Marco Crespo, de 43 anos, conta já com uma larga experiência de mais de 20 anos no mundo do vinhos, com passagens pela Fiuza, Adega Cooperativa do Cartaxo, Agroeno, Encosta do Sobral e Encosta de Xira. Actualmente é o responsável de Enologia do Tejo, Vinho Verde e Alentejo do grupo Santos e Seixo, um dos mais reputados grupos da região, que venceu vários prémios na última Gala dos Vinhos do Tejo. Recentemente foi nomeado para jovem enólogo do ano 2021 nos Prémios W 2021 de Aníbal Coutinho. Apesar de não ter sido o vencedor da categoria, o ainda jovem profissional reconhece que é com sentido de gratidão e orgulho que recebe a nomeação.

Foi nomeado para jovem enólogo do ano 2021 nos Prémios W 2021 de Aníbal Coutinho, reconhecido crítico de vinhos. O que significa para si ser reconhecido entre os pares?
É sempre motivo de gratidão e orgulho poder ser nomeado entre tantos nomes de reconhecidas empresas no País vinícola. Mostra sobretudo, que o trabalho realizado é, no mínimo, meritório.

É enólogo na Santos & Seixo Wines que recebeu diversos prémios Gala dos Vinhos do Tejo 2021. Isto traz mais responsabilidade a quem os concebe?
Claro! Mas o trabalho do enólogo isoladamente de nada vale. É talvez a parte romântica de toda uma equipa que trabalha diariamente para criar qualidade, valor e consistência do produto ao longo dos anos. Após se atingir um patamar e se é reconhecido por isso, não há desculpa para voltar atrás.

Na sua opinião, a região Tejo tem vinho de qualidade ou é mais uma região de quantidade?
O Tejo é uma região falsamente associada a vinho de má qualidade nos nossos dias. O legado de décadas com produtos de má qualidade já não existe ou então não teria lugar num mundo ultra-competitivo como é o do vinho com uma imensidão de produtores, marcas e preços e seria melhor fechar a porta. No Tejo há espaço para as duas vertentes. Há pequenos e grandes produtores com muita qualidade que fazem uma aposta crescente na criação de produtos de alta qualidade acrescentado valor ao produto e à região que são reconhecidos dentro e fora de portas por isso. Por outro lado, há espaço para escoar o vinho em grande quantidade que se produz. Esta economia de volume traduzida em milhões de garrafas gerada principalmente pelas cooperativas é vital para a sobrevivência dessas empresas.

Que falta à região para crescer ainda mais?
Que os consumidores acreditem e apostem mais nos vinhos do Tejo. Encontra-se documentado que a generalidade do consumidor de vinho compra Douro e/ou Alentejo seja no supermercado ou no restaurante. Também os restaurantes, sabendo desta tendência seguem o caminho fácil de vender marcas destas regiões em vez de permitirem um acesso aos produtos da região. Existem muitos profissionais de excelência na região que merecem uma aposta de exclusividade. Ainda uma palavra importante à Comissão Vitivinícola Regional do Tejo que sensível a este fenómeno tem desenvolvido e bem nos últimos anos várias acções em Portugal e no estrangeiro para defesa e promoção do bom que cá se faz e que permite a região ter indicadores significativos de crescimento.

Alguma vez nos últimos anos foi capaz de beber um vinho sem assumir a função de enólogo?
Sim, claro. Tento sempre desligar o trabalho quando saio da adega mas cada vez que bebo vinho é impossível não fazer uma rapidíssima apreciação prévia se está ou não apto ao consumo em termos de defeitos. Não devemos no entanto confundir apreciação técnica com gosto pessoal. Claro que no círculo de amigos, todos estão sempre à espera que me pronuncie e que dê dicas do que devem comprar, etc.

Onde está para si o prazer de beber vinho?
Mais do que beber vinho, para mim há prazer muito antes de ele estar feito. O acompanhamento na vinha, a transformação das uvas, as fermentações, os estágios, os loteamentos. Há um misticismo atribuído a toda esta actividade que me fascina e me surpreende muitas vezes. Há sempre coisas novas para aprender.

Num tinto, por exemplo, quais são os aromas que fazem um vinho bom?
A prova de vinhos, mesmo realizada por profissionais qualificados e com consistência comprovada associa sempre uma subjectividade e claro está, um gosto pessoal formado por experiências. Existe uma enormíssima paleta de aromas que se podem evidenciar num tinto: Fruta madura, especiarias, café, chocolate, etc, etc. Aquilo que pode ser muito apelativo para um conjunto pode não ser para outras pessoas, daí que fale da subjectividade. Cada vez mais os produtores tentam criar vinhos à medida do público, vinhos com madeira, vinhos sem madeira, mais alcoólicos outros menos alcoólicos, etc.

Consegue definir um perfil de vinhos que seja mais ao seu gosto?
Não consigo identificar um só perfil. Dependendo do local, estação do ano, comida, assim escolho o vinho a acompanhar. Gosto muito de brancos minerais e de tintos pouco alcoólicos. Mas gosto sobretudo de vinhos fora da caixa com carácter que não os façam ser vinhos consensuais.

Quais são as suas castas de eleição e porquê?
Brancas – Arinto, Alvarinho, Encruzado e Fernão Pires, pela versatilidade. Apesar de possuírem perfis bem diferentes permitem produzir vinhos frescos de consumo rápido e ao mesmo tempo grandes vinhos de guarda e capacidade evolutiva.
Tintas – Syrah, Touriga Nacional, Trincadeira Preta, Merlot. Quando orientadas para não produzirem grandes produções, permitem sozinhas ou em lote criar grandes vinhos jogando parcelas com diferentes maturações e madeiras de diferentes origens potenciando complexidade de grande nível e elegância.

Consegue fazer um vinho que não goste?
Sim. Vinho com altos teores de açúcares totais.

O que é um vinho fácil?
Um vinho que também é denominado na gíria “redondinho” ou “certinho” porque não tem virtudes nem defeitos. Estes vinhos são preparados para não terem um perfil exuberante ou com alguma característica bem vincada. Têm antes um bocadinho de tudo: acidez, teor alcoólico, doçura, suavidade. A profusão de vinhos deste perfil teve um crescimento exponencial graças à abertura à exportação para mercados não tradicionais do consumo de vinho (norte da Europa, Escandinávia, entre outros) e que está em franco desenvolvimento. Muitos dos vinhos tornam-se “fáceis” depois de trabalhados para não terem arestas.

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