Fui ao médico. Perguntou-me o que eu sentia. Disse-lhe que sentia muita falta de dinheiro. “Acha que isto é grave, doutor?” – perguntei.

Vamos ver… Vamos ver… Escreveu, escreveu, e deu-me uma requisição para análises ao sangue e urina tipo II, mais ecografia à conta bancária, com relatório.

Voltei passado algum tempo, com os exames de diagnóstico pedidos. “Pois…” – disse ele – “o senhor está com valores muito baixos… Tem uma patologia congénita de cariz hereditário. Lembra-se de alguém na sua família que tenha sofrido de pobreza?”

Foi então que me lembrei que os meus antepassados também tiveram os mesmos sintomas que eu. Bolsos vazios, salários mínimos obrigatórios, muitas dores de cabeça, e uma incontrolável vontade de comer. Nunca nenhum dos meus familiares conseguiu poupar alguma coisa. Apenas economizavam no papel higiénico. Como não comiam…

O médico explicou-me então que se trata de uma doença propagada pelo mundo, e que afecta grande parte da população.

Fomos conversando (ele não é daqueles que atende 20 doentes numa hora) e expressou a sua opinião afirmando que infelizmente há poucas pessoas saudáveis.

Disse que há gente que tenta tudo para se curar, mas são poucos os casos de sucesso. Há até pessoas que chegam ao ponto de trabalhar todos os dias!

“Bem…” – disse ele pegando na caneta – “O senhor vai fazer duas raspadinhas por dia, uma de manhã e outra à noite, toma este xarope dos Jogos da Santa Casa, e põe um supositório da Autoridade Tributária todos os meses.”

Todos os meses, doutor?! – “Sim. É uma questão de hábito!”

In: ‘Correio do Ribatejo’ de 17 de Maio de 2019

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