Depois de 1976, 1994 e agora também 2020, passaram a ser três os anos em que não se realizou o Festival ‘Celestino Graça’. Este ano foi a pandemia que veio alterar todos os projectos…
Sim, é verdade. A organização do Festival “Celestino Graça” exige que comecemos a definir a programação e a convidar os grupos participantes com um ano de antecedência, de modo que em finais de Janeiro tudo estava já a postos para a edição deste ano. Entretanto, as sucessivas medidas restritivas definidas pela Direcção Geral de Saúde e pelo Ministério da Cultura foram-nos alertando para as dificuldades inerentes a esta realização, até que, mais tarde, em articulação com a Câmara Municipal de Santarém, tivemos de assumir o cancelamento do evento. Lamentamos, como se compreenderá, esta decisão, mas não havia outro caminho. Até porque um festival internacional como o nosso tem especificidades próprias que mais agravam a sua organização. Receber grupos de diversos continentes, com a eventualidade de podermos ter de exigir o cumprimento de quarentena para alguns deles, conforme a sua proveniência, e as exigências ao nível dos transportes, do serviço de refeições e do alojamento complica ainda muito mais a nossa logística…

As novas regras sanitárias implicariam mais custos, certamente…
Sim, necessariamente. O princípio do cumprimento do distanciamento sanitário impõe que um autocarro apenas possa transportar pessoas até ao limite máximo de metade da sua lotação, logo os custos de transporte duplicam. Pelas mesmas razões, no Salão da Casa do Campino onde habitualmente servimos, em simultâneo, cerca de 250 refeições, teríamos de desdobrar este serviço em pelo menos dois turnos, o que implicaria que o serviço de uma refeição que, normalmente, dura pouco mais de uma hora passaria a durar cerca de três horas, posto que após o serviço do primeiro turno teríamos de higienizar todo o espaço para receber os comensais do segundo turno. Ora, por exemplo, o almoço que deveria estar terminado por volta das duas horas da tarde, só acabaria cerca das quatro horas, o que acarretaria transtornos ao cumprimento da programação. O mesmo aconteceria, ainda, em relação ao alojamento. Actualmente, e mercê dum espírito de cooperação extraordinário do Centro Educativo de Solidariedade Social da Estação Zootécnica Nacional – Fonte Boa, a quem estamos imensamente gratos, conseguimos acomodar ali, condignamente, cerca de 140 pessoas. No contexto da pandemia, apenas conseguiríamos alojar cerca de 70 pessoas. Ora, os encargos financeiros com o alojamento mais do que duplicariam, para além do transtorno com as deslocações de dois pontos de alojamento distintos.
Finalmente, também há que ter em conta os constrangimentos inerentes à presença de público na Casa do Campino. Teríamos de limitar o número de espectadores e aumentar as condições de acomodação decorrentes das exigências que nos são impostas, num quadro de prevenção e de segurança de todos. Se se mantiver este quadro pandémico no futuro, não sabemos bem se vamos conseguir levar por diante o Festival “Celestino Graça” com a qualidade e a grandeza que já atingimos.

Desde sempre a maior preocupação do Festival tem sido a questão financeira. Neste domínio as coisas não são fáceis?
Não. Fáceis, nunca estiveram. Até somos levados a pensar que não somos capazes de trabalhar numa situação de facilidades, sobretudo, financeiras. Porém, no actual contexto, o mais preocupante é o elevado grau de incerteza em relação ao futuro… O Festival “Celestino Graça” exige uma planificação com muita antecedência e a assumpção de responsabilidades junto dos grupos participantes e das instituições que colaboram connosco tem de, igualmente, ser efectivada com muita antecedência e receamos que no próximo ano ainda possamos estar a viver um período de muitas incertezas. Mas, tenhamos esperança de que a situação possa evoluir favoravelmente, embora tenhamos perfeita consciência de que nada será como antes. Para o bem e para o mal… Deste modo teremos de adequar a nossa programação às condicionantes que caracterizarem cada edição, e ajustar os nossos compromissos às receitas que formos capazes de angariar. O “vil metal” continua a ser a mola real de qualquer organização cultural, ainda que no nosso caso ninguém extraia um cêntimo de proveito pessoal com a sua colaboração, pois, se não fosse assim, então, seria quase impossível levar por diante um projecto desta grandeza.

Numa altura em que seria precipitado fazer grandes planos a longo prazo, o mais sensato é aguardar o evoluir dos acontecimentos…
Aguardamos serenamente. Ou tão serenamente quanto possível. O actual formato do Festival “Celestino Graça” está consolidado. O público do Festival, bem assim como os participantes e as entidades com quem estamos envolvidos nesta organização têm-nos dado sinais de que estamos no caminho certo. Agora, o trajecto que temos de percorrer é o da sua valorização. Temos de apostar cada vez mais na qualidade, quer ao nível das condições de acolhimento na Casa do Campino, quer na aposta em alguns artistas mais mediáticos, nomeadamente na Gala do Fado.
Um dos desafios que colocámos em cima da mesa para este ano foi a internacionalização do público do Festival “Celestino Graça”, para aproveitarmos o enorme fluxo turístico de Lisboa e até a fixação de emigrantes em localidades próximas de Santarém. Neste sentido candidatámo-nos a um programa específico da Entidade Regional de Turismo do Alentejo e do Ribatejo, tendo a nossa candidatura sido aceite, o que implica da nossa parte a aposta em publicidade em diversos idiomas e a intensificação promocional do Festival em hotéis, em postos de turismo e em agências de viagens de Lisboa e da nossa região. O Festival “Celestino Graça” já oferece uma programação, em termos de quantidade, de diversidade e de qualidade, que justifica dar este passo. Esta poderá ser a grande novidade para o próximo Festival.

O Festival Celestino Graça continua com a chancela do CIOFF?
Sim, somos membros fundadores do CIOFF. Celestino Graça e João Moreira participaram na Assembleia fundadora deste prestigiado organismo mundial em Confolens, em 1970, e desde então sempre fizemos parte do CIOFF. Inclusivamente, desde que foi criada a Associação CIOFF Portugal – que actualmente é presidida pelo Dr. Francisco Madelino, na qualidade de Presidente da Fundação INATEL – sempre integrámos os órgãos sociais desta Associação, pelo que, histórica e culturalmente, temos a obrigação de zelar pelo seu excelente funcionamento, e de darmos um exemplo das boas práticas estimuladas pelo CIOFF.

O Grupo Académico de Danças Ribatejanas assume a organização exclusiva do Festival desde 1995. É uma situação pacífica para o Grupo?
Claro que sim. O Grupo e o Festival têm em comum muitos factores, um dos quais, e eventualmente o mais importante, é que temos o mesmo Fundador, Celestino Graça, e mesmo quando o Festival era organizado pela Comissão da Feira do Ribatejo, sempre fomos considerado o Grupo do Festival, participando em todas as edições e colaborando com membros do Grupo na Comissão do Festival, nomeadamente João Moreira, uma das pessoas mais influentes na organização, Graça Maria Madeira da Graça Rodrigues, José António Brandão da Silva, Fausto Plaza, João Cotrim, Paulo Semblante Mendes, Carlos Dantas, Pedro Carvalho, Cristina Graça Rodrigues, Helena Isabel Marques Duarte Segurado, e outros… Assim, é fácil concluir que o Festival “Celestino Graça” ocupa um lugar destacadíssimo na vida do Grupo Académico, aliás, com especial repercussão no seu próprio orçamento.

O Grupo Académico tem vantagens ou desvantagens com a exclusiva organização do Festival?
O simples facto de o empenhamento do Grupo Académico ter impedido a extinção do Festival já é um aspecto muito favorável, sendo, igualmente, relevantes os múltiplos contactos que esta circunstância nos tem proporcionado. O único inconveniente que constatamos é que durante muito tempo se confundiu a actividade do próprio Grupo com a organização do Festival, o que tinha reflexo menos positivo na obtenção de subsídios. Os apoios eram investidos na organização do Festival, e já não havia mais apoio para a actividade específica do Grupo, nomeadamente ao nível das digressões ao estrangeiro ou até para a aquisição de trajos e para a manutenção da nossa Sede.
Durante muitos anos o Grupo Académico declinou convites para participar em importantes festivais internacionais no estrangeiro por não ter capacidade financeira para custear estas digressões. Neste aspecto podemos considerar que o Grupo foi penalizado por ser o organizador do Festival, no mais nunca sentimos qualquer outra desvantagem. Tanto mais que todos os Componentes dos Grupos Infantil e Académico, bem assim como os seus familiares mais directos e amigos, se têm envolvido na organização do Festival, que, como se compreenderá, exige muita mão de obra…

Tecnicamente o Grupo Académico está bem?
Não seremos nós quem melhor poderá fazer uma avaliação desta natureza. Tudo isto é muito subjectivo. Nós sentimos a consciência tranquila pelo trabalho que temos desenvolvido no respeito pelo legado de Celestino Graça e pela sua valorização, que inclusivamente, passou pela introdução de algumas alterações. Os tempos mudam, o conhecimento teórico sobre esta temática evoluiu bastante e houve necessidade de ajustar alguns pormenores técnicos. Esta atitude resultou em assumida homenagem à memória daquele que é seguramente o melhor etnógrafo ribatejano de todos os tempos – Celestino Graça.
Promovemos a valorização do quadro etnográfico dos nossos Grupos, numa acção que nunca estará completa nem isenta de erros, e corrigimos alguns aspectos ao nível coreográfico e musical. Suprimimos mesmo algumas danças do nosso reportório. Na nossa perspectiva melhorámos a qualidade dos Grupos. O público, nacional e estrangeiro, perante quem nos apresentamos congratula-nos pelo nosso nível técnico. Agradecemos, mas não nos deslumbramos, embora saibamos que há sempre alguém que enxerga o argueiro que está no olho do seu vizinho, porém não repara na trave que está no seu próprio olho… Também já aprendemos a conviver com esta realidade e continuamos a ser fiéis ao nosso propósito, que é, fundamentalmente, o de honrar a memória de Celestino Graça e de dignificar o património etnográfico e folclórico ribatejano.

E o Grupo Infantil continua a ser fundamental para garantir o futuro do vosso projecto…
Naturalmente se não fosse a existência do Grupo Infantil não teríamos possibilidade de manter o Grupo Académico com tanta qualidade e com tantos Componentes. Há muita gente que menoriza a valia de um grupo de folclore, supondo que estes grupos são constituídos por pessoas de baixo nível social e de pouca formação académica, o que constitui um erro crasso, pois não há praticamente nenhum grupo de folclore no nosso país que não tenha no seu seio componentes com formação universitária. No nosso caso temos cerca de 20 pessoas com formação universitária e outros tantos com graus médios de ensino, o que para nós, apesar de tudo, é pouco relevante, pois entre nós ninguém faz uso dos respectivos títulos académicos. Somos todos iguais e temos todos os mesmos direitos e as mesmas obrigações.
Se não captarmos componentes nas idades compreendidas entre os seis e os 12 anos perdemo-los para outras actividades culturais e, sobretudo, desportivas. É difícil captar elementos a partir dos 13 ou 14 anos. Por outro lado, com o ingresso dos componentes em idades mais jovens não só se torna mais fácil a sua aprendizagem como, também, a transmissão da mística dos nossos Grupos. Que a temos e não queremos perder, nem desvirtuar.

Como é que a juventude encara a sua participação no Grupo Académico?
Quem está no nosso Grupo está por vontade própria e porque gosta de estar. Ninguém é obrigado a pertencer ao Grupo, sendo que, naturalmente, se espera de quem faz parte do Grupo que cumpra a sua actividade com dedicação, com respeito e com empenho. Às vezes lá há um ou outro que se distrai, mas, em regra, temos a sorte de contar com pessoas muito bem formadas e responsáveis. Para nós, o melhor ensinamento é o exemplo, e nós, os mais velhos, tentamos dar-lhes bons exemplos, a todos os níveis.

Esta situação é transversal a todos os Grupos Folclóricos portugueses?
Contrariamente à imagem que muitas vezes transparece, o movimento associativo folclórico é constituído na sua grande maioria por jovens. No entanto, estes jovens vivem de forma mais intensa a actividade dos Grupos em que estão integrados e não têm tanto interesse pelos espectáculos de folclore. São parte do espectáculo, mas, normalmente, não fazem parte do público, o que constitui algo que merece uma séria reflexão e adequadas intervenções por todos nós. Agora, por exemplo, a Federação do Folclore Português tem organizado anualmente um Congresso de Jovens Folcloristas e habitualmente participam activamente mais de 600 jovens, o que é muito interessante.

A manutenção de dois Grupos Folclóricos acarreta muitas dores de cabeça?
É verdade. Somos cerca de 60 pessoas a pensar cada uma de sua maneira. É necessário um grande exercício de coordenação para podermos corresponder às expectativas de todos. Hoje todas as pessoas estão condicionadas a horários, mesmo as crianças que, para além das suas ocupações escolares ainda andam no folclore, ou no teatro, ou no futebol, ou no rugby, ou na equitação, ou na dança clássica, ou no inglês… enfim, toda a gente está assoberbada com múltiplos afazeres, pelo que se torna complicado encontrar um tempo para enquadrar a nossa actividade. Mas, felizmente, com a dedicação e boa vontade de todos, temo-lo conseguido. Depois, há os problemas relacionados com a aquisição de trajos, o que constitui um peso significativo nas nossas contas. Somos, de facto, dois grupos, mas as entidades oficiais – Município e União de Freguesias – apenas nos apoia como se fossemos um, porque o nosso Grupo Infantil é uma secção do Grupo Académico, não tendo personalidade jurídica. Mas, apesar de tudo, é muito gratificante chegarmos à sede em dia de ensaio e vermos que lá estão 15 ou 20 meninos a aprender a dançar e a brincar uns com os outros. É a garantia de que temos futuro…

A propósito da Sede, a vossa é muito mais do que um espaço de ensaios…
A nossa sede é, por assim dizer, um centro etnográfico, que cumpre diversas funcionalidades. A original, e preponderante, é, de facto, o espaço onde trabalhamos, onde realizamos os ensaios dos nossos Grupos. Mas, complementarmente, é a sede do Festival “Celestino Graça”, é o espaço de convívio entre Componentes dos Grupos e seus Familiares e Amigos, é um espaço onde organizamos actividades sócio-culturais, como exposições ou conferências, é a Sala de Memória Dr.ª Graça Maria Madeira da Graça Rodrigues, onde expomos as lembranças que nos foram oferecidas ao longo da existência dos Grupos, é o Espaço Museu João Gomes Moreira, onde expomos uma parte do espólio deste nosso saudoso Amigo, a par de uma exposição etnográfica, que temos vindo a enriquecer, com a oferta de algumas peças por parte de pessoas amigas. Ainda há dias o nosso Amigo Jacinto Veloso nos ofereceu duas cangas…

O Museu João Moreira tem crescido?
O Espaço Museu João Moreira tem condições para aumentar, apesar das condicionantes do espaço, mas, com engenho e arte, temos vindo a encontrar algumas soluções em termos da exposição dos objectos que lá temos…

Não é possível aumentar o espaço?
Seria possível, se nos fosse cedida pelo Município uma faixa contígua à nossa sede, onde anteriormente funcionava a Adega Típica de Almeirim, e que, entretanto, foi demolida. Aí poderíamos construir de raiz o nosso núcleo museológico, mas tal não se afigura fácil, tendo em conta a incerteza quanto ao futuro do Campo Infante da Câmara. Por enquanto, vamo-nos limitando a fazer algumas obras de manutenção, tendo agora pela frente um desafio grande que é a reparação da cobertura de todo o edifício, pois quando chove um pouco mais temos de andar a aparar a água em alguidares e baldes…

As obras de manutenção quanto é que poderão custar?
Segundo a estimativa que nos foi feita por um empreiteiro poderemos estar a falar de cerca de 15 mil euros, pois, trata-se de telhados antigos e algerozes que têm de ser reparados ou substituídos, para além da recuperação de alguns espaços no interior, degradados em consequência da infiltração das águas pluviais, nomeadamente o piso do espaço de ensaio, que nestas circunstâncias fica parcialmente inutilizável.

E a concretizarem-se essas obras quem assumirá os custos?
Bem, o Grupo Académico pagará sempre o que puder, como de resto o tem feito desde que lhe foram cedidas estas instalações, no ano de 1978, embora esperemos que seja possível contar com uma colaboração da Câmara Municipal e da União de Freguesias de Santarém. Todavia, há sempre muito trabalho que é feito voluntariamente pelos nossos Componentes, o que reduz o valor dos encargos.

Qual é o orçamento anual do Grupo Académico?
O Orçamento de 2020 atinge os 45.000 euros, porém, infelizmente, este valor não será alcançado, nas despesas nem nas receitas, porque inclui a realização do Festival “Celestino Graça”, que, compreensivelmente, representa cerca de 80 por cento deste valor…

Como é que se financia este montante tão elevado?
Com muita contenção, valorizando todos os cêntimos, não deitando nada fora – tudo é reciclável! – e com a colaboração de todos os Componentes e Directores do Grupo Académico. Naturalmente, o apoio financeiro do Município de Santarém e da União de Freguesias da Cidade de Santarém representa cerca de 50 por cento deste valor. O restante é proveniente do nosso trabalho no bar e na Tasquinha do Festival, ou das Festas de S. José, quando podemos participar, e dos bilhetes de ingresso nos espectáculos do Festival “Celestino Graça”. A cobrança de bilhetes para o Festival, apesar do seu preço, pouco mais do que simbólico – três euros por dia de espectáculo – revelou-se determinante para o equilíbrio das contas, e, neste aspecto, há que agradecer ao público do Festival que reagiu muito bem a esta alteração.

E contam igualmente com ajudas de particulares?
Sim, claro. Desde o empresário agrícola que nos oferece alguns bens da sua produção, à empresa industrial que também nos oferece alguns produtos alimentícios, às famílias que nos oferecem cinco litros de azeite ou dez litros de vinho, ou aos descontos que os nossos fornecedores nos fazem. Em casa pobre como a nossa tudo conta. Complementarmente há também uma grande ajuda do Centro Educativo de Solidariedade Social da Estação Zootécnica Nacional – Fonte Boa, que nos cede os alojamentos em condições extraordinárias, algumas associações que nos emprestam carrinhas de transporte pessoal para deslocar os Grupos de um lado para o outro. Enfim, o Festival só se realiza mercê da generosidade de todos os que se envolvem na sua organização, mesmo através da simples oferta de um bem. Há ainda a considerar, neste aspecto, o contributo dos Membros da Liga dos Amigos do Festival…

A Liga dos Amigos do Festival “Celestino Graça” tem correspondido às expectativas?
Sim, em boa verdade, tem. É claro que a adesão tem sido maior a partir da altura em que começámos a cobrar bilhetes para os espectáculos, uma vez que um “Amigo” pode pagar uma quota anual de apenas dez euros – o valor é facultativo, a partir deste valor – e tem acesso gratuito em todos os dias do Festival. Se tivesse de pagar bilhete em todos os dias de espectáculos o valor a despender seria maior, no entanto, o facto de ser Membro da Liga dá-nos a garantia dessa receita, para além de que ser Membro da Liga dos Amigos concede outras vantagens, nomeadamente, a participação gratuita num convívio anual e a possibilidade de intervir com sugestões, críticas, reparos. Enfim, gostamos de ouvir o que os nossos Amigos têm para nos dizer… Agora, pretendemos aumentar significativamente o número de Membros, e estou certo de que tal acontecerá.

Este ano, não havendo Festival, como poderão os ‘Amigos’ contribuir?
Junto dos membros da nossa Direcção, como tantas vezes acontece, fruto da rede de contactos pessoais, porque praticamente somos todos conhecidos uns dos outros. No entanto, estamos a diligenciar, em articulação com a Câmara Municipal de Santarém, a realização de algumas actividades no final do mês de Outubro, no Teatro Municipal Sá da Bandeira, e, se tal vier a concretizar-se, os Membros da Liga dos Amigos do Festival terão a possibilidade de assistir aos espectáculos e nessa oportunidade poderão entregar-nos o seu contributo.

O Ludgero Mendes já é dirigente associativo há quanto tempo?
Eu comecei no dirigismo associativo após a morte, tão prematura e inesperada, de Celestino Graça, em 24 de Outubro de 1975. Cumprem-se este ano 45 anos que comecei como dirigente do Grupo Académico de Danças Ribatejanas. Depois fiz parte da Direcção da Banda dos Bombeiros de Santarém, da União Desportiva de Santarém, da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Santarém, da Sociedade Recreativa Operária, da Associação de Estudo e Defesa do Património Histórico-Cultural de Santarém, da Casa de Cultura de Santarém (FAOJ), da Comissão Regional de Turismo do Ribatejo, da Comissão Executiva da Feira do Ribatejo – Feira Nacional de Agricultura, do Festival Internacional de Folclore de Santarém, da Casa do Ribatejo, em Lisboa, da Associação de Futebol de Santarém, do Centro Recreativo e Cultural das Fontainhas e Graínho, da Federação do Folclore Português, da Federação Portuguesa dos Jogos Tradicionais, da Homo Taganus – Associação de Estudo e Defesa da Etnografia e Folclore do Ribatejo, da Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto e da Federação das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto do Distrito de Santarém, para além de outras colaborações pontuais.

Conhece bem o tecido associativo concelhio…
Sim, conheço. O que me orgulha muito…. Tenho um imenso gosto por tudo o que tenha que ver com a nossa cultura, o que me tem impelido para estar muito próximo das associações que se dedicam aos mais diversos aspectos. Quando começamos a colaborar com qualquer associação pensamos que é por uma ou outra razão especial, mas nem sempre é assim. Queremos colaborar, envolvemo-nos com as pessoas e com outras associações e, quando damos por nós, já estamos integrados a fundo, o que torna difícil a separação.

Podemos designar a Federação do Folclore Português como uma segunda casa para si?
Bem o podemos dizer. Fui eleito presidente do Conselho Fiscal da Federação do Folclore Português logo nos primeiros órgãos sociais, em 1977. Tinha eu apenas vinte anos de idade. Desempenhei estas funções 27 anos. Depois fui vice-presidente da Direcção durante três anos, após o que fiz um interregno de aproximadamente dez anos. Regressei em 2016 como vice-presidente da Direcção para cumprir um mandato de três anos, e agora sou, desde 2019, o presidente da Mesa da Assembleia Geral. Durante mais de 20 anos também integrei o Conselho Técnico da Federação. Ao longo destes 35 anos de efectiva colaboração já despendi milhares de horas e andei umas dezenas de milhares de quilómetros pelo país todo. Mas, quem corre de gosto não cansa.

Acha que o Estado tem feito jus à importância do Folclore português?
Não, o Estado português optou por delegar as suas competências em algumas entidades, nomeadamente nas autarquias e, supletivamente, na Fundação INATEL. Não se compreende que o Estado se demita de intervir directamente em matéria cultural da maior relevância, pois trata-se da matriz da nossa própria identidade nacional. Sacudindo a água do capote, como tem feito, o Estado – a nível dos sucessivos governos e presidentes da República – tem gerado situações de desigualdade entre os agentes culturais que intervêm nesta matéria. Em concelhos onde os autarcas apreciam esta expressão cultural e respeitam a acção das suas associações, as coisas correm bem, noutros concelhos onde, ao invés, os autarcas não valorizam o património cultural tradicional e, assim, não apoiam os agentes culturais que se lhe dedicam, está tudo mal. Em regra, os grupos e ranchos folclóricos, e os folcloristas, são muito mal tratados pelo Estado. Por muito que nos custe admiti-lo, éramos muito mais respeitados antes do 25 de Abril de 1974 do que agora no regime democrático, onde o Povo – através da sua expressão cultural – é humilhado e ofendido.

Não é um contra senso o Estado demitir-se de intervir numa área cultural tão significativa?
Claro que sim. Na maioria dos países desenvolvidos reconhece-se a importância do património etnográfico e folclórico, pelo que o Estado emana legislação e criou institutos que valorizam e salvaguardam esta expressão cultural. Portugal comporta-se como um novo rico que quer apagar desesperadamente o seu passado, talvez com vergonha pela forma como o Povo era tratado. No entanto, o que se esperaria de um regime democrático era que tudo aquilo que tem a ver com o Povo fosse respeitado e valorizado. Quando o Estado desvaloriza este património, e tudo o que está com ele relacionado, não se pode esperar que a população e até os intelectuais o façam. Que bom seria que os nossos Governos pusessem os olhos nos países mais desenvolvidos da União Europeia que a este nível têm uma actuação muito positiva.

O que é que era necessário fazer para dignificar a cultura tradicional e popular portuguesa?
Desde logo conhecê-la e protegê-la. Só se ama, e defende, aquilo que se conhece… No curriculum disciplinar do ensino básico e secundário deveria haver áreas dedicadas ao nosso património tradicional, o que ajudaria as crianças a ganharem raízes na sua região, o que está muito longe de acontecer, apostando na urbanização de costumes e de tradições. Importam-se eventos estrangeiros que nada têm a ver com a nossa matriz cultural – caso do Halloween – e nada se faz para preservar as nossas tradições. Para defender e valorizar as nossas tradições populares não temos que viver à moda antiga, como é óbvio, mas há muitas formas de reviver as festividades cíclicas portuguesas, se se apostasse neste projecto.

João Paulo Narciso

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