses depende muito da evolução e exigência que o campeonato nacional adoptar.
Já recebeu alguma mensagem da Federação Portuguesa de Futebol, nem que fosse a dar apoio moral?
Sei que estão todos muito preocupados e a trabalhar em soluções. A própria Associação de Futebol de Santarém está a acompanhar.
Esta crise vai ser selectiva e não tem data marcada para o fim. Acredita que nem todos os clubes vão ter capacidade de se manterem?
Espero que todos, se não for possível, a maior parte se aguente, mas no futuro vamos ter que rivalizar menos e colaborar mais.
A União Desportiva de Santarém não realizou as eleições para a presidência do clube na data inicialmente prevista. Vai fazê-lo em breve? Já há candidatos ao lugar, depois da impossibilidade de Pedro Patrício que chegou a ser hipótese?
A União Desportiva de Santarém não tem vazio directivo. Realmente existiu um largo consenso para que o Pedro Patrício assumisse o cargo de presidente do clube. Não foi possível, pelas razões já conhecidas. Pessoalmente, empenhei-me para que tal acontecesse. A actual direcção continua em gestão sendo que as eleições serão marcadas logo que esta situação seja ultrapassada. Já existe candidato e a equipa está a ser formada.
Que mensagem quer deixar à ‘Nação Unionista’ nesta hora?
Sendo a existência da UDS devida à junção e união de vários clubes e sensibilidades da cidade de Santarém penso que nesta hora difícil se justifica estender a mensagem a todos os escalabitanos: Fiquem em casa! Ajudem o próximo! Vamos todos ficar bem!