A palavra “território” está associada, normalmente, a poder. As relações que estabelecemos com um determinado espaço/território revelam-se, quase sempre, através da percepção de pertença. Os processos de apropriação e construção de um lugar resultam, essencialmente, de relações de poder que podemos observar a diversos níveis: local, regional, nacional ou global. A relação de poder com o território pode ser entendida como económica, social, ambiental, cultural ou mesmo simbólica.

Quando os Scalabitanos trauteiam o refrão do “Vira dos Malmequeres” cantado por Tonicha (1969) com base numa recolha de Alves Redol (Cancioneiro do Ribatejo, 1950) sentem que há uma ligação estreita com o lugar de vivência (Santarém). A estes laços existentes entre um indivíduo ou uma comunidade com o lugar designa-se por Topofilia (Yi-fu Tuan). Quanto maior o conhecimento sobre esse lugar maior é a aproximação e a sua defesa. O desenvolvimento de um lugar depende do valor que a sua população atribui ao seu território.

Do mesmo modo, os diferentes territórios no Mundo, ou espaços de poder, dependem de como os observamos. A visão que temos do mundo depende, evidentemente, da percepção e informação que recebemos sobre esses territórios. As condições de pertença em relação ao que ocorre no mundo encaminha-nos para um processo de análise territorial que não controlamos.

O Mundo de hoje caracteriza-se principalmente pelo conceito de incerteza. Incerteza na saúde, incerteza nas relações interpessoais., incerteza nas relações económicas ou Incerteza nas relações entre países. E foi assim que termina 2021 e começa o 2022.

O aumento da conflitualidade entre Estados ou territórios resulta, também, dessa incerteza. Temos vindo a assistir a um aumento dos conflitos territoriais. As guerras estão aqui bem perto: Argélia/Marrocos/Saara Ocidental, Líbia, Síria, Israel/Palestina, Libano, Iraque, Arménia/Azerbaijão, Ucrânia/Rússia, Mali, Sudão Etiópia, Afeganistáo, Paquistão/Índia …

É evidente que também não podemos esquecer, como cenário global, a oposição entre Estados Unidos/China-Rússia. Estamos num momento de Transição de Poder? Ou caminhamos para um mundo multipolar? Continuamos na incerteza. As disputas continuarão sem fim. Uma nova Guerra Fria? Estamos no campo da Geopolítica. As diferentes potências ou superpotências continuam a colocar as suas peças no jogo de xadrez do sistema Mundo.

Nas últimas décadas não assistimos ao fim dos conflitos e das guerras. Não há tratados de paz. Não há Acordos, credíveis, de moderação bélica. Não há vencedores nem vencidos. Há perdedores! São os povos que vivem nos diferentes territórios que continuam a perder. O aumento do número de pessoas em situação de pobreza, o aumento da fome, o aumento de número de países com regimes e/ou grupos políticos que defendem as “autocracias” provocam o aumento da incerteza.
Estamos distraídos ou fazem com que estejamos distraídos.

E nós, scalabitanos, continuaremos a trautear “No lindo jardim de Santarém” defendendo o nosso território de pertença e de vivência.

Vítor Barreto – Professor de Geografia e de Geopolítica na Universidade da Terceira Idade de Santarém

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