Cumprem-se no próximo domingo, dia 7 de Dezembro, oito anos sobre a data do infausto falecimento do nosso Amigo João Gomes Moreira. 

João Gomes Moreira morreu aos 95 anos na plenitude das suas faculdades intelectuais, deixando nos seus inúmeros amigos uma saudade infinita, pois o relacionamento com esta ilustre personalidade fluía tão naturalmente como o simples acto de respirarmos. Faz-nos falta a companhia do João Moreira, com quem as conversas nunca estavam acabadas, pois os pretextos e os temas eram infindáveis. Tive a sorte de ter sido muito amigo de João Moreira ao longo de quase meio século, mas assumo com muito orgulho que este amigo foi um verdadeiro mestre e uma espécie de irmão mais velho, embora tivesse idade para ser meu pai.

Tenho o privilégio de ter convivido com alguns amigos que muito me marcaram pelo exemplo das suas vidas e pela generosa partilha do seu saber que usufruí através de uma convivência intensa e duradoura. Entre todos esses amigos conto o João Moreira, aquele com quem mais tempo tive a oportunidade de privar, de trabalhar e de aprender.  

O relacionamento de amizade que mantive com João Moreira foi mais intenso, foi até cúmplice, pois as circunstâncias da vida proporcionaram-nos uma maior proximidade e um inquestionável companheirismo. Quando Celestino Graça morreu, cumpriram-se cinquenta anos no passado dia 24 de Outubro, João Moreira sucedeu-lhe em algumas das suas funções, nomeadamente na direcção do Festival Internacional de Folclore de Santarém e na representação de Portugal nas assembleias mundiais do CIOFF.

Por esse tempo eu, ainda menino e moço, acompanhava Celestino Graça e passei então a seguir as pisadas de João Moreira, integrando pela primeira vez a Comissão Organizadora do Festival de Santarém no ano de 1977. O facto de ser então um dos responsáveis pela direcção dos Grupos Infantil de Dança Regional e Académico de Danças Ribatejanas – ambos fundados e dirigidos até à hora da sua morte por Celestino Graça – impôs-me um frequente aconselhamento com João Moreira, dada a sua reconhecida experiência no meio.

Desde então, em Lisboa, onde João Moreira trabalhava e vivia, ou em Santarém e em Vila Nova de S. Pedro, durante os fins-de-semana que aqui passava, o contacto era assíduo. Havia sempre conversas para pôr em dia e embora nem sempre estivéssemos de acordo em relação a alguns aspectos havia uma imensidão de ensinamentos que retinha dos seus judiciosos conselhos. 

João Moreira detinha uma excepcional cultura geral e apreendia tudo com a maior das facilidades, caldeando a sua sabedoria com os conhecimentos que resultavam da sua infância passada entre Santarém e Vila Nova de S. Pedro, terra de seu querido pai, pelo que estas conversas eram sempre muito profícuas.

Onde João Moreira dava cartas como ninguém era na empatia fácil e muito afectuosa com os grupos folclóricos, nacionais e estrangeiros, gerando uma ambiência extraordinária, pelo que acompanhar João Moreira em qualquer festival, no país ou por esse mundo fora, era uma experiência singular. 

Ainda hoje, tantos anos volvidos sobre esses tempos áureos de João Moreira, é notória a sua influência na maioria dos festivais de folclore que se realizam no nosso país, pois este saudoso amigo estava sempre disponível para aconselhar quem se lhe dirigia com a maior das franquezas, sendo que, igualmente, não deixava de tecer alguns reparos em relação ao que lhe parecia menos bem. Mas, a forma como o fazia e, sobretudo, a intenção positiva com que o fazia, tornavam-no sempre muito apreciado.

Mas, seria redutor evocarmos João Moreira apenas pela sua paixão e sabedoria na área do folclore, posto que na sua vida este amigo tocou os sete instrumentos, desde logo na vertente musical, sendo um dos fundadores da Orquestra Típica Scalabitana, a par do Maestro António Gavino. No Círculo Cultural Scalabitano João Moreira foi actor teatral e até fez de palhaço, formando parelha com o comum Amigo António Cacho. A célebre dupla do “Tonecas e Juanito”, que enchia de alegria as crianças desse tempo.

João Gomes Moreira, colaborou com a Rádio Ribatejo, na parte administrativa e na locução de alguns programas, com o Jornal Correio do Ribatejo, onde foi um dos mais prolixos colaboradores e apoiando a redacção como “Director de Verão” quando o Dr. Virgílio Arruda andava em veraneio pela Europa, e integrou a secção cultural da Associação Académica de Santarém, coadjuvando os amigos Joaquim Veríssimo Serrão e António Cacho, entre outros, na organização de conferências e de colóquios.

A convite de Celestino Graça, João Moreira integrou a Comissão Executiva da Feira do Ribatejo / Feira Nacional de Agricultura, ocupando-se de diversos pelouros, mas fundamentalmente do Folclore, nacional e estrangeiro, vindo a ser um pilar na organização do Festival Internacional de Folclore de Santarém. Nesta fase João Moreira chegou a integrar o conjunto musical dos Grupos Infantil e Académico de Santarém, tocando guitarra, o que lhe permitiu participar em inúmeros festivais de folclore no país e no estrangeiro.

A irrequietude e o espírito de curiosidade de João Moreira, associados à sua infinita generosidade, fizeram com que este Cidadão do Mundo se interessasse por tantas outras áreas do lazer, da cultura e do espectáculo, desde o campismo, à defesa do património histórico-cultural, passando pelo turismo e pelo fado de Coimbra.

Como funcionário municipal João Moreira também se destacou nos serviços de contabilidade, e sobretudo no turismo e na Biblioteca Municipal Braamcamp Freire, onde teve o engenho de inovar alguns procedimentos. Foi por sua iniciativa que se construiu um pequeno parque de campismo na Mata municipal, junto aos Paços do Concelho, que ainda funcionou, embora com muitas limitações, até pouco depois do 25 de Abril.

Evocar uma personalidade como João Moreira é tarefa árdua e ingrata na medida em que, por mais que o tentemos, nunca conseguimos abordar satisfatoriamente a sua intensa e valiosa acção. O conhecimento enciclopédico de João Moreira era uma das suas mais-valias, pois não havia conversa que alimentássemos em que este nosso Amigo não interviesse com judiciosos e pertinentes contributos.

O tempo esvai-se muito celeremente, o que torna mais distante a convivência com este saudoso Amigo, mas a sua ausência torna-se mais notada pela falta que nos faz a companhia de pessoas assim tão referenciais, que cultivavam valores fundamentais que pautaram uma vida plena de dignidade.

Sermos Amigos de João Moreira é uma honra e um orgulho que o tempo e a saudade não logram reduzir e muito menos matar! Obrigado, João Moreira!

 

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