Pedro Maria Carvalho lançou recentemente a obra ‘Sentidos de Pertença – O Bom e o Mau’, um livro que convida à reflexão sobre a ligação às nossas raízes, a identidade cultural e os desafios do sentimento de pertença. Através da sua própria experiência, o autor questiona se essas ligações são autênticas ou construções sociais e analisa como a história, a arquitectura e a cultura moldam a nossa visão do mundo. Entre a pertença local e a cidadania global, Pedro Maria Carvalho propõe um olhar crítico sobre a forma como o apego às origens pode unir comunidades, mas também alimentar conflitos, numa abordagem que vai desde o Ribatejo até aos cenários internacionais da Ucrânia e da Palestina.
O que o motivou a escrever este livro e a explorar o conceito de pertença?
Devo começar por esclarecer que nunca poderia ter a veleidade de abordar esta temática sob um ponto de vista científico ou académico, tanto que não possuo qualificações para tal.
As minhas próprias vivências constituem o ancoradouro para a alusão a toda uma miríade de assuntos, revelando a minha visão do mundo.
O fio condutor é esse tal “sentido de pertença”, que é abordado nas experiências de vida resultantes das várias actividades que fui desenvolvendo, e que vou transitando para uma esfera macro ao longo do livro.
A verdade é que o conceito de pertença sempre me fascinou. Ele está presente nos nossos laços familiares, culturais e territoriais. No entanto, é também desafiador, pois a pertença tanto pode unir como dividir.
No livro, questiona se as nossas ligações às raízes são autênticas ou construções sociais. O que o levou a essa reflexão?
Essa reflexão nasceu da observação de como narrativas familiares, culturais e históricas moldam as nossas identidades. Muitas vezes, as raízes que defendemos com fervor podem ser construções sociais ou narrativas transmitidas ao longo das gerações. Este questionamento não é para negar essas ligações, mas para entendê-las com mais profundidade, reconhecendo o quanto moldam a nossa percepção de pertença.
De que forma a arquitectura, a história e a cultura locais moldam a nossa identidade e a nossa relação com o território?
A arquitectura é um reflexo físico da identidade de um lugar; ela conta histórias através do espaço. A história local enraíza-nos no tempo e dá contexto às nossas experiências. A cultura, por sua vez, é o elo vivo entre o passado e o presente. Juntas, essas dimensões constroem um senso de pertença que vai além do físico, conectando-nos emocionalmente ao território.
Refere os conflitos que emergem do apego à identidade e à terra, mencionando episódios na Ucrânia e na Palestina. Como estas realidades se enquadram na sua análise?
Esses conflitos ilustram o lado mais trágico da pertença: quando identidades e raízes são usadas como armas para justificar divisões e violência. Tanto na Ucrânia quanto na Palestina, as narrativas de pertença tornam-se centrais para legitimar reivindicações territoriais e culturais. No livro, analiso como esses apegos podem ser usados para unir comunidades, mas também para perpetuar disputas.
O livro aborda a dualidade entre pertença local e cidadania global. Como podemos equilibrar ambos os conceitos sem cair em nacionalismos ou desapego cultural?
O equilíbrio exige um reconhecimento de que a pertença local não tem de ser necessariamente incompatível com a cidadania global. Podemos valorizar as nossas raízes sem esquecer as responsabilidades para com o mundo. É uma questão de empatia e de compreender que, embora diferentes, as nossas histórias estão interligadas. Combater nacionalismos exacerbados implica celebrar a diversidade e encontrar pontos de conexão entre culturas, como aliás tão bem se faz no Festival Celestino Graça – A Festa das Artes e das Tradições Populares do Mundo.
Que impacto espera que este livro tenha nos leitores? Como gostaria que influenciasse a forma como encaramos as nossas raízes e responsabilidades colectivas?
Esperaria que o livro encorajasse os leitores a reflectirem sobre as suas próprias histórias pessoais e pertenças, mas também a questionarem o que isso significa no contexto global.
Um título para o livro da sua vida?
Entre Raízes e Horizontes.
Viagem?
Percorrer a Rota da Seda, da Ásia à Europa.
Música?
Requiem de Mozart.
Quais os seus hobbies preferidos?
Leitura, corrida (estrada e trail) e folclore ribatejano.
Se pudesse alterar um facto da história, qual escolheria?
A morte em Junho de 1914 do Arquiduque Francisco Fernando, herdeiro da coroa do império Austro-Húngaro.
Se um dia tivesse de entrar num filme, que género preferiria?
Drama histórico, pela sua profundidade narrativa.
O que mais aprecia nas pessoas?
A autenticidade e a empatia.
O que mais detesta nelas?
A intolerância e a maldade.