Em edição de aniversário é inevitável algum revivalismo, algum saudosismo e uma valorização de tempos idos. “Recordar é viver”, como diz uma expressão popular e uma velha canção. Contudo, os tempos de pandemia são de alerta e atenção ao presente; pouco propícios para visitas ao salão da memória.

Neste sentido, o número de aniversário do Correio Do Ribatejo parece vir em contraciclo: uma evocação de uma longa história, numa altura de avidez de informação diária imediata sobre a situação em curso. Parece, mas não é! É nos tempos de dificuldades que se vê a fibra de que somos feitos. Ter os leitores e a redação em casa, em quarentena, e, mesmo assim, não interromper 129 anos de história de publicações ininterruptas para que o exemplar do jornal não falte nas bancas que permanecem abertas, nem nas caixas de correio dos assinantes, é obra. E é também a atitude que está à altura dos desafios, sempre vencidos, da história de um jornal que já testemunhou revoluções e grandes conturbações políticas, cheias devastadoras, pandemias, acidentes trágicos e grandes crises financeiras. Recordar pode ser viver, mas só resistir é vencer.

Há muitos anos, entrei num restaurante no Havai e uma fotografia emoldurada na parede chamou a minha atenção. Um casal de noivos sorridentes, rostos colados, numa pose típica de dia de casamento. Mas não era um casamento como os outros. O cenário era de devastação. Árvores no chão, destroços de um terraço; o terraço daquele mesmo restaurante. Nas vésperas do casamento, um ciclone (frequentes naquele arquipélago) causou grande destruição mas os noivos casaram, mesmo assim, sobre os destroços, felizes. Não sorriam para o passado, sorriam para o futuro.

Miguel Castanho – Investigador em Bioquímica

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