Pedro Cabeleira, natural do Entroncamento, é realizador e fundador da produtora VIDEOLOTION, juntamente com Joana Peralta, Marta Ribeiro, Tiago Simões e Victor Ferreira, onde desenvolve projectos ligados ao cinema, videoclips, televisão e publicidade. Verão Danado (2017) foi a sua primeira longa-metragem, que teve estreia mundial no Festival de Locarno (Suíça), onde recebeu uma menção especial do júri.
A sua mais recente produção é a curta-metragem By Flávio, rodada em Torres Novas, e foi seleccionada para integrar a competição Berlinale Shorts do festival de Berlim, que está a decorrer de 10 a 20 de Fevereiro, na Alemanha. Em entrevista ao Correio do Ribatejo, o jovem realizador fala do seu percurso no mundo do cinema, o que pretende transmitir com os seus filmes e até onde pretende chegar na sétima arte.

Sempre ambicionou trabalhar no mundo do cinema?
Se eu sempre ambicionei ser realizador ou trabalhar em cinema… na realidade surgiu aos 16 anos proposto pelos meus pais, estava para ir para economia, mas andava um pouco perdido e os meus pais sugeriram a escola de cinema. A partir daí foquei-me muito, sempre gostei muito de ver filmes, mas comecei a tentar descobrir mais filmes, novos tipos de cinemas, novas linguagens. Fiz uma espécie de curso intensivo por mim próprio antes de entrar na escola. A escola necessita de conhecimento prévio e foi preciso preparar-me.

Qual foi o momento em que percebeu que era isto que gostava de fazer, que queria ser realizador?
Apercebi-me que queria ser realizador quando descobri o que era isto de fazer filmes… descobri os diferentes cargos dentro de uma equipa, e percebi que a ideia de realizar, era aquela ideia onde se consegue por as sensações e emoções que gosto de ver nos filmes. São tudo decisões de realização e ai percebi que o que queria fazer era realizar.

Como nasceu a curta ‘By Flávio’?
O By Flavio surgiu num período que andava a tentar arranjar financiamento para a minha segunda longa metragem, e então decidi tentar financiamento para curtas metragens porque era mais acessível. Convidei a Ana Vilaça e como sabia que ela teria interesse em escrever, convidei-a para co-escrever o filme comigo. Convidei o Diogo Figueira, que era quem estava comigo a escrever a longa metragem, e a partir daí o Diogo relatou uma imagem que viu durante o Verão na Nazaré na praia, uma mãe a pousar para uma serie de fotografias e quem estava a tirar fotografias era o filho dela. E começamos a desenvolver essa personagem, nesta era digital, e foi o ponto de partida. O Flávio é o filho da personagem, é ele que está a tirar as fotos e por isso é que se chama by Flávio.

Qual é a razão para ser rodada em Torres Novas?
Sou do Entroncamento, estava a preparar um filme cá. Uma das coisas que estabeleci seria que o filme teria que se passar em Torres Novas, era uma zona que já estava a explorar. Foi uma coisa natural, era na zona, havia o Torreshoping que é o grande Decor do filme todo. A grande razão é ser do Entroncamento e é uma zona não muito explorada.

Esta é uma curta-metragem que pretende quebrar estigmas?
Acho que o meu trabalho pretende quebrar estigmas ou convenções que não sejam as mais correctas. Interessa muito quebrar a ideia que uma mãe solteira deixa de ser mulher. Tirar esse estigma que uma mulher solteira que se arranja ou que procure ter uma vida enquanto mulher tem que ser julgada. Julgo ser um dos estigmas que quero quebrar. É uma personagem que ama o filho, mas não deixa de ser mulher, de se sentir mulher, de ter controlo sobre o que quer fazer. O filme tenta ir contra a ideia que uma mulher, especialmente mãe solteira, ter que abdicar de parte da sua vida, e o filme tenta ir contra isso.

Como vê a admissão do filme no Berlinale Shorts do festival de Berlim?
A selecção do filme no Festival de Berlim é fantástica. Provavelmente vão haver mais pessoas a olhar para o filme com outro olhar. Vai ser mais visto e já desbloqueou uma das etapas mais frustrantes que é a estreia do filme. Temos os filmes feitos e não os conseguimos mostrar… e só o facto de já termos conseguido desbloquear essa etapa é um passo muito grande. Espero que possa ajudar no percurso do filme.

Foca-se em abordar temas relacionados com os jovens da sua geração. Porquê?
Foco-me nos jovens da minha geração porque até agora tenho trabalhado com orçamentos mais pequenos e sinto que ainda não havia uma representação de juventude que acho fiel, pelo menos para a minha geração. São temas que tenho trabalhado, que me têm fascinado. O ponto de partida para os nossos filmes é nos questionarmos a nós próprios. Questionar também a nossa geração, como nos vemos no mundo. Perceber quem somos.

Em que é que baseia os seus filmes?
Os meus filmes baseiam-se em coisas que vejo, pessoas que encontro, coisas que oiço. O by Flávio e o próximo também será muito baseado na realidade e pretendem ser sustentados no nosso mundo e na nossa realidade.

Com que realizadores e actores, gostaria de trabalhar?
Seria o Paul Thomas Anderson, o meu realizador vivo preferido. Gostava de ver o processo de trabalho. Como é que ele trabalha com os actores. Ao nível de actores já trabalho com eles. É muito difícil porque ai seriam muitos para enumerar. Também depende do projecto.

Como caracteriza o ensino de cinema em Portugal? É completo ou, como o ensino em quase todas as áreas, necessita de grande trabalho autodidáctico?
Cinema é muito difícil de ensinar. Como qualquer estudo artístico, uma coisa é uma área mais técnica, como trabalhar com uma câmara. Acho que Portugal tem uma serie de escolas que dão um bom know-how técnico. Mas ensinar cinema é ingrato, é subjectivo. Mas tem aparecido excelentes cineastas. Há sempre também um trabalho de casa, mas isso tem a ver com o gosto e interesse que temos pela arte. Mas em Portugal pode-se aprender a fazer cinema, e parte dos meus colegas com sucesso também o fizeram cá.

Quais são as suas principais influências?
As minhas influencias são, as principais, o Paul Thomas Anderson, realizador americano contemporâneo e a minha maior referencia é o Stanley Kubrick sem dúvida.

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