Beatriz Loureiro, Designer de Moda
Beatriz Loureiro, 21 anos, nasceu em Santarém e, até aos seus 18 anos, viveu em raízes scalabitanas. Saiu da cidade para estudar Design de Moda, curso do qual se licenciou este ano, e pretende seguir a vertente da roupa e da joalheria. Mesmo sendo jovem, o seu portfólio é vasto, especialmente marcado pelas peças com materiais biodegradáveis.
Como decidiu ser designer de moda?
Desde muito nova que sempre gostei de artes. A minha mãe sempre me incentivou a ser mais artística e fazíamos muita coisa juntas, tanto de desenho como de artes plásticas. Quando ela era mais nova, ela também queria ser designer de moda. Foi algo incutido em mim.
Lembro-me de querer ser designer de moda desde os oitos anos. Afirmava que queria ser pintora e entretanto fui vendo que gostava mais da área do design. Adorava ver os desenhos da minha mãe de croquis e de me vestir mais bonitinha, então acabou por se formar este sonho.
Quais são os designers que a inspiram?
Com certeza, a nível nacional, o Valentim Quaresma, Olga Noronha e Susana Bettencourt. A nível internacional, tenho como inspiração o Daniel Roseberry, o diretor criativo da Schiaparelli, e o Alexander McQueen. São, a meu ver, génios da moda.
Mesmo sendo recém-licenciada, que trabalhos já fez na área?
Tudo o que fiz foi na área da faculdade. Acho que o trabalho mais público que realizei foi em colaboração com uma colega minha que vai aparecer na revista Green Cycle e vai ter uma exposição pública no Porto, no Modtissimo.
Quais são as suas maiores ambições profissionais?
Adorava trabalhar como freelancer e lançar uma marca 100% sustentável, que conseguisse alcançar o que tenho aprendido. Tem ocorrido uma revolução na área da moda, em conjunto com a revolução climática, pois as pessoas têm estado cada vez mais preocupadas com as alterações climáticas. Queria conseguir fazer algo que tivesse a minha estética mas ao mesmo tempo revolucionária, que desse para ser completamente sustentável.
Qual é a sua opinião acerca do uso de pessoas mais “reais”, nomeadamente modelos plus size, na moda?
Eu acho que, também tendo em conta a revolução atual na indústria da moda, está a existir um boom enorme. Tudo o que é espectro, desde os modelos até aos chefes, incluindo como os negócios estão a ser realizados. É incrível o que está a acontecer e, especialmente acerca de modelos inclusivos e para as pessoas se sentirem representadas. Inclusive, foi um assunto que na altura teve mais visibilidade na rivalidade entre a Victoria’s Secret e a SavageXFenty. A Victoria’s Secret detinha modelos maioritariamente brancas e magras enquanto que a Fenty criou uma identidade incrível, com modelos de todos os corpos e feitios, com representatividade negra e, para além disso, produções completamente fora da caixa. Quem assistiu a campanha da Fenty sentiu-se completamente identificado e sentiu uma proximidade à marca e quis comprar os seus produtos.
Nós dificilmente nos encaixamos em todas as caixinhas, e nisto me incluo, mesmo sendo uma mulher cis branca, também não me encaixo em todas. Acho que para nós, mulheres, observarmos alguém como nós com tanto poder e tanta beleza natural, liberta-nos.
É um dos seus objetivos ter uma marca que consiga alcançar todo o tipo de corpos?
Com certeza. Algo que ainda está muito enraizado e que eu própria senti foi que, na minha faculdade, sempre trabalhámos com o molde número 36. Sempre que fazia peças novas deixava-me profundamente irritada porque, ao longo do processo, eu queria que a peça me servisse e isso simplesmente não acontecia. Tinha sempre que procurar uma amiga mais pequena e mais magra. Nem um quarto da minha turma era assim e não percebia o porquê de termos que restringir o nosso trabalho a um certo corpo.
A minha modelo principal que participou em todos os meus projetos, é uma modelo negra e eu acho que ela realmente faz o meu trabalho ter um brilho incrível. Eu necessito de criar peças para que todas as pessoas se sintam bonitas e poderosas com elas.
Acredita que há espaço em Portugal para alcançar o que deseja?
Eu acho, realmente, que há mais espaço em Portugal do que nós achamos.
Mesmo sendo a moda um meio tão competitivo?
É visto mais competitivo de fora. Lá dentro, existe sim competitividade e arrogância mas não é de todos. Normalmente a competitividade vem de alguém da velha guarda. As pessoas novas que estão a entrar na área são muito unidas. Existe uma grande entreajuda pois todos sabemos que a área não é de todo fácil. Existe uma indústria tão grande em Portugal, desde calçado a têxtil. Temos um meio imensamente vasto e dá para construir algo em cima disso.
Eu tinha realmente ambições de estudar fora pois acredito que não tenhamos capacidades suficientes para criar bons profissionais, tendo em conta que é uma área que está a sofrer múltiplas mutações, tanto a nível de marketing como de têxteis e representatividade. Está tudo a mudar constantemente e há espaço para cada um de nós. No máximo não temos pessoas que acreditem nos artistas e sinto que Portugal, no geral, não acredita muito naquilo que os artistas têm de muito bom para dar.
Detém um vasto portfólio onde estão incluídos trabalhos com materiais biodegradáveis. Porquê a escolha de materiais ligados à natureza?
Fui inspirada por uma professora minha que estava a investigar a área dos materiais biodegradáveis e eu fiquei apaixonada. Considero mesmo que seja o futuro da área da moda. Hoje em dia, marcas pelo mundo todo criam com materiais biodegradáveis, como por exemplo couros feitos com cascas de maçã. Tive uma vontade enorme de experimentar algo assim.
Tenho muita curiosidade em criar peças com este tipo de materiais para momentos rápidos, Por exemplo, em vez de criar um vestido para os Globos de Ouro, que vai custar milhões, super difícil de realizar com um impacto ambiental aterrorizador, é possível criar algo que dura apenas para o momento de uma passadeira vermelha e, em vez de ficar fechado para sempre, apenas desaparece.
Que mudanças é que gostava de fazer na área da moda?
Vai muito de encontro ao que já tinha dito. Quero, e não me vejo de todo a fazer algo, que não seja absolutamente sustentável, neste momento. A mudança seria dentro das peças sustentáveis. O mercado é muito pouco explorado ainda, também ainda estamos a experimentar. Eu gostava de conseguir dar um passo em frente na área.
Prefere vestuário ou joalheria?
Eu desde sempre preferi vestuário. No entanto, após fazer um estágio numa joalheria e tirar um workshop ligado à joalheria, apaixonei-me completamente. Adorava conseguir balançar entre os dois. Não consigo de todo escolher um. O trabalho com vestuário é muito mais analítico e eu sou uma pessoa muito experimental. A peça que vai estar incluída nesta entrevista foi uma fuga a todo o processo de modelagem e complexidade, sendo muito mais livre e foi talvez a que mais me deu gosto fazer. Eu gosto de, ao trabalhar, fazer as coisas no momento. Ao escolher vestuário, seria apenas por saber que consigo exercer a minha forma de trabalho nas peças vestuárias. Se não, preferia joalheria devido ao processo ser mais libertador.
Em que é que se inspirou para fazer a peça que está a apresentar?
Este vestido foi realizado no meu último semestre na faculdade, que tinha como tema “Identidade”. Foi inspirada em Santarém e na minha família, sendo o vestido feito em crochet devido à minha mãe e à minha avó, que sempre fizeram crochet. As rosáceas do vestido foram retiradas de algumas igrejas de Santarém, nomeadamente da Igreja da Graça, do Convento de São Francisco e do Convento de Santa Clara. As cores e todo o aesthetic da peça foram baseadas nas Ninfas do Tejo pois sempre me senti próximo à sua simbologia.
Viagem de sonho?
Maldivas.
Música imprescindível?
Qualquer uma do James Bay.
Quais os seus hobbies preferidos?
Ouvir música e passear.
Se pudesse alterar um fato da história, qual escolheria?
Eu alterava todas as construções sociais que hoje em dia permitem a existência de minorias. Todas as coisas que foram feitas para degradar um povo ou um conjunto número de pessoas, pois essas ações têm consequências até hoje.
Se um dia tivesse de entrar num filme, que género preferiria?
Comédia romântica ou drama.
O que mais aprecia nas pessoas?
Honestidade.
O que mais detesta nelas?
Mentira.
Por: Diogo Maçarico