epa06065949 Military personnel close a gate at the Tancos Military Base, in Tancos, central Portugal, 04 July 2017. On 29 June 2017 the thieves stole anti-tank grenades, plastic explosives and more than 1,400 rounds of ammunition from the Tancos military complex. EPA/PAULO NOVAIS

O furto de material militar dos paióis de Tancos, em 28 de Junho de 2017, originou a queda de um ministro, de um chefe do Exército, um inquérito parlamentar e um processo judicial, em fase de conclusão.

A notícia chegou a meio da manhã de 29 de Junho e foi o início de um processo tumultuoso, em que os partidos da oposição, e até os que apoiam o Governo minoritário, apontaram ao então ministro da Defesa, José Azeredo Lopes, que só se demitiu passados meses, e até ao primeiro-ministro, António Costa.

O Exército, a quem cabia a responsabilidade da segurança das instalações, também esteve sob fogo, em especial o então chefe do Estado-Maior (CEME), Rovisco Duarte, e o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas (CEMGFA) à data, Pina Monteiro, reconheceu que o furto foi um “soco no estômago” dos militares.

No dia 28 de Junho, as primeiras informações foram pouco precisas sobre o material furtado – explosivos, granadas de gás lacrimogéneo e granadas foguete anticarro –, mas Azeredo Lopes admitiu a gravidade da situação.

As semanas seguintes são agitadas, com as demissões, pelo CEME, dos comandantes responsáveis pela segurança dos paióis nacionais, e readmitidos três semanas depois, e a visita do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a Tancos, pedindo o apuramento de “tudo, de alto a baixo, até ao fim, doa a quem doer”.

A primeira notícia sobre a lista do armamento furtado só foi divulgada, em Espanha, pelo jornal El Español – cerca de 1.500 balas 9 mm, granadas, explosivos e 44 granadas-foguete anticarro, ente outro material.

Começam as pressões para a demissão de Azeredo Lopes e Rovisco Duarte e em 3 de Julho foi Assunção Cristas, presidente do CDS, a primeira a defender a saída do ministro da Defesa Nacional do Governo, hipótese que António Costa vai recusando, em sucessivas intervenções, ao longo dos meses seguintes.

Uma constante dessas semanas e meses seguintes foram as exigências pelo total esclarecimento do caso feitas pelo Presidente da República.

Na frente judicial, em 4 de Julho, o Ministério Público abriu um inquérito por suspeitas de prática dos crimes de associação criminosa, tráfico de armas internacional e terrorismo, numa investigação liderada pela Polícia Judiciária (PJ), em colaboração com Polícia Judiciária Militar (PJM). É decretado o reforço de segurança dos paióis de Tancos e todo o material foi transferido para outras instalações.

Em 18 de Outubro de 2017, a PJM anunciou, em comunicado, a recuperação do material furtado na Chamusca, o que leva o Governo a saudar a recuperação que, mais tarde, se descobriu não ser a totalidade do que desapareceu.

Esta operação, porém, vai ser objecto de uma investigação, conhecida por “Operação Húbris”, em Setembro de 2018, sobre um alegado encobrimento e encenação por parte de elementos da PJM, nomeadamente o ex-director Luís Vieira e o inspector Vasco Brazão, entretanto constituídos arguidos, um mês depois.

O final do ano de 2018 foi agitado, tanto em termos judiciais, com a “Operação Húbris”, como em termos políticos, com a proposta de criar uma comissão de inquérito parlamentar às responsabilidades políticas no caso, proposta pelo CDS-PP, em 3 de Outubro.

Os acontecimentos precipitam-se. No dia seguinte, em 4 de Outubro, o semanário Expresso noticiou que a recuperação do material, na Chamusca, foi uma encenação da PJM, em conivência com o autor do furto, de que o ministro terá tido conhecimento. No mesmo dia, António Costa reafirmou a sua confiança em Azeredo Lopes.

E, uma semana depois, o ex-chefe de gabinete do ministro da Defesa confirmou a existência de um documento, entregue por Luís Vieira e Vasco Brazão, já depois de ter dito publicamente que não percebeu qualquer “indicação de encobrimento de eventuais culpados do furto de Tancos”.

Em 12 de Outubro de 2018, 471 dias depois, José Azeredo Lopes demitiu-se do Governo, sendo substituído por João Gomes Cravinho. Cinco dias depois, em 17 de Outubro, é Rovisco Duarte a pedir sua exoneração do cargo.

Além da investigação judicial, que ainda continua, Tancos passa a ter um palco no parlamento, na comissão de inquérito, onde serão feitas, durante semanas, 45 audições, incluindo Rovisco Duarte e Azeredo Lopes. O primeiro-ministro, António Costa, respondeu a perguntas dos deputados por escrito.

Como já ficara claro no relatório do Ministério da Defesa sobre o furto, são evidenciadas, nas muitas horas de audições, falhas de segurança nos paióis de Tancos, quer a nível das instalações, quer na falta de efectivos.

Nas audições, os militares falam de falhas no sistema de comunicações, na videovigilância, que deixou de existir a partir de 2006, de buracos nas redes de segurança e até de cabras a pastar junto aos paióis.

A versão final do relatório da comissão de inquérito ao furto de Tancos sustenta que “não ficou provado” que tenha havido interferência política na acção do Exército ou na actividade da PJM, apesar da tentativa dos partidos de direita, em especial do CDS-PP, de uma maior responsabilização de António Costa.

Do processo judicial, foi o próprio director nacional da PJ, Luís Neves, quando foi ouvido na comissão de inquérito, em Março, a adiantar que a investigação ao caso do furto de Tancos deverá estar praticamente concluída em “Junho ou Julho”.

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