É sabido como Benavente constitui o lugar onde, no que se relaciona com o culto do Divino Espirito Santo (e devido a Álvaro de Azevedo1), possuímos a melhor e mais completa descrição das referidas Festas do Divino (e distribuição domiciliária do bodo) do período pré Império; ainda no século XIII.
Por razão idêntica, Benavente tem o condão de nos surpreender, também, no que respeita ao tão exótico e peculiar culto “gonçalino”, havendo conhecimento da sua configuração quinhentista como um dos exemplos conhecidos mais a sul.
Também aí encontramos notícia da festa referente ao culto a São Gonçalo no século XVI2 e mantendo-se a data correspondente ao dia consagrado ao santo (10 de Janeiro) o que remete para uma situação de preservação cultual que, contudo, pode decorrer de dois fatores: um culto mantendo a temporalidade primeva por significativo apego devocional ou, pelo contrário, um culto vestigial cujas motivações não justificavam uma alteração temporal.
Dele, nos diz Justino Silva “Este frade dominicano ficou conhecido como incansável protetor de toda a gente humilde”. E, citando o Padre António Vieira, conclui “a ele se encomendam os pastores, os gados, os lavradores e as sementeiras. A ele pediam o sol e a chuva”3.
Mas a valência casamenteira mantinha aqui, como sempre, especial importância, sendo dito que, também as raparigas a ele recorriam. E na impossibilidade de puxar o cordão que atava o seu hábito dominicano, tal como em Amarante (levando ao bambolear da sua imagem, entendida como expressão de assentimento) irem dar o tradicional “nó numa giesta” pedindo deste modo para, diligentemente, as casar.
Pois, como em toda a parte em que o seu culto floriu, São Gonçalo é, igualmente aqui, o santo protetor contra as vicissitudes negativas da vida matrimonial enquanto eclosão e manutenção.
Ó meu Senhor São Gonçalo
Aqui tens duas donzelas
Uma já não é bem moça
E a outra já falam dela!
Afinal, São Gonçalo, enquanto casamenteiro, constitui o advogado das situações matrimoniais difíceis. E se um qualquer São João ou Santo António, são suscetíveis de casar as raparigas jovens e airosas, se já assim não tão novas ou não constituindo paradigmas de beleza, só um especialista nesses atributos (cujas valências fecundantes são intensas e pujantes) poderia ter êxito em tais desideratos.
Já para não falar das prostitutas, é claro!
1 Álvaro D’ Azevedo, Benavente Estudo Histórico-Descritivo, Lisboa, Câmara Municipal de Benavente, 1981.
2 Mais precisamente em 1560 In Mário Justino Silva e Maria Filomena Santos Henriques, Aspetos da religiosidade popular do concelho de Benavente, Benavente, C.M de Benavente, 1999, pp. 29-30.
3 Ibidem. E se no Porto eram (entre outros) os correeiros e latoeiros que o festejavam como orago e milagreiro, aqui se apresentava, ainda, como protetor dos pobres e, nas palavras do Padre António Vieira, como advogado dos campos e gados (setores ligados às componentes fertilizantes e fecundantes, não esqueçamos) e inclusive como entidade meteorológica.

