O Golpe Militar de 25 de Abril de 1974 trouxe a democracia e com ela novos desafios e transformações à Feira Nacional de Agricultura. Nesse ano, a realização da Feira esteve em perigo, uma vez que Celestino Graça não demonstrava vontade em fazê-lo, num período de grande convulsão política e social.
Depois de muito pressionado, Celestino Graça decidiu, juntamente com a Comissão organizar a Feira que decorreu entre 2 e 16 de Junho de 1974 e foi inaugurada pelo secretário de Estado da Agricultura, Alfredo Esteves Belo.
Segundo José Júlio Eloy, membro da referida Comissão, nesse ano, “ainda se fez uma Feira à antiga, com todos os pormenores que a caracterizavam até então, que incluía o Festival Internacional de Folclore” (CR, 10/5/2013, p. 13). No entanto, as novas propostas para a programação desse ano surgiram através do advogado Humberto Lopes, representante da Comissão Democrática Eleitoral (CDE), com a introdução de colóquios sobre temas de natureza económica, um debate público sobre os problemas da produção e uma exposição dedicada ao escritor Alves Redol. Joaquim da Silva Portugal, representante da Comissão dos Sindicatos do Distrito, propôs a substituição do “Dia Corporativo” pelo “Dia do Trabalhador”.
Na véspera da inauguração da Feira, a CDE acusou as feiras anteriores de serem “uma manifestação de características fundamentalmente exibicionistas do poder do grande latifundiário e a apresentação das firmas que detêm o monopólio dos produtos e máquinas para a agropecuária. (…) Embora a agricultura nacional estivesse desde há muito numa gravíssima crise, esta Feira, já com proporções de carácter nacional e internacional, continuou a não tomar uma posição de combate, nem sequer de denúncia, dessa crise aflitiva para o pequeno e médio agricultor, bem como para o trabalhador rural” (CR, 1/6/1974, p. 11).
Em Outubro de 1974, a Comissão da Feira, politicamente debilitada, acabou por se demitir, ao não concordar com a integração de membros de partidos políticos no seu seio. Para além desta recusar a partidarização do certame, também refutava as acusações “baseadas na ideia de a Feira estar enfeudada no regime fascista, deposto no 25 de Abril [pois esta decorria] sob a orientação do antigo governo, como aliás, acontecia com outras manifestações idênticas e cujos programas eram aprovados pelos departamentos oficiais que lhe concediam os subsídios para a sua realização” (CR, 10/5/2013, p. 13).
A Comissão Executiva da Feira de 1975 era constituída por Luís Vaz de Almada, José Chicau, João Vasco Nogueira Freire, Hugo Barbosa, Vítor Hugo Faria e Grimoaldo Duarte, no ano do falecimento de Celestino Graça. O governador civil, Fausto Sacramento Marques defendeu que a Feira estivesse o mais próximo possível do povo e garantia que a Comissão “foi escolhida democraticamente em assembleia convocada com a devida antecedência, na qual se encontravam pessoas ligadas ao sector agrário e os representantes dos partidos políticos. Os objectivos a atingir com a realização da Feira selecionaram-se de acordo com os princípios base definidos no Programa do Movimento das Forças Armadas” (CR, 31/5/1975 p. 1). Nesse ano e no seguinte, o certame passou a ser designado de “FNAGRI”. A Feira de 1975 não decorreu como previsto, pois, pela primeira vez, não se enalteceu a figura do campino nem se realizou o “Dia do Campino”. No entender de alguns críticos, a Feira politizou-se e partidarizou-se de acordo com o reportório apresentado pelos coros no I Encontro do Ribatejo e do número elevado de grupos dos Países de Leste presentes no Festival Internacional de Folclore.
Em 1976, o lema da Feira era “planear, produzir e abastecer”. A Comissão Executiva foi presidida por Carlos Alberto da Silva Mendes, num tempo em que a reforma agrária continuava em discussão e em execução, especialmente nas zonas de latifúndio. Também se fez sentir alguma instabilidade no sector empresarial prejudicial para a Feira. Nesse ano, não se realizou o Festival Internacional de Folclore que foi substituído por um festival de grupos folclóricos portugueses, intitulado “Portugal e a sua Gente”.
Na Feira iniciada a 5 de Junho de 1977, Celestino Graça foi homenageado, sendo atribuído o seu nome à praça de touros. A Comissão Promotora da Homenagem a Celestino Graça, constituída nesse ano, conseguiu inaugurar um busto do homenageado, a partir de uma subscrição pública, em Setembro. O certame recebeu a visita do presidente da República, general Ramalho Eanes e do primeiro ministro, Mário Soares, sendo a sua comissão executiva presidida por Antonino Pires Braz.
No final da década de 70, a Feira seguia a rota do país em direcção à Comunidade Económica Europeia (CEE), num período em que esta comemorava as bodas de prata (1978). A partir da década de 80, surgiu a necessidade de repensar e modernizar a Feira, nomeadamente onde se devia instalar, perante o estrangulamento de espaço que sofria que, em 1980, não permitiu a presença de cerca de trinta expositores, segundo o governador civil, António Pena Monteiro. A Quinta das Cegonhas e alguns terrenos anexos eram apontados como ideais para a expansão do certame, tendo alguns deles sido adquiridos nesse período pela Câmara Municipal de Santarém. Nesse ano, a Feira foi visitada, a 20 de Junho, pelo primeiro-ministro Francisco Sá Carneiro que elegeu a agricultura como fundamental para a recuperação económica do país.
A Feira de 1982 decorreu em dois espaços, no tradicional campo Emílio Infante da Câmara e na Quinta das Cegonhas onde se realizaram, entre outros eventos, os Concursos Nacionais de Equinos, Bovinos e Ovinos, o Campeonato Nacional Oficial de Cavalo de Raça Lusitana e as Corridas de Galgos. O ano de 1983, caracterizou-se pela polémica entre o secretário-geral da Confederação dos Agricultores Portugueses (CAP), José Manuel Casqueiro e o antigo governador civil de Santarém, Fausto Sacramento Marques que foi acusado de não respeitar a propriedade privada, em 1975, no decorrer das suas funções. Este último integrado no executivo da Câmara escalabitana defendeu-se das acusações revelando que “o que fez como governador civil, foi cumprir com as disposições legais em vigor, nesta conformidade procedendo relativamente à reforma agrária, fazendo cumprir uma lei de que não fora autor nem colaborador” (CR, 10/5/2013, p. 20). Este recebeu o apoio da edilidade liderada por Ladislau Teles Botas. No entanto, os agricultores associados da CAP boicotaram o certame, num ano em que o poder central não se fez representar deixando a inauguração a cargo do governador civil. No ano seguinte, a gestão do evento foi dividida pela Câmara Municipal, a CAP e o ministério da Agricultura, levando à futura criação do Centro Nacional de Exposições e Mercados Agrícolas (CNEM).
A adesão de Portugal à CEE, em 1986, marcou a reorganização da Feira, voltada para a Europa. Em 1994, a Feira instalou-se definitivamente na Quinta das Cegonhas, no Centro Nacional de Exposições, abandonando definitivamente o planalto. Muitos foram os desafios ultrapassados como o endividamento do CNEMA, que se arrastou a partir de 1996, a crise das “vacas loucas” (1997-8) ou a concorrência de uma feira paralela organizada no planalto pela edilidade escalabitana, a partir de 2007.
Segundo o arquitecto Carlos Guedes de Amorim, “parte do território da Quinta das Cegonhas, foi modelado, de maneira a definir um amplo anfiteatro, aberto a poente, com encostas de suave inclinação, a norte e a nascente, envolvendo uma área central, plana, onde se localiza o grande ringue do CNEMA, visível de qualquer ponto da sua envolvente. Na aba do anfiteatro, orientada a sul, modelou-se uma ampla plataforma donde se abarca o grande ringue e a maior parte do parque. Ali se construiu o conjunto principal, integrado pela praça de entrada, o centro administrativo, o átrio, as duas naves gémeas, polivalentes, o edifício da restauração e o edifício dos auditórios. Na aba do anfiteatro virada a poente, foi definida uma plataforma destinada à unidade de exposição e mercado de gado” (CR, 24/5/2013, p. 16).
Em 2004, a Feira do Ribatejo comemorou as bodas de ouro, num período em que o presidente do CNEMA, João Machado admitia a necessidade de uma “profunda reestruturação” do certame. A partir do início do século XXI, a Feira passou a investir na produção de grandes concertos com artistas nacionais e estrangeiros. As bodas de ouro da Feira Nacional da Agricultura comemoram-se em 2014, num período que o certame tentou a reaproximação ao planalto e à cidade. A pandemia inviabilizou a Feira em 2020 que agora regressa ainda que num formato próprio dos tempos que vivemos.
Teresa Lopes Moreira – Memórias da Cidade