No ano em que assinala 28 anos, a Escola Superior de Desporto de Rio Maior enfrenta um dos momentos mais desafiantes da sua história, marcado pela quebra de candidatos provocada pelo novo modelo de acesso ao ensino superior e pela pressão sobre instalações e recursos. Em entrevista ao Correio do Ribatejo, o director, Nuno Pimenta, sublinha o percurso “notável” da escola, destaca a consolidação da investigação através do centro Sprint, revela a ambição de criar um pólo científico no campus e afirma que o futuro passa pela acreditação do doutoramento em Ciências do Desporto e por um reforço estrutural do corpo docente.

A Escola Superior de Desporto de Rio Maior assinala 28 anos num contexto desafiante para o ensino superior. Como avalia o momento actual da escola?

O percurso destes 28 anos foi muito marcante. A escola nasceu em instalações provisórias, praticamente com o mesmo número de professores e alunos, e cresceu de forma consistente, ampliando a sua oferta formativa e reforçando a sua presença nacional nas Ciências do Desporto. Hoje contamos com cerca de 1200 estudantes — muito acima da capacidade inicialmente prevista — o que nos obriga a uma gestão exigente de espaços e horários e torna evidente a necessidade de crescer.

O grande desafio actual tem natureza conjuntural: as novas regras de acesso ao ensino superior, que tornaram o processo mais exigente e reduziram o número de candidatos elegíveis. Pela primeira vez, ficámos com vagas sobrantes em todas as fases, algo transversal ao país. Ainda assim, quando comparamos com outras instituições da área, estamos alinhados com as escolas de referência. A preocupação maior é que estas novas regras penalizam sobretudo escolas de regiões mais periféricas e podem agravar assimetrias territoriais se as grandes universidades aumentarem significativamente as vagas.

Como está a evoluir a procura pelos TESPs e que impacto têm tido na formação dos estudantes?

Os TESPs são cursos recentes, pelo que ainda não dispomos de indicadores de empregabilidade, mas têm sido importantes para diversificar a oferta e responder a áreas emergentes. O TESP em Tecnologia no Desporto, desenvolvido com o Politécnico de Tomar, tem apresentado procura, embora a continuidade dependa da avaliação daquela instituição. Já o TESP em gaming e e-sports, onde fomos pioneiros a nível nacional, está plenamente consolidado, com turma cheia, e será alargado a Óbidos numa parceria estratégica com o município, que tem apostado fortemente neste sector tecnológico.

Outro caso de sucesso é o TESP em Surf, Treino e Animação Turística, que combina componentes teóricas e práticas, incluindo aulas em praias da região e aprendizagem de fabrico de pranchas — competências que têm valor no mercado. Todos os TESPs permitem acesso facilitado às licenciaturas, com creditações significativas, o que cria percursos de continuidade muito atractivos para os estudantes.

Em que ponto está o Centro de Investigação Sprint e que impacto pode ter no sistema científico nacional?

O Sprint é, provavelmente, o passo mais decisivo da escola no domínio científico. É um centro recente, mas com grande escala: reúne perto de cem investigadores e integra instituições de ensino superior desde o Algarve ao Minho. A ESDRM é a instituição de gestão do centro, o que reforça a sua centralidade e capacidade de coordenação nacional. Esta rede alargada permite recolher dados, desenvolver projectos e transferir conhecimento com um alcance territorial que poucas estruturas possuem.

O Sprint foi avaliado com classificações muito elevadas, o que nos dá confiança para avançar com formação avançada. Já submetemos à A3ES o doutoramento em Ciências do Desporto, que consideramos uma evolução natural do percurso da escola. Paralelamente, estamos a trabalhar na criação de um pólo científico no campus — um edifício com valências laboratoriais e espaço para investigação, ensino avançado e eventos científicos — que será determinante para consolidar a actividade científica e preparar a escola para o futuro.

A requalificação do edifício da escola, financiada pelo Fundo Ambiental, já está em curso?

Ainda não no terreno, mas o processo está em andamento. O projecto está concluído e o concurso internacional foi lançado, faltando apenas a adjudicação da obra. A intervenção incidirá no edifício educativo — salas, pavilhões e gabinetes — e permitirá uma modernização profunda ao nível da eficiência energética: substituição total do sistema de climatização, iluminação LED, instalação de painéis solares e melhoria de equipamentos que, apesar de relativamente recentes, já estão obsoletos face à tecnologia actual. É uma intervenção essencial para garantir sustentabilidade e qualidade ambiental no campus.

O Politécnico de Santarém integra agora a Universidade Europeia. Que oportunidades se abrem para a escola?

A Universidade Europeia é um projecto muito ambicioso. Reúne nove instituições de ensino superior de vários países, com 18 milhões de euros para investir em mobilidade, formação, investigação e actividades interculturais. O Politécnico de Santarém lidera o consórcio, o que nos coloca numa posição estratégica. Estamos a trabalhar na criação de joint degrees — cursos desenvolvidos em conjunto e que conferem grau — e já temos candidaturas submetidas a financiamentos europeus que resultam directamente desta parceria.

Além disso, aprofundámos outras relações internacionais. Estivemos recentemente na Universidade de Desporto de Tirana, onde identificámos complementaridades claras nas áreas do desporto de natureza e de montanha, áreas onde cada instituição tem força própria. Temos também cooperação com países de língua portuguesa e com instituições da Noruega, Holanda e Espanha. A escola é muito dinâmica do ponto de vista internacional, embora reconheça que podemos reforçar ainda mais a ligação à comunidade local, o que exige também o reforço do corpo docente — um processo que está já a ser preparado.

Quais são, actualmente, os principais constrangimentos ao crescimento da ESDRM?

O principal é o novo sistema de acesso, que reduziu o número de candidatos e penaliza especialmente instituições fora dos grandes centros urbanos. Esta situação poderá agravar-se se Lisboa e Porto aumentarem significativamente as vagas, o que esvaziará instituições do interior e afectará a coesão territorial. Outro constrangimento é o financiamento: a evolução tecnológica é muito rápida e exige investimentos constantes, não só em equipamentos, mas também no reforço do corpo docente.

Para continuar a crescer, precisamos sobretudo de consolidar o doutoramento em Ciências do Desporto e avançar com o pólo científico, que permitirá centralizar investigação, ensino avançado e actividades laboratoriais. Estes dois passos são fundamentais para assegurar o futuro da escola.

Que mensagem deixa à comunidade académica no 28.º aniversário da escola?

É uma mensagem de orgulho e de reconhecimento. Em 28 anos construímos uma escola robusta, com impacto nacional e com uma visão ampla das Ciências do Desporto: ética, valores, saúde, inclusão e investigação. O futuro passa por elevar o nível de formação, com o doutoramento, e aumentar a produção de conhecimento científico. Queremos que o pólo de investigação se torne uma referência internacional e que a escola continue a afirmar-se como um actor relevante no desenvolvimento do país.

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