A cidade de Santarém evocou, no passado dia 30 de Novembro, a vida e obra de Bernardo Santareno, nome maior da dramaturgia nacional.

Esta homenagem teve lugar na Sala de Leitura Bernardo Santareno e contou com a participação do seu primo e ‘decano’ dos advogados da cidade, Joaquim Martinho da Silva, de José Miguel Noras, investigador do dramaturgo, de Vicente Batalha, encenador, actor e seu amigo, de Miguel Moreira, actor, ‘performer’, coreógrafo e encenador e de Inês Barroso, vice-presidente da Câmara de Santarém.

A sessão contou ainda com a apresentação de uma Performance sobre “O Duelo”, encenada por Miguel Moreira e apresentada pelos alunos do Curso de Artes do Espectáculo da Escola Secundária Dr. Ginestal Machado, numa iniciativa integrada nas comemorações do Dia Internacional das Cidades Educadoras.

Os participantes desta sessão lembraram a importância desta figura ímpar da história de Santarém e de Portugal, como um resistente à ditadura do Estado Novo, atento à realidade do País, em que a sua obra tinha uma consciência social, o que lhe valeu a proibição de algumas das suas peças e a perseguição pelo regime salazarista, uma vez que a sua escrita foi essencialmente de denúncia, atenta à realidade do País e visando uma consciência social, que lhe valeu a proibição de algumas das suas peças, tais como, “O Duelo”, entre outras.

Ao Correio do Ribatejo, Vicente Batalha, considerou que Bernardo Santareno é uma “figura incontornável do país e do mundo”.

“Há muitas pessoas que desconhecem que a obra de Santareno está traduzida em muitos países da Europa: aliás, uma das últimas representações da obra de Santareno foi em Londres, e é uma pena que as companhias portuguesas de topo não incluam no seu reportório as obras de Santareno que é realmente uma figura de excepção ao nível da dramaturgia, não só do séc. XX, mas de todo o teatro português”, declarou ao nosso jornal o ex-presidente do Instituto Bernardo Santareno.

Questionado pelo Correio do Ribatejo sobre se a obra de Bernardo Santareno deveria ser mais estudada e encenada, Vicente Batalha foi peremptório: “devia ser obrigatória”, afirmou.

“A sua peça [de teatro], ‘O Judeu’ esteve durante vários anos no programa do ensino. Depois, acabaram a por retirar”, disse, acrescentando: “Ele foi autor praticamente um quarto de século… morreu novo, com 59 anos, mas deixou uma obra que devia ser investigada de uma forma mais profunda”.

“Eu penso que Portugal só tem a perder com retirada de Santareno quer dos programas escolares quer dos reportórios das grandes companhias de Teatro. É uma falha, uma omissão imperdoável porque o teatro de Santareno tem uma grande actualidade: ele lutou pela liberdade do homem, foi um humanista de primeira água, um homem extremamente culto e que nos deixou uma obra ímpar em termos do conhecimento humano. Eu penso que Bernardo Santareno deve constar de todos os reportórios de todas as companhias de teatro portuguesas incluindo o Teatro Nacional”, defendeu.

Nesta “evocação histórica” a Bernardo Santareno foi feita a primeira pré-apresentação do livro sobre o seu centenário, que passará em 2020, a cargo do investigador e historiador José Miguel Noras.

O estudo, ainda em curso, mas já em adiantada fase de conclusão, será editado em finais de 2019 ou princípio de 2020, assinalando o primeiro centenário do nascimento do Bernardo Santareno, conforme nos transmitiu o autor.

“Procuraremos trazer novidades em torno de manuscritos que estavam por publicar, por um lado, e, fundamentalmente, exumar algumas das suas entrevistas. Curiosamente, é nos Jornais e nas Revistas que vamos obter esclarecimentos em torno do trabalho mais precoce de Bernardo Santareno. Muitas vezes dizemos que a sua primeira obra é editada quando tem 33 anos, em 1954, antes de 19 de Novembro. Todavia, lendo uma entrevista à Plateia, por exemplo, ficamos a saber que a sua peça ‘Olga Condessa Russa’, por exemplo, é produzida quando ele tem escassos 11 anos”, contou José Miguel Noras ao Correio do Ribatejo.

Segundo explicou, este livro tem a particularidade, “além da exumação de muita coisa que era desconhecida ou estava adormecida”, de apresentar 59 contributos manuscritos em postais de Santarém, de outras tantas personalidades.

“Bernardo Santareno viveu muito, mas apenas durou 59 anos. eu acho que Santarém tem que lhe fazer uma homenagem. A vinda aqui, curiosamente a um ex-ginásio – que nenhumas condições tem para biblioteca, nem para sala de leitura – é o retorno a um espaço onde ele era visita assídua, porque este era o Ginásio do Liceu que ele frequentou”, afirmou.

O historiador e ex-presidente da Câmara de Santarém não tem dúvidas que Bernardo Santareno é o nome “mais marcante, nos planos da criação literária e da dimensão ética e política” da dramaturgia nacional.

No âmbito das comemorações do aniversário de Bernardo Santareno, os alunos do curso de Teatro da Escola Secundária Dr. Ginestal Machado, apresentaram uma performance de Miguel Moreira, fundador da Companhia Útero, que falou dos processos criativos de encenação da peça “O Duelo”. A apresentação da Performance surge na sequência de um workshop, com o objetivo de proporcionar aos alunos o contacto com artistas conceituados no panorama artístico nacional, contribuindo para o seu enriquecimento curricular e formação, enquanto futuros artistas.

Esta peça com texto de Bernardo Santareno foi realizada em co-produção com o Teatro Nacional D. Maria II, Teatro aveirense e Teatro -Cine de Torres Vedras, tendo um impacto bastante mediático em território nacional. Depois de se ter formado em Medicina, Bernardo Santareno especializou-se em Psicologia, mas foi a escrita que lhe deu maior relevo, tendo iniciado o seu percurso literário associado ao teatro com a publicação de várias peças nas décadas de 50, 60 e 70, como são os casos do “Bailarino”, “A Promessa”, “O Crime da Aldeia Velha”, “António Marinheiro”, “O Judeu” ou “A Traição do Padre Martinho”. Bernardo Santareno, pseudónimo literário de António Martinho do Rosário, nasceu no dia 19 de Novembro de 1920, em Santarém. A sua obra completa foi organizada e anotada por Luiz Francisco Rebello e publicada em quatro volumes entre 1984 e 1987. Parte do espólio de Bernardo Santareno encontra-se no Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea da Biblioteca Nacional.

 

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