A 11.ª edição do Festival Guitarra d’Alma regressa a Almeirim, de 1 a 9 de Novembro, para celebrar a guitarra portuguesa e a sua relação íntima com a música e cultura nacionais. Custódio Castelo, mestre e director artístico do evento, volta a reunir artistas e espectadores num programa diversificado que inclui concertos, fusões musicais inéditas e uma homenagem especial ao pianista José Filomeno Raimundo, um dos impulsionadores do ensino formal da guitarra portuguesa em Portugal. Com espectáculos de entrada livre, à excepção do encerramento, o festival assume-se como uma plataforma de partilha artística e de renovação do gosto pela guitarra portuguesa. Castelo revela ainda um futuro ambicioso para o festival e o seu desejo de levar a guitarra a outros géneros e públicos, sublinhando o papel do instrumento na formação cultural das novas gerações.

Esta é já a 11.ª edição do Festival Guitarra d’Alma, um evento único em Portugal. Como descreve a evolução deste festival e o que representa este regresso em 2024?

A guitarra portuguesa é parte de mim, já não consigo viver sem ela. Diria até que foi o instrumento que me escolheu. Nestes onze anos, o festival cresceu e passou de um sonho inicial para uma referência. Inicialmente, até pensámos fazê-lo com 12 edições, uma para cada corda da guitarra portuguesa. No entanto, o sucesso foi tal que hoje o desejo das pessoas é que o festival continue. A cidade de Almeirim sempre esteve ao nosso lado, especialmente com o apoio do Presidente da Câmara, Pedro Ribeiro, que, desde o primeiro momento, quis valorizar a guitarra portuguesa e o trabalho que tenho desenvolvido. Por isso, é uma enorme alegria regressar, trazendo novos sons e artistas à nossa terra.

Enquanto director artístico, qual o critério de escolha dos artistas e o que espera oferecer ao público com esta diversidade musical?

O festival sempre se propôs mostrar algo diferente. Para além dos grandes nomes nacionais, gosto de dar espaço a novos talentos e a projectos que cruzem fronteiras culturais. Neste ano, por exemplo, teremos o grupo esloveno de jazz manouche, popularizado pela banda francesa Django Reinhardt e Stéphane Grappelli, liderado por Teo Collori, que irá tocar comigo num concerto de fusão entre o jazz e a guitarra portuguesa. É algo inédito em Portugal, e até desafiador, mas a música é universal, e cruzar estilos é uma forma de levar a guitarra portuguesa a novas culturas. Também vamos homenagear José Filomeno Raimundo, antigo director da Escola Superior de Artes Aplicadas, um dos maiores defensores do ensino oficial da guitarra. Ele é um verdadeiro amigo da guitarra portuguesa, e esta homenagem é mais do que justa.

A guitarra portuguesa é central no festival. Como vê o papel deste instrumento na promoção da cultura musical nacional junto das novas gerações?

A guitarra portuguesa já desempenha um papel essencial nessa promoção, especialmente desde que o fado foi considerado Património Imaterial da Humanidade. Mas é um trabalho contínuo. Amália Rodrigues e Carlos Paredes foram pioneiros, e eu vejo a minha geração e os meus alunos a seguir os mesmos passos, com orgulho e dedicação. Hoje, músicos formados por mim tocam com Marisa, Ana Moura, Jorge Fernando, entre outros. É um orgulho enorme saber que esta aposta deu frutos e que a nossa guitarra tem um lugar forte e respeitado na música portuguesa. Eu próprio, quando comecei, fui criticado por tocar de forma descontraída, sem gravata, com rabo de cavalo e brinco na orelha (risos), mas mostrei que o importante é respeitar a música e inovar.

Como encara o futuro do festival e a sua ligação com a comunidade local?

O festival foi pensado para crescer com o público e para estar ao lado das pessoas. Desde a primeira edição que as escolas são envolvidas, incentivando os alunos a fazer desenhos de guitarras portuguesas, e este ano vou apresentar o instrumento aos mais pequenos nas escolas de Almeirim. Quero mostrar-lhes o que não tive na minha infância – a oportunidade de tocar numa guitarra e ver como ela funciona. Muitos ainda acham que a guitarra e o fado são para “velhos”, e essa ideia precisa de ser mudada. Ao longo do tempo, o festival ganhou espaço e reconhecimento. Quando a nova sala de espectáculos de Almeirim, no antigo IVV, estiver pronta, será mais uma casa para este evento, que hoje reúne pessoas de várias regiões e, cada vez mais, músicos de outros países.

Para terminar, que sonhos ou objectivos ainda pretende alcançar como músico e embaixador da guitarra portuguesa?

Há um projecto que quero concretizar após a reforma, se Deus me der saúde. Gostava de escrever uma opereta com guitarra portuguesa. Tenho em mente a obra ‘O Encantador de Tristezas’, que já está gravada e é obrigatória no meu curso. A ideia é escrever para uma pequena orquestra de guitarras portuguesas, em colaboração com Óscar Cardoso e o seu filho. Eles estão a desenvolver um contrabaixo inspirado na guitarra portuguesa, com cordas duplas. Gostaria que fadistas, em vez de cantores líricos, interpretassem a peça. Mesmo que não veja a estreia, ficarei feliz por deixar essa obra feita.

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