Um ciclo de cinema dedicado a José Saramago, leituras das suas obras, visitas guiadas à fundação, em Lisboa, e à sua casa em Lanzarote encerram as comemorações do centenário do escritor, que se assinala no dia 16.
As comemorações arrancaram no dia 16 de novembro de 2021, dia em que José Saramago completaria 99 anos, e decorreram ao longo de todo o ano 2022, com algumas atividades a estenderem-se até 2023, culminando oficialmente no dia dos cem anos do Nobel da Literatura português, para o qual está reservado um “programa intenso”, de acordo com a Fundação José Saramago.
Antes disso, no dia 14 de novembro, terá início um ciclo de cinema na Cinemateca Portuguesa, em Lisboa, que se estende até dia 19, integrando as “mais importantes adaptações retiradas da sua obra e alguns dos documentários sobre a sua figura”, segundo informação da Cinemateca.
Nos mais de 40 títulos que escreveu, Saramago foi o criador de um estilo literário único, que funde o erudito e o popular, integrando “a riqueza da tradição literária portuguesa com traços narrativos da oralidade”, e introduzindo nas suas histórias um “experimentalismo orgânico”, que estilisticamente se expressa na supressão da pontuação.
Além disso, as suas histórias ligam-se a um “projeto ético e político”, que se materializa “na construção de mundos ora utópicos, ora distópicos”, com um “olhar sobre a humanidade”, que “foram propícios à sua adaptação cinematográfica, dando origem a múltiplos projetos nacionais e internacionais”, destaca a Cinemateca.
É o caso de “Blindness”, filme de 2008, de Fernando Meirelles, que explora a cegueira epidémica e coletiva de “Ensaio Sobre a Cegueira”, e que a Cinemateca exibe no dia 17, ou a exploração existencialista do caos da identidade humana em “Enemy” (2013), de Denis Villeneuve, baseado em O “Homem Duplicado”, que será exibido no dia 18.
Mas antes disso, o ciclo “José Saramago no cinema” apresenta, no dia 15, “La Balsa de Piedra” (2002), de George Sluizer, filme baseado em “A jangada de Pedra”, uma metáfora da união entre a Europa e a América Latina, para tentar equilibrar o mundo das heranças deixadas pelo colonialismo.
No dia seguinte, a Cinemateca exibe um filme que resulta do aproveitamento de uma outra metáfora literária de Saramago, “Embargo” (2010), do português António Ferreira, que partiu da premissa do conto com o mesmo nome, integrando o seu argumento na situação de um hipotético embargo de petróleo que cortou o fornecimento de gasolina no mundo inteiro.
Este filme é antecedido pela curta-metragem de animação “La flor más grande del mundo” (2007), que transpõe um conto infantil de Saramago, com narração do próprio.
O ciclo encerra no dia 19 com a projeção do filme “O ano da morte de Ricardo Reis” (2020), de João Botelho, que trata a incursão de José Saramago pelo universo pessoano.
A presença do escritor em documentários será igualmente relembrada com “José & Pilar” (2010), de Miguel Gonçalves Mendes, a abrir este ciclo, logo no dia 14. Prossegue com “Saramago: Documentos” (1995), de João Mário Grilo, no dia 15, que parte de uma longa entrevista dada por José Saramago na sua casa de Lanzarote, e com “Ensaio sobre o teatro” (2006), de Rui Simões, no dia 17, que acompanha a adaptação que O Bando fez de “Ensaio sobre a cegueira”.
Quase a fechar este programa dedicado a José Saramago, terá lugar, no dia 18, uma mesa redonda, em que participam Carlos Reis, comissário para o Centenário de José Saramago, e Abílio Hernandez, estudioso das relações entre cinema e literatura, sobre a especificidade dessa obra literária e as questões particulares que coloca na sua transposição para o meio cinematográfico.
Outra iniciativa prevista para dia 15 é mais um encontro-debate, integrado no ciclo “Legados Saramaguianos”, que têm estado a decorrer com participação de vários escritores portugueses, e que consistirá numa conversa entre o escritor Gonçalo M. Tavares e Carlos Reis, na Biblioteca Palácio Galveias, em Lisboa.
Por estes debates passaram nomes como Afonso Reis Cabral, Adriana Lisboa, Ana Margarida de Carvalho, Bruno Vieira Amaral, Dulce Maria Cardoso, João Tordo e José Luís Peixoto.
A organização destes encontros foi motivada pelos termos em que José Saramago expressou a sua gratidão por aquilo que devia “aos escritores portugueses e de língua portuguesa, aos do passado e aos de hoje”, explica a fundação.
As comemorações do centenário têm um ponto alto no dia 16, quando passam 100 anos sobre o nascimento do escritor, em que a Fundação José Saramago programou diversas atividades, a começarem logo às 10:00, com milhares de alunos de escolas de Portugal, Espanha e outros países a lerem excertos de romances de José Saramago.
Esta iniciativa, intitulada “Leituras Centenárias”, vai traduzir-se na realização de sessões de leitura de um excerto de “O Memorial do Convento” ou de “O Ano da Morte de Ricardo Reis”, em escolas secundárias, que serão difundidas em tempo real através das redes sociais.
Na sede da Fundação José Saramago haverá, a partir das 11:00, uma leitura integral e continuada de “As Pequenas Memórias”, autobiografia que conta a infância do escritor.
Durante todo o dia, a Casa dos Bicos – Fundação José Saramago e a Casa José Saramago, em Lanzarote, terão as portas abertas, para receber visitas guiadas, acompanhadas por momentos musicais.
Na delegação de Azinhaga, concelho da Golegã, distrito de Santarém, aldeia natal de José Saramago, será plantada a centésima árvore, no âmbito do projeto “100 oliveiras para Saramago”.
O projeto nasceu da angústia manifestada pelo escritor ao constatar que os olivais que rodeavam a sua aldeia tinham desaparecido, o que descreveu como uma espécie de “golpe no coração” que o fez sentir como se lhe “tivessem roubado a infância”.
Cada uma destas árvores receberá o nome de uma personagem saramaguiana.
A festa termina à noite, no Teatro Nacional de São Carlos, com a apresentação da ópera “Blimunda”, de Azio Corghi, com encenação de Nuno Carinhas, numa nova produção desta obra inspirada na personagem principal do romance “Memorial do Convento”, que se estreou a 20 de maio de 1990, no Teatro Scala de Milão.
A fundação deixa ainda um convite a todos os leitores de José Saramago espalhados pelo mundo para que participem nos festejos através das redes sociais, partilhando a suas passagens favoritas de livros do escritor com a etiqueta #Saramago100.
Até dia 8 de janeiro, vão manter-se duas exposições dedicadas ao Nobel português da Literatura, uma no Museu Nacional de Arte Contemporânea, em Lisboa, que teve inauguração no dia 23 de setembro, e outra na Biblioteca Nacional de Espanha, em Madrid, que abriu no dia 09 de novembro.
A primeira – “Porquê? A arte contemporânea em diálogo com o pensamento de José Saramago” – cruza o pensamento do escritor com a arte contemporânea, numa mostra de 32 obras de arte de 29 artistas portugueses, produzidas entre 1895 e 2016.
A segunda é uma exposição biográfica e documental, com materiais inéditos, intitulada “A Oficina de Saramago”, que explora o processo criativo do autor, percorrendo a sua vida e a carreira artística.