No âmbito do Dia Nacional da Água, Ramiro Matos, presidente da empresa municipal Águas de Santarém, destaca os principais desafios que a entidade enfrenta na gestão sustentável dos recursos hídricos. Numa entrevista focada na escassez de água e nas soluções tecnológicas adoptadas pela empresa, Ramiro Matos sublinha a importância da inovação para o controlo das perdas de água e a criação de redundâncias no sistema de abastecimento. A sensibilização da população para o uso consciente da água é outro dos pilares da sua estratégia, reforçada este ano com o lançamento de uma nova plataforma digital dedicada à educação ambiental.

Quais são os principais desafios que a Águas de Santarém enfrenta actualmente no que diz respeito à gestão sustentável dos recursos hídricos no concelho?

Toda a actividade da Águas de Santarém, enquanto entidade gestora do sistema de abastecimento de água em Santarém, está ligada e deve ser desenvolvida de acordo com os princípios de sustentabilidade, pelo que o maior e permanente desafio é continuar a fornecer água de qualidade aos nossos clientes, procurando custos de exploração eficientes e criando capacidade na rede para que não existam quebras de abastecimento provocadas, nomeadamente, por escassez de água nas nossas captações. 

Estamos a desenvolver esforços e investimentos relevantes para que alguma inoperacionalidade parcial do sistema possa ser rapidamente reposta sem que a água possa faltar nas torneiras dos clientes. 

E este desafio é concretizado com investimentos que promovam a redundância do sistema e reduzam cada vez mais as perdas de água que se verificam e que são o grande inimigo da sustentabilidade de qualquer sistema de abastecimento de água.

Com a crescente preocupação com a escassez de água em Portugal, que medidas concretas estão a ser implementadas pela Águas de Santarém para mitigar o impacto da seca e garantir um abastecimento contínuo à população?

Como já referido, estamos a investir em infra-estruturas que possam garantir a redundância do sistema através de captações, armazenamento e adução alternativa, de forma a garantir a disponibilidade de água em situações em que alguma das nossas captações possa ser afectada, quer seja por efeito da seca, quer também por outros factores que possam determinar uma indisponibilidade temporária ou permanente. 

A duplicação de sistemas e a respectiva interligação, a par com o estreitamento das relações com a EPAL são um tema que temos, neste momento, como prioritário, considerando o impacto das alterações climáticas que não toca só aos outros.

Também o combate às perdas de água continua a ser o maior dos objectivos, continuando nós a apostar seriamente neste tema, com excelentes resultados que permitiram reduzir as perdas drasticamente nos últimos quatro anos.

De que forma a Águas de Santarém está a promover a sensibilização dos munícipes para o uso consciente da água, especialmente em períodos de seca?

A Águas de Santarém mantem em permanência diferentes acções de sensibilização quer seja nas escolas, quer através de mensagens nas facturas ou ainda através das redes sociais. Afectamos uma parte do orçamento anual a estas iniciativas e que queremos incrementar de forma que cada cidadão possa contribuir com a sua quota-parte para o uso consciente da água. Contudo, temos noção que ainda há muito desperdício de água, pelo que só através das tarifas se conseguirão alcançar resultados mais satisfatórios na dissuasão de consumos supérfluos por parte dos cidadãos. 

O Dia Nacional da Água sublinha a importância deste recurso vital. Existem novas iniciativas ou projectos em curso que a Águas de Santarém planeia lançar a propósito desta data?

O Dia Nacional da Água é uma data de grande importância para a Águas de Santarém, pois reforça a nossa missão de garantir o acesso a este recurso vital de forma sustentável e consciente. Para assinalar esta efeméride, iremos reforçar a nossa presença no digital, através do lançamento de um canal de YouTube, que disponibilizará conteúdos documentais, informativos e educativos.

Esta nova plataforma tem como foco a sensibilização do público em geral e da comunidade educativa, em particular, para a preservação da água e o uso responsável dos recursos hídricos.

Preservar o recurso água é uma das maiores preocupações da Águas de Santarém, pelo que esta iniciativa visa dar conhecimento da nossa actividade e educar os mais jovens sobre o ciclo da água, a importância da sua preservação e práticas diárias que contribuem para o consumo responsável e sustentável deste bem essencial.

Acreditamos que a educação é a chave para garantir que as futuras gerações compreendam a necessidade de proteger este recurso.

Estas iniciativas reflectem o nosso compromisso contínuo com a sustentabilidade, com a sensibilização dos mais jovens e o desenvolvimento de soluções inovadoras para preservar a água, que é essencial a todos nós.

A nível de inovação tecnológica, que avanços estão a ser feitos pela Águas de Santarém para melhorar a eficiência do sistema de distribuição de água e o controlo de perdas?

A Águas de Santarém tem investido fortemente, nos últimos anos, em inovação tecnológica para melhorar a eficiência dos seus sistemas e infra-estruturas, procurando lutar contra as perdas de água na rede e evitar a água não facturada. Das medidas que a empresa tem implementado, e que contribuíram para fazer face a estes desafios, são de destacar o aumento de fiscalização e de controlo dos espaços públicos no Concelho de Santarém de forma a identificar e eliminar os consumos ilícitos; a implementação de um sistema de Telemetria mais fiável nas Zonas de Medição e Controlo do Sistema de Santarém; a substituição de condutas e de contadores; a implementação de um novo sistema de Telegestão; a implementação de novos softwares para gestão dos sistemas de abastecimento de água, com especial enfase nas perdas de água.

Assim, e a par da contínua substituição de infra-estruturas e de equipamentos existentes, a empresa tem investido em sistemas inovadores, que permitem uma gestão mais rápida da água – sistema de telegestão –, com operação remota dos equipamentos, e que se encontra integrado com um software analítico que analisa cada zona de abastecimento de água e permite estimar o consumo dos próximos dias. Possibilita, desta forma, detectar, com maior exactidão, eventuais perdas em tempo real, facilitando uma intervenção rápida e precisa, minimizando o desperdício de água. Estas ferramentas ajudam a monitorizar a pressão e o fluxo da água em diferentes pontos da rede, garantindo uma distribuição mais equilibrada e eficiente.

Com o apoio destas tecnologias, conseguimos prever falhas ou problemas na rede, permitindo-nos actuar preventivamente, o que melhora a fiabilidade do sistema e reduz significativamente as perdas.

Considera que a adesão da Águas de Santarém às Águas do Ribatejo continua a ser uma possibilidade ou uma inevitabilidade?

Já antes do início das minhas funções como Presidente do Conselho de Administração da Águas de Santarém considerava que a adesão ao sistema multimunicipal Águas do Ribatejo não era uma solução para Santarém. Já no exercício das funções pude comprovar, em inúmeras ocasiões, que Santarém em nada beneficiaria com essa agregação, pois continuamos a ter indicadores muitos positivos e até melhores do que os da Águas do Ribatejo, conforme comprovado pelos Relatórios da Entidade Reguladora. Sei que algumas pessoas e até partidos políticos continuam a ter essa agregação na sua agenda, mas enquanto eu estiver neste Conselho de Administração a mesma não acontecerá, porque uma coisa é nós acreditarmos nos benefícios que os powerpoints tentam vender, outra coisa diferente é, no dia-a-dia e em cada item essencial, termos provas de que continuamos a ser melhores, em sustentabilidade, em eficiência energética, em perdas de água, em inovação, em investimentos e, também, em tarifário. 

O anterior governo ainda ensaiou limitar o acesso a Fundos Comunitários a sistemas agregados, mas este governo, e bem, reverteu essa situação, pelo que, nem essa razão constitui fundamento válido em defesa das agregações. Outra coisa diferente, será podermos ter parcerias no sistema em alta, por exemplo, com o grupo Águas de Portugal, mas unicamente se os estudos a realizar demonstrarem mais valias de eficiência para o nosso sistema. 

A Águas de Santarém nunca estará de costas voltadas para os seus parceiros e demais entidades, mas o Conselho de Administração, reconhecendo o grande valor dos recursos humanos da empresa, o seu trabalho e dedicação, que têm permitido a obtenção de grandes indicadores de desempenho, entende que a solidariedade com concelhos vizinhos mais pequenos só se justifica quando e se os ganhos forem comuns, reais, para todas as partes. E a única parte que nós defendemos é a população e o concelho de Santarém, que julgamos muito bem servida com um sistema puramente municipal.

Existem planos concretos para que a Águas de Santarém assuma a gestão e recolha dos resíduos sólidos urbanos a partir de 2025? Se sim, quais serão as principais mudanças e desafios que a empresa prevê enfrentar nesse processo?

O Município de Santarém, nosso accionista único, mandatou-nos para estudar esse alargamento, ou seja, a inclusão da recolha dos resíduos sólidos urbanos no nosso objecto social, com a delegação dessa competência pelo Município.

Os estudos estão em marcha, sucedem-se reuniões entre as equipas, e brevemente apresentaremos as nossas conclusões. O Município tem gerido muito bem esta área, com melhorias significativas nos últimos anos, mas entendemos que a agilidade e qualidade de serviço da Águas de Santarém pode ser replicada nos resíduos sólidos, com melhorias do serviço no nosso concelho, numa área bastante difícil a todos os níveis, mas desafiante. 

A Águas de Santarém estará preparada para assumir essa delegação de competências quando o Município entender conveniente. Mas tudo apontará para que tal seja possível já no próximo ano.

Os índices de reciclagem da população em Portugal permanecem baixos. Que estratégias poderão ser desenvolvidas para incentivar uma maior adesão à reciclagem por parte dos cidadãos?

O primeiro dos problemas não é a baixa proporção de reciclagem. É antes a enorme quantidade de lixo produzida. Veja-se que em Portugal o lixo produzido equivale a mais de 500 kg/pessoa/ano. Em primeiro lugar temos de incentivar e sensibilizar as pessoas a produzir menos lixo, a combaterem o desperdício, adoptando medidas de sustentabilidade no consumo.

Depois, então, surge a necessidade de promover e preparar a reciclagem. Mas reciclar sempre, desde os mais novos aos mais velhos, começando em nossas casas, penalizando quem não proporciona a reciclagem e a reutilização.

A recolha indiferenciada ainda ronda os 80% dos resíduos em Portugal, sendo muito urgente que os cidadãos tenham prioritária, no seu dia-a-dia, a preparação para reciclagem.

E aqui, como na utilização da água, como já disse, para além das campanhas de sensibilização e promoção pública da preparação e recolha selectivas, será com as tarifas que se conseguirá alcançar as desejadas metas. Será penalizando o poluidor, em termos financeiros, será estabelecendo quotas de produção de resíduos por habitante ou família, que se conseguirá forçar a diminuição da quantidade de resíduos produzidos e, depois, a recolha selectiva e reciclagem. A aplicação do princípio do poluidor-pagador é urgente nos resíduos urbanos, devendo as entidades públicas investir nos equipamentos necessários para a aferição da quantidade e natureza dos resíduos produzidos por cada cidadão, para depois, penalizar os incumpridores e poluidores, em benefício dos cumpridores.

As pessoas continuam, também aqui, a ignorar voluntariamente as consequências das suas más condutas para o ambiente e qualidade de vida.

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