A associação de defesa do ambiente ZERO considerou “um erro” a conversão da central termoeléctrica do Pego numa unidade “para queimar biomassa”, sublinhando que Portugal “ainda não avaliou o potencial da biomassa florestal residual” do País.
A ZERO acrescentou que, por outro lado, o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) “não apresentou até agora os planos de sustentabilidade das centrais de biomassa em funcionamento” em Portugal, sendo que no final de 2020 havia 21 com licença para produção (em exclusivo ou em regime de cogeração).
Os alertas da associação foram tornados públicos hoje, Dia Internacional de Ação sobre a Biomassa, num comunicado com o título “ZERO alerta para o erro de converter a Central do Pego para queimar biomassa”.
Segundo a ZERO, este dia visa “chamar a atenção para o problema da utilização insustentável da biomassa florestal para produção de energia, resultante de políticas de promoção de energias renováveis que não acautelam de forma séria a utilização da floresta, com implicações ao nível da desflorestação, biodiversidade e impactos sociais e económicos”, um problema que existe também em Portugal.
Em concreto sobre a anunciada conversão da central a carvão do Pego, a ZERO manifestou “grande preocupação” e disse que o concurso público aberto pelo Governo em Setembro para atribuição da capacidade de injecção na Rede Eléctrica de Serviço Público apresenta critérios que “deixam a porta escancarada para a utilização insustentável de biomassa florestal, ao permitir a possibilidade da sua utilização nos projectos” que se candidatarem.
“A ZERO defende que a concessão deste ponto de ligação deverá ter em consideração somente projectos que resultem da utilização de fontes de energia verdadeiramente renováveis e que de forma alguma coloquem a possibilidade de uma fase de transição com recurso a biomassa, tendo em consideração que esta não é, nem será de forma alguma renovável tendo em consideração a escassez de biomassa residual florestal em território nacional, assim como a eventualidade de necessidade de importação e transporte a partir de países a milhares de quilómetros de distância com acréscimo significativo de emissões de gases com efeito de estufa”, escreveu a associação.
A ZERO lembrou que está em curso a revisão de legislação europeia relativa a energias renováveis, com uma proposta que tem no seu “espírito” que a partir de 2027 os estados-membros da União Europeia deixem de apoiar a produção de electricidade a partir de biomassa florestal “em instalações exclusivamente eléctricas”.
Ainda em relação ao concurso para a central do Pego, a associação considerou “que a comissão de avaliação é pouco independente em relação ao que seria desejável, já que é constituída maioritariamente por elementos com ligação política no presente ou no passado à autarquia de Abrantes, ou à Direção-Geral de Energia e Geologia”.
A associação condenou também que não sejam públicos, para permitirem “um escrutínio do que verdadeiramente se passa nas centrais de biomassa”, os planos de acção para 10 anos que os promotores das centrais em Portugal têm de entregar, que “visam a sustentabilidade a prazo do aprovisionamento” das unidades de produção de energia.
A associação lembrou que depois dos incêndios de 2003 se promoveu a utilização da biomassa florestal residual nas centrais das eléctricas, para diminuir o material combustível, com resultados “discutíveis”, atendendo a que não se evitaram incêndios ainda mais devastadores, como os de 2017.
“Embora em teoria os sectores da biomassa e dos ‘pellets’ em Portugal utilizem apenas resíduos e resíduos industriais, na realidade o que se constata no terreno é condizente com a exploração insustentável dos recursos florestais, onde troncos de madeira de qualidade estão a ser queimados para produzir electricidade ou transformados em ‘pellets’ de madeira para alimentar as necessidades do mercado europeu ávido de matéria-prima para incinerar nas centrais de biomassa, agravando ainda mais o défice de matéria-prima na indústria portuguesa”, acrescentou, referindo-se a conclusões de um estudo feito pela própria ZERO com a Biofuelwatch (outra organização ambiental com sede no Reino Unido).
Para a ZERO, “há ainda uma grande dúvida” em relação à central do Pego: “Será que existe biomassa florestal residual suficiente para alimentar um eventual projecto de conversão” quando “num raio de intervenção de 80 km são já inúmeras as centrais de biomassa e indústrias florestais que competem pela matéria florestal residual?”.
No dia 17 de Setembro, o Governo anunciou a abertura do concurso público para a atribuição do ponto de injecção na Central do Pego, actualmente ocupado pela unidade a carvão, que será desactivada a partir de Novembro.
A central do Pego é a única central a carvão actualmente em actividade em Portugal.