O médico acusado de envolvimento no esquema de receituário forjado que lesou o Estado em mais de 2 milhões de euros negou no Tribunal de Santarém, ter sido cúmplice do farmacêutico que alegadamente concebeu o plano.

Na primeira audiência do julgamento, o médico que dava consultas na Liga dos Combatentes de Abrantes, e que é acusado de ter passado um número “avultado” de receitas forjadas que depois eram entregues na farmácia gerida pelo principal arguido, admitiu ter “facilitado” que a burla ocorresse, ao deixar receitas assinadas e com a vinheta junto de um funcionário, mas assegurou que desconhecia que estavam a ser usadas num esquema fraudulento.

“Facilitei, mas não fui corrupto”, declarou, assegurando que nunca se tinha apercebido do elevado número de receitas em que consta o seu nome e que integram as cerca de 8.000 que foram juntas ao processo.

O proprietário e diretor técnico das duas farmácias que terão servido para o recebimento ilícito de comparticipações do Serviço Nacional de Saúde, num valor global de 2.116.392 euros (uma em Abrantes e outra, a partir de janeiro de 2017, em Lisboa), declarou ao coletivo presidido pela juíza Cristina Almeida que pretende prestar declarações numa fase posterior do julgamento.

Este arguido é acusado de ter concebido e executado um plano de angariação de receituário forjado, sobretudo de medicamentos com elevados valores de comparticipação pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS), entre fevereiro de 2012 e julho de 2017, num processo que envolve outros 24 arguidos singulares e as duas farmácias.

Na sessão de hoje foi ainda ouvido um dos alegados angariadores de receitas, um ex-toxicodependente, que disse ao Tribunal ter ouvido falar do esquema no Café Portugal, em Abrantes (cujo proprietário é igualmente arguido), e que passou a entregar ao funcionário da Liga dos Combatentes uma lista com os nomes dos medicamentos para a emissão de receitas em seu nome, da sua mãe, do irmão e de uma tia, usando o cartão de sócio de uma familiar.

Segundo declarou, essas receitas eram entregues pessoalmente ao proprietário da farmácia, que, alguns dias depois, lhe pagava algumas quantias em dinheiro, que variavam entre os 50 e os 70 euros.

Os arguidos, entre os quais se incluem ainda uma funcionária do Montepio Abrantino (que alegadamente terá passado receitas usando abusivamente as palavras-passe das médicas da instituição) e várias outras pessoas que entraram no esquema fornecendo nomes e números de utentes seus e de familiares para a obtenção das receitas, são acusados de falsificação de documentos e burla agravada.

Para o farmacêutico e para o médico, o Ministério Público pede ainda uma pena acessória de proibição do exercício de funções.

O esquema passava pelo envolvimento de indivíduos residentes na zona de Abrantes que tomavam medicação de forma contínua ou eram toxicodependentes, que pediam receitas médicas, sobretudo de antipsicóticos com elevada comparticipação, em centros de saúde da região, na Liga e no Montepio Abrantino.

O farmacêutico encontra-se em prisão domiciliária com vigilância eletrónica.

A próxima sessão do julgamento está agendada para o próximo dia 09.

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