“Todo cambia”, dizia Mercedes Sosa, a musa andina, numa das músicas da minha vida. Nunca como agora esta simples constatação foi mais relevante: tudo muda.

Dia 11 de Março de 2020 foi uma quarta-feira, dia de debate na Assembleia da República, sobre as prioridades da Presidência do Conselho da União Europeia. Mal me lembro dos detalhes do debate, mas não esquecerei que anunciei ao plenário que, três meses depois de terem aparecido os primeiros casos, a Covid-19 tinha sido declarada pela OMS como uma pandemia. A única certeza era a da necessidade da mudança.

A terrível situação causada pelo vírus SARS-Cov-2 vitimou já centenas de milhar de pessoas no globo, acentuou as desigualdades sociais e teve com consequência a destruição de empregos e o abrandamento de vastos sectores da economia. Temos sabido reagir, como indivíduos, como comunidade e como país integrado na União Europeia, apesar de falhas e omissões na resposta de emergência, a mais grave das quais terá sido a proibição dos despedimentos pelo Governo.

Este é o momento de parar. Parar e pensar. Pensar nas mudanças que queremos e que toda esta destruição das estruturas actuais nos pode permitir. Atrevo-me ao arriscado exercício de procurar tirar de toda esta situação algumas lições para o futuro, se não podemos esquecer:

1. Valorização dos serviços públicos. Foi o Serviço Nacional de Saúde que, em momento de grande necessidade, respondeu pelo país. É hoje muito mais evidente para cada um/a de nós aquilo que o Bloco de Esquerda há muito vinha afirmando. De igual modo para a Escola Pública, o Estado, as forças de autoridade, os serviços de água, lixo… Além de aplausos devemos a estas pessoas (e instituições) o reconhecimento da sua importância. São precisos salários dignos, condições de trabalho decentes e horários de gente.

2. Reconhecimento das enormes desigualdades sociais ainda existentes no nosso país. 31 pessoas numa casa, como aconteceu no Cartaxo, não é modo de vida para ninguém, com ou sem Covid 19. Zonas do nosso distrito sem cobertura de net. Trabalhadores de lares ou hospitais, na primeira linha de resposta ao vírus, a ganhar o salário mínimo, muitas vezes em situações de precaridade e subcontratação. Só seremos um país, um planeta desenvolvido, quando erradicarmos a pobreza.

3. Construir um futuro sustentável. Perante a recessão económica, que levará a uma escassez de recursos teremos de decidir como gerir esses recursos. Perante a situação de calamidade teremos de aceitar que não somos os senhores do planeta, fazemos parte de um sistema bio-geo-químico onde os recursos são finitos. O que vamos apoiar, onde vamos investir? Que futuro queremos construir?

Apenas um exemplo: apoios para o sector agrícola? Sim, mas para que agricultura? Uma mono industria intensiva, destruidora da biodiversidade, baseada em químicos sintéticos e numa utilização pouco ecológica da água, servida por mão de obra precária e sazonal, movida por combustíveis fósseis, distribuída por circuitos longos que pouco valor acrescentam às comunidades locais?! De igual modo para turismo, transportes, educação, saúde, democracia….

A presente situação exige uma resposta sanitária que proteja a população, medidas sociais que garantam uma maior igualdade e um relançamento da economia orientada por critérios de transição ecológica, criação de emprego e justiça social. A resposta à crise provocada pela pandemia deve responder aos problemas sociais e ambientais e não repetir os erros que nos trouxeram até aqui. É o momento de mudar, mas mudar mesmo.
Ou, como disse o poeta: “E, afora este mudar-se cada dia, Outra mudança faz de mor espanto: Que não se muda já como soía.” Luís Vaz de Camões.

Fabíola Cardoso – Deputada do BE eleita por Santarém

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