Assistimos hoje diariamente em todos os canais televisivos à guerra na Ucrânia onde canhões, mísseis e drones causam, com grandes explosões, morte, caos e destruição. Tal como hoje, houve um tempo, em que em violentos combates, canhões já com um ritmo de “um tiro em cada dois minutos”, provocaram explosões idênticas, destruindo vidas, fortalezas e cidades. Vejamos alguma dessa destruição em fortalezas portuguesas erguidas ainda no século XVI, no período da sua Expansão, em diversas regiões do mundo.
1. A fortaleza de Santa Cruz do Cabo de Gué D´ Água de Narba, na costa atlântica marroquina, foi construída em 1505 por João Lopes Sequeira com o dinheiro do dote de sua mulher, D. Beatriz. O nome tem origem por se situar no Cabo de Gué (ou Guer) e por circundar uma fonte de água que pertencia a um mouro que se chamava Ahames Narba. A construção apressada desta fortaleza foi impedir a pretensão da Espanha, já senhora das Ilhas Canárias, em iniciar a ocupação da costa africana. Depois de levantada, o rei enviou-lhe armas, artilharia e pólvora, acabando por a adquirir em 1513. O local ficava próximo de Maça, lugar tributário de Portugal desde 1497, repleto de mercadores de diferentes nacionalidades que desde meados do século XIV se espalhavam por todo o Norte de África, dado a Europa estar a ser fustigada pela peste e por uma grande crise económica. Santa Cruz e os seus quinze sucessivos capitães viveram décadas de dificuldades, sofrendo lutas e cercos.
Em Março de 1541 o Xarife da região de Suz, Mohammed-Ech-Cheikh, após um cerco de seis meses apodera-se da fortaleza, pois um bombardeiro português fez explodir involuntariamente um torreão, onde morreram D. Rodrigo de Carvajal, Capitão-mor da Praça e trinta cavaleiros portugueses e causou dezenas de feridos. Tal destruição levou à rendição da força portuguesa, após a promessa de lhes serem poupadas as vidas. O xarife cumpriu a palavra dada (1).
2. A glória da cidade de Baçaim, foi no período entre 1535 e 1739. Era próspera a cidade, rica a sua população e excelente a qualidade de vida, ao ponto do Governador se deslocar seguido por dezasseis criados, dos quais quatro levavam tochas, três as bilhas de água e um outro o indispensável guarda-sol. Perdeu-se Baçaim em 1739, para um exército do Império Marata, chefiado por Chimnaji Apá, um general do Peshwa Bajirao I, Sultão de Guzarate. Ao fim de três meses de violento cerco e intensa luta, com os portugueses limitado a 60 homens, a situação vai-se agravar com a explosão de uma das torres das muralhas, o que leva o último General de Baçaim, Caetano de Sousa Pereira a capitular perante a desproporcionada força. Chimnaji Apá, vitorioso, vai conceder aos portugueses todas as honras militares e permitir-lhes o embarque com tudo quanto desejassem levar (2).
3. A partir de 1512, Abu Lais, o sultão da ilha de Ternate no arquipélago das Molucas e uma das chamadas “ilhas das especiarias”, vai receber bem os portugueses. Em 1522 iniciam aqui os portugueses a construção da Fortaleza de S. João Baptista. A presença dos portugueses não foi pacífica, pois muitas são as revoltas do povo local insatisfeito com a cristianização. Em 1541 com António Galvão o 7º Capitão das Molucas, os nativos são pacificados, mas as relações mantêm-se conflituosas, acabando o sultão Hairun, anteriormente “fiel aliado” assassinado em 1570. A manifesta incapacidade dos portugueses para assegurarem a posse destas regiões, levará a uma autêntica “guerra santa”. Os habitantes impõem um cerco, que irá durar 5 anos. A explosão de um paiol em 1575 destruirá as muralhas e matará muitos dos defensores. Os portugueses rendem-se e porque tinham uma saída para o mar, partem para outras ilhas sob o seu domínio como Tidore, Amboíno e Macáçar. Ao longo dos cinco anos do cerco destaca-se em combate de forma notável Belchior Vieira, a quem o rei Filipe I em atenção ao seu heroísmo, por Carta de 2 de Março de 1584, faz nobre e fidalgo, concedendo-lhe o Brasão de Armas com o apelido Ternate. Regressariam os portugueses a Ternate por volta de 1605, onde se manteriam até 1663 numa situação de partilha luso-espanhola, altura em que os holandeses a dominam (3).
[F. Paula (1), R. Brito (2), A. Almeida (3). Por decisão pessoal, o autor não escreve segundo o novo Acordo Ortográfico].