Dia 20 de fevereiro de 2020 foi um dia que ficará para a história. Nesse dia contribuí com o meu voto favorável para a aprovação em plenário na Assembleia da República, por uma margem confortável de votos, dos cinco Projetos Lei referentes à despenalização da morte medicamente assistida. O tema regressou ao debate parlamentar pela mão do Bloco de Esquerda, depois de ter sido chumbado na legislatura passada, com uma curta diferença de votos e foi acompanhado por propostas legislativas do PAN, PS, PEV e IL.

Todos os cinco projetos foram aprovados por votação nominal, ou seja, cada um dos 230 deputado, chamados por ordem alfabética, teve de se levantar no plenário e dizer como votava em relação a cada um dos cinco projetos em causa. Apesar desta, e de outras tentativas de criar pressão sobre o parlamento, como os muitos emails que encheram as caixas de correio dos deputados nos dias que precederam a votação, o resultado foi claro: a maioria dos deputados, dando voz à maioria social que o tema recolhe, aprovou na generalidade estas propostas. Os e as deputadas fizeram aquilo para que são eleitas: tomar decisões que moldam o nosso presente e futuro enquanto sociedade.

Se apenas os deputados eleitos pelo distrito de Santarém tivessem votado as propostas também seriam aprovadas. Os quatro deputados do PS votaram a favor de todos os projetos. No PSD os votos foram essencialmente contra e o deputado do PCP votou contra todos os projetos.

As propostas seguem agora para o trabalho de especialidade e voltarão a plenário, talvez no fim do ano para uma votação final e definitiva. A partir desse momento em Portugal passará a ser possível a antecipação da morte, por decisão da própria pessoa, como lesão definitiva ou doença incurável, realizada por um médico.

Possível não significa que seja obrigatória, da mesma maneira como a possibilidade de duas pessoas do mesmo sexo casarem, que existe na lei portuguesa desde 2010, não obriga ninguém a casar com alguém do mesmo sexo!

Com esta lei pessoas como eu, que não querem sobreviver, quando já não puderem viver, vão poder decidir acabar com esse sofrimento inútil. Espero um dia poder, sem que isso seja pedir a alguém para cometer um crime, solicitar a um médico ajuda para evitar o sofrimento e a degradação que já não consigo suportar. Quem não concordar pode sempre continuar a aguentar tudo até ao último suspiro, como tem sido feito até hoje. O seu direito de escolha será respeitado, mas o meu também, a partir de agora!

A aprovação desta lei não significa que o Estado e a sociedade civil deixem de investir no melhoramento continuado dos serviços paliativos ou no acesso a cuidados e fármacos para minimizar o sofrimento de doentes terminais e o apoio a quem deles cuida. Muito pelo contrário, da mesma maneira como a aprovação da possibilidade da Interrupção Voluntária da Gravidez (2007), fez melhorar o acesso a consultas de planeamento e tem vindo a reduzir o número de IVG’s realizadas, a aprovação desta lei pode ser um elemento catalisador para o reforço e alargamento da rede existente.

Resumindo, usando as palavras do médico Bruno Maia:

“A eutanásia consiste no respeito pela escolha de uma pessoa doente que quer sofrer o mínimo possível sabendo que a sua morte está para breve. É a defesa da dignidade de uma pessoa que não quer continuar a sofrer.

1. Só por ser administrada, única e exclusivamente, a pedido do próprio doente, que tem de estar 100% lúcido;

2. Só pode ser solicitada por doentes em fase terminal de doença incurável com caraterísticas de sofrimento intolerável;

3. A morte assistida só pode ser administrada por profissionais de saúde, garantindo a ausência total de sofrimento.”

Foi um dia lindo em que a nossa democracia saiu reforçada, talvez um dos mais importantes de toda a legislatura.

Fabíola Cardoso – Deputada do BE eleita por Santarém

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