O que podemos esperar da edição deste ano do Festival ‘Celestino Graça’?

Desejamos que a próxima edição do Festival Celestino Graça constitua um grande sucesso ao nível da realização sócio-cultural de grande relevo que já é e que o público que assista aos espectáculos na Casa do Campino possa sair satisfeito e com vontade de voltar. A presença e o calor do público são sempre determinantes para o sucesso de um qualquer evento.

Depois de alguns anos noutros palcos, o Festival assentou arraiais na Casa do Campino. Foi uma aposta ganha?

Plenamente. Estou em crer que se não tivéssemos tido a ousadia de fazer uma ruptura com o formato e o conceito antigos o Festival já tinha morrido.

Na Casa do Campino o espírito é outro, para melhor, pois estas instalações permitem-nos incluir no Festival outros eventos e criar um ambiente de festa, daí termos alterado profundamente o formato do Festival e até a sua própria filosofia. Actualmente o Festival Internacional de Folclore continua a ser a âncora do evento, porém na Festa das Artes e das Tradições Populares do Mundo cabem muitas outras iniciativas.

Quais as iniciativas que destaca este ano paralelas aos diferentes espectáculos e inseridas no programa do Festival?

Desde logo a Grande Gala de Fado no Ribatejo, com a especial participação do consagrado fadista António Pinto Basto, mas também o Salão de Fotografia com uma exposição sobre “O Ribatejo e as suas Gentes” da autoria do conceituado fotógrafo Abel Cunha, a Gala Solidária “Entre Idades / Abraçar Gerações”, em parceria com a Fundação INATEL, o Fandangando, aberto a todos os folcloristas ribatejanos, num ensaio para o relançamento da candidatura do fandango a património cultural imaterial, os jogos tradicionais do Ribatejo e muita animação musical e coreográfica ao longo de todos os dias.

Se Celestino Graça estivesse fisicamente entre nós o que acha que diria sobre o Festival que recebeu o seu nome, enquanto fundador do mesmo?

Esta é uma questão de difícil resposta e até algo melindrosa. No entanto, atrevo-me a dizer que Celestino Graça continua a ter motivos para estar feliz, posto que o Festival ainda está de pé 48 anos após a sua morte. E, com o devido respeito, que é muito, e a admiração infinita pela sua obra notável, penso que o festival de hoje é melhor do que o festival de antigamente.

O Festival Celestino Graça cresceu, diversificou-se, valorizou-se através da sua realização autónoma, e tenderá a ser sustentável, o que muito nos apraz constatar.

Tem sido fácil manter os dois Grupos – o Infantil e o Académico – nos níveis altos que lhes são reconhecidos dentro e fora de portas? Quais são os maiores problemas que os Grupos atravessam nos nossos dias?

Fácil não tem sido, mas gratificante sim! Nos nossos dias a juventude é aliciada para inúmeras actividades lúdicas e desportivas, e o folclore ainda não goza da justa e adequada imagem de uma expressão cultural das mais relevantes, porque assenta a sua acção no conhecimento e na afirmação da nossa matriz identitária. No nosso caso, a nossa sorte é termos o Grupo Infantil para o qual captamos algumas crianças, designadamente familiares dos actuais ou antigos componentes do Grupo Académico, pois captar jovens de 14, 15 ou 16 anos para um grupo de folclore é muito difícil.

Os encargos inerentes à vida de uma associação dedicada ao folclore são imensos, com as despesas relativas aos trajos, com os custos de manutenção da nossa Sede e com os transportes. A maioria das pessoas nem se dá conta dos encargos inerentes à actividade de um grupo de folclore.

Tem sido fácil encontrar instituições e empresas que apoiem o Festival? Alguma vez o Festival esteve em perigo quanto à sua realização?

Sim, o Festival Celestino Graça já esteve em risco de extinção, nomeadamente em alguns anos em que a Câmara de Santarém atravessou um período de maior sufoco financeiro e em que não nos foi atribuído nenhum subsídio. Houve alguém que se chegou à frente e adiantou umas dezenas de milhares de euros ao Grupo Académico, o que permitiu manter o Festival.

Entretanto, e com alegria para todos nós, porque somos escalabitanos, a situação financeira da Câmara normalizou e com os últimos Executivos, nomeadamente sob a presidência do Dr. Ricardo Gonçalves, a situação melhorou. O Município apoia o Festival Celestino Graça em cerca de 50% do seu orçamento e o Grupo Académico tem de diligenciar muito para arranjar o restante. O que, como se compreenderá, não é tarefa fácil.

Como está a Liga dos Amigos do Festival? Já tem muitos associados?

A Liga dos Amigos do Festival está a fazer o seu caminho…

Ainda não temos tantos “Amigos” quanto desejaríamos, e necessitamos de muitos mais, mas está a crescer.

A constituição da Liga dos Amigos resultou da necessidade de criarmos alguma receita estrutural, e antecipada, para fazer face aos cerca de 25 mil euros que temos de arranjar em cada ano, mas também é muito importante para nós a interacção com o nosso “público”, com as pessoas que gostam de nós e apreciam o nosso trabalho, pessoas a quem pedimos conselhos e de quem recebemos opiniões.

Esta relação, aberta e directa, é fundamental para a sobrevivência do Festival, tanto quanto o apoio financeiro que daí resulte. Mas, manda a justiça que se diga que temos alguns bons Amigos, a quem muito ficamos a dever pelo seu suporte material e pelo estímulo que a sua atitude constitui.

O Grupo Académico honrou recentemente o nome de Santarém em França. Que diferença nota no apoio dado aos Grupos de Folclore em França e em Portugal?

É uma diferença abissal! Nem podemos fazer uma breve comparação, porque sairia sempre desfocada. O público francês apoia efectivamente o folclore e assiste expressivamente aos espectáculos, mesmo pagando preços elevados.

No Festival de Confolens, onde estivemos há alguns anos, o livre-trânsito para cinco dias de espectáculos custava 126 euros, e a sala principal onde decorriam os espectáculos, com capacidade para 2.800 espectadores, estava quase sempre cheia. O Festival RITE’23, em Saint-Girons, de onde regressámos há meia dúzia de dias, teve dois grandes espectáculos – o primeiro incluía um jantar e o bilhete custava 60€, no segundo dia o bilhete apenas para assistir ao espectáculo custava 21€… e o Salão de Exposições tinha capacidade para 1.500 espectadores, estando literalmente cheio. Só por aqui se pode fazer uma ideia…

Que apoios teve o Grupo Académico para esta digressão e se foram suficientes face aos gastos necessários para marcar presença condigna neste conjunto de eventos por terras francesas?

A falta de apoios, é mais justo abordarmos assim a questão, é lamentável. As instituições poderão não nadar em dinheiro, pois todos conhecemos os constrangimentos que o nosso país atravessa há dezenas de anos, porém o que mais nos desgosta é a atitude de desconsideração com que somos tratados. Até parece que uma associação é penalizada por querer superar a habitual rotina, como se uma representação nacional no estrangeiro não tivesse qualquer interesse.

Esta digressão a Saint-Girons custou ao Grupo Académico cerca de 8 mil euros, a grande fatia, claro, com as despesas relacionadas com o transporte em autocarro. O apoio recebido pelas nossas autarquias ascendeu a 2.750 euros e a Organização do Festival compensou as despesas de transporte efectuadas em França pagando-nos 1.600 euros… pelo que o Grupo Académico teve de suportar o valor restante, ou seja quase quatro mil euros. Os próprios

Componentes do Grupo tiveram de contribuir com um apoio de 50 euros cada… Isto é um absurdo!

Os meses de Junho a Setembro são, por excelência, aqueles em que têm lugar um maior número de festivais de folclore um pouco por todo o país. Que cenário traça sobre o futuro do folclore em Portugal?

O Folclore, enquanto património e expressão cultural, está razoavelmente salvaguardado, o que fica a dever-se ao trabalho de algumas centenas de grupos que fizeram as suas pesquisas e recolhas e agora, mesmo com muito menos actividade pública, mantêm o património acautelado.

O que se regista é uma significativa redução de actividade dos próprios grupos de folclore, muitos limitando-se, apenas, a participarem em alguns festivais de outros grupos com os quais fazem “permuta”, o que desmotiva os respectivos componentes e diminui expressivamente a notoriedade do folclore da região.

Qualquer dia o Folclore é apenas objecto de museu!

Os Grupos Folclóricos debatem-se sempre com imensas dificuldades financeiras e logísticas para levar por diante os seus Festivais ou participar noutros, mas são das instituições em Portugal que melhor afirmam a defesa da nossa matriz identitária. O Folclore está condenado a continuar a ser o ‘parente pobre’ da Cultura em Portugal?

Eu atrever-me-ia até a dizer que são os únicos agentes culturais que assumem e representam as bases da sua matriz identitária ao nível das respectivas regiões, pelo que, no conjunto, afirmam a identidade nacional. As associações devotadas ao folclore e à etnografia são, assim, quase os únicos agentes que pugnam pela afirmação do nosso imaginário nacional, valha isto o que valer. No entanto, o Folclore é, e continuará a ser, o parente pobre da Cultura portuguesa, tanto por que a maioria dos dirigentes folcloristas não têm tido capacidade para defender a sua dama, como pelo facto de termos uma classe política, em regra, ignorante e inculta.

O que faz toda a diferença com o que acontece nos países cultural, social e economicamente mais desenvolvidos do que Portugal. É o que temos!

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