O jornalista e académico Dr. Virgílio Arruda, segundo Director do Jornal Correio do Ribatejo, foi homenageado, no passado sábado, no salão nobre da Câmara Municipal de Santarém, no decorrer da 212.ª Assembleia de Investigadores do Centro de Investigação Joaquim Veríssimo Serrão (CIJVS).
O evento contou com a apresentação da separata “Santarém Setecentista (A Academia Scalabitana e o Padre Luís Montês Matoso)”, a cargo do Dr. Ludgero Mendes, administrador do Correio do Ribatejo.
Na apresentação da obra, assinada pelo académico correspondente Virgílio Baptista Cravador Arruda, uma figura ímpar na história da cidade e do jornalismo ribatejano, Ludgero Mendes sublinhou a “pertinência da apresentação de tão relevante texto do Dr. Virgílio Arruda, que descreve com profundidade e acerto num trabalho notável a importância de Santarém no Sec. XVIII e a clarividência de alguns dos seus filhos mais ilustres, mau grado que no presente sejam autênticos desconhecidos, que pautaram a cultura portuguesa e em especial a escalabitana num tempo em que a sociedade culta portuguesa se devotava com tanto afã ao saber e às artes”.
Segundo Ludgero Mendes, “a leitura deste excelente trabalho do Dr. Virgílio Arruda oferece-nos uma catadupa de informação sobre Santarém daquelas eras, e a referência detalhada dos assuntos versados nas diversas sessões encanta-nos pela natureza dos temas abordados em cada uma”, sublinhou.
Ludgero Mendes referiu alguns desses temas, referindo-se, entre outras, à terceira sessão do ano de 1753 da Academia Scalabitana, celebrada no dia 1 de Julho, sob presidência do Doutor Jacinto Freire de Mendonça e Santa Maria, capelão-fidalgo e cónego doutoral na Real e Insigne Colegiada da Vila de Santarém, que versou o tema: “Não é perfeito príncipe o que pelos estudos e ciências se faz sábio, mas aquele que sabe reinar, com máximas prudentes, vencendo os inimigos sem vestir-se como soldado e recuperando domínio sem desamparar o trono”.
“Nesta notável e inspirada comunicação, o Sr. Dr. Virgílio Arruda tece loas à Ribeira de Santarém que lhe serviu de berço, para nos dar conta, especialmente através da correspondência do Padre Luís Montês Matoso, da importante circulação fluvial no Tejo e dos portos da Ribeira e do Alfange, nos quais, para além das mercadorias que circulavam entre Santarém e a capital do reino, viajavam também os livros que este erudito pároco ia coleccionando em curiosíssimos e delicados negócios envolvendo a celebração de missas como forma de pagamento pela aquisição dos livros que tanto o fascinavam”, salientou.
“O Tejo, curiosamente o título de um jornaleco que o Dr. Virgílio Arruda ia redigindo e dirigia na sua Ribeira, em parceria com o seu Amigo Henrique Dias Vigário, em manuscritos, como em manuscritos se perpetuaram tantos escritos do Padre Matoso, nomeadamente a Gazeta de Lisboa, que cumpria religiosamente a sua periodicidade semanal de informar sobre tantos e tão diversos temas, revelando-se determinante para o esclarecimento de interessantes assuntos que compõem a história de Santarém e do país dessa época”, acrescentou Ludgero Mendes.
Na recta final da sua intervenção, Ludgero Mendes lembrou “o Padre Luís Montes Matoso, que foi franciscano, laborioso historiador, que depois havia de ser lente do Real Colégio de Santa Catarina dos Olivais, de Santarém, e autor da História de Santarém Ilustrada e bem assim como das “Memórias Sepulcrais da Lusitânia”, para além de, como oportunamente o salientou o Sr. Dr. Virgílio Arruda, ter sido um pioneiro na actividade de jornalista, constitui uma dupla homenagem: Ao Dr. Virgílio Arruda, que teve o mérito de resgatar a sua memória do olvido e dar-lhe a importância que o seu labor tanto justifica; e o próprio Padre Luís Montês Matoso, pelo valioso contributo que prestou à divulgação da história de Santarém, num tempo em que igualmente se destacou o Padre Inácio da Piedade e Vasconcelos, autor de História de Santarém Edificada, sendo que não abundam as referências a qualquer esboço de cooperação intelectual entre ambos numa Vila tão dada às coisas da cultura e das artes”, concluiu.
A Assembleia teve início com palavras de boas vindas a todos os presentes por parte do Director do CIJVS, Professor Doutor Martinho Vicente Rodrigues seguindo-se o actual director do Jornal, João Paulo Narciso, que se referiu à história do Correio do Ribatejo e em particular ao Dr. Virgílio Arruda, director do Correio do Ribatejo durante cerca de 54 anos e oito meses.
“Lembrar os fortes laços que ligam o Dr. Virgílio Batista Cravador Arruda a Santarém, aqui nesta hora, significa evocar páginas da história de Santarém e da cultura portuguesa”, sublinhou.
“Poucos terão amado tanto a cidade de Santarém e a província do Ribatejo como o saudoso Dr. Virgílio Arruda”, deixando no ar a sugestão de “os seus textos serem mais divulgados, pois falar em Literatura de Viagens no Século XX, mas desconhecer os Itinerários Sentimentais é, quanto a mim, grave lacuna cultural. Num país que fala de Turismo Cultural e de Itinerários de Fé, seria boa ocasião para reeditar e divulgar a literatura de viagens na perspectiva de Virgílio Arruda”, referiu Paulo Narciso.
A sessão do passado sábado culminou com a intervenção do Professor Doutor Miguel Corrêa Monteiro, da Academia Portuguesa da História, intitulada “Memórias de tempos diferentes, evocativos da Academia Scalabitana e da Academia Portuguesa da História”.
“esta reunião vai no sentido do Professor Joaquim Veríssimo Serrão quando estre dizia que o historiador não é um juiz, nem a história um tribunal. O historiador e a história têm o dever de dar voz a quem já não a tem”, começou por considerar o académico.
O orador destacou a importância destas instituições no desenvolvimento do conhecimento e da identidade cultural, traçando um paralelo entre o passado e a actualidade e citou excertos da evocação feita pelo Professor Doutor Joaquim Veríssimo Serrão aquando a atribuição da Medalha de Ouro da Cidade ao Dr. Virgílio Arruda, evocação publicada na edição de 23 de Março de 1989 do Correio do Ribatejo.
Virgílio Arruda, nascido na Ribeira de Santarém a 16 de Outubro de 1905 e faleceu a 3 de Janeiro de 1989. Dedicou a sua vida à advocacia, ao ensino e ao jornalismo. Filho de João António Arruda e de Custódia Júlia Baptista Cravador Arruda, frequentou o Liceu Nacional Sá da Bandeira e licenciou-se em Direito pela Faculdade de Direito de Lisboa, com distinção, em 1927. Após a morte do pai, assumiu a direcção do jornal “Correio da Extremadura”, actual Correio do Ribatejo, perpetuando um legado de rigor informativo e dedicação à imprensa regional. Além da carreira jurídica e jornalística, foi professor no Liceu de Santarém e deixou uma obra literária notável. Entre os seus livros destacam-se “Santarém no Tempo de Dom Pedro e Dom Miguel”, “Itinerários Sentimentais”, “Presença de Cabral nas Rotas do Futuro” e “A Vinha do Senhor”.
Virgílio Arruda foi membro correspondente da Academia Portuguesa da História e do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, tendo sido distinguido, a título póstumo, com a Medalha de Ouro da Cidade de Santarém pela Câmara Municipal, em 1989.