Com 134 anos de história ao serviço da região, o Correio do Ribatejo tem dado voz, ao longo de gerações, a homens e mulheres que marcaram a vida das suas comunidades. Nesta edição, fazemos justiça a uma dessas figuras: Cândida Lopes, a primeira mulher a assumir a presidência da Junta de Freguesia de Benfica do Ribatejo em democracia, liderou com coragem, integridade e uma dedicação total à causa pública. 

O seu percurso é exemplo de que é possível servir com honestidade num tempo em que tantos confundem política com interesse pessoal.

Hoje, mais do que fazer o balanço de uma obra feita, destacamos o espírito de missão de quem soube ocupar um lugar de poder sem se deixar corromper por ele — e que agora decide, com serenidade, dedicar-se ao bem mais precioso: a família.

Numa altura em que o país ainda precisa de mais mulheres na política, a história de Cândida Lopes é também um apelo à participação, à equidade e à esperança.

Cândida Lopes com a família

Depois das eleições Autárquicas que se anunciam para 12 de Outubro, Cândida Lopes, presidente da Junta de Freguesia de Benfica do Ribatejo põe fim a 12 anos de serviço público que cumpriu “com verticalidade e coração”.

A primeira mulher a presidir à Junta de Freguesia de Benfica do Ribatejo deixa na freguesia um legado de obra, integridade e inspiração, passando a dedicar-se a quem mais ama — a família.

“Ser mulher e assumir uma liderança política local ainda levanta sobrancelhas. Mas nunca me deixei condicionar por isso. Encarei o cargo como um serviço à comunidade, com tudo o que isso exige: entrega, coragem, escuta e rigor,” afirmou ao Correio do Ribatejo.

Durante 12 anos liderou a Junta de Freguesia de Benfica do Ribatejo, tendo sido a primeira mulher a assumir o cargo desde o 25 de Abril, numa freguesia historicamente liderada por homens. O seu percurso, marcado por um sentido profundo de missão, integridade e visão comunitária, é agora interrompido, não como uma desistência, mas como uma pausa merecida para se dedicar à família, à filha e à vida pessoal, tantas vezes colocada em segundo plano.

Licenciada, esposa e mãe de uma menina, Cândida Lopes é descrita por quem a conhece como uma mulher de princípios sólidos, de palavra firme e de coração atento. Não faz política para agradar — faz para servir. 

“Sempre soube que a minha postura, íntegra e frontal, não agradaria a todos. Mas nunca foi esse o objectivo. Não entrei na política para jogar jogos. Entrei para trabalhar,” observou.

Liderar com o coração e com a cabeça

A entrada na Junta aconteceu num momento difícil: financeiramente debilitada, com necessidades urgentes a vários níveis — desde as infra-estruturas à modernização administrativa. Ainda assim, a então recém-eleita presidente não hesitou: arregaçou as mangas e começou, literalmente, “a construir” um novo futuro para Benfica. 

Durante três mandatos, apostou em áreas fundamentais para a qualidade de vida da população: mobilidade, saúde, acção social, ambiente, educação, cultura, desporto e transportes. 

A requalificação das escolas, os novos espaços verdes, as estradas arranjadas, os equipamentos comunitários renovados e, sobretudo, as duas pontes construídas — fundamentais para os agricultores — são hoje sinais visíveis da sua acção.

“Ver as crianças da freguesia a brincar em escolas renovadas, com melhores condições, é uma das maiores alegrias que levo. São eles o futuro,” afirmou ao Correio do Ribatejo.

Mulher, líder e pioneira

Assumir a presidência de uma Junta de Freguesia sendo mulher continua, ainda hoje, a ser quase um acto revolucionário em muitos contextos locais. No caso de Cândida Lopes, foi também um acto de coragem.

“Ser a primeira mulher neste cargo foi, para mim, um misto de responsabilidade e superação. Senti, muitas vezes, que tinha de fazer mais, provar mais, justificar mais. Mas nunca me deixei intimidar. Tinha um compromisso com a freguesia e com todas as outras mulheres que olham para a política como um espaço que também lhes pertence,” salienta.

A sua presença no cargo ajudou a abrir caminho para uma nova geração de mulheres que hoje sabem que também podem liderar, tomar decisões e fazer política com firmeza e empatia.

Desde o início, Cândida Lopes quis transformar a forma de fazer política. Procurou escutar mais, envolver mais e criar uma Junta verdadeiramente próxima da população. “Realizámos assembleias abertas, reunimos com associações, falámos com os moradores — não apenas nos gabinetes, mas nas ruas, nas festas, nos desfiles, nas inaugurações, nas romarias do Tejo, nos campeonatos de cartas, no cinema ao ar-livre, nos cafés, nos festivais e em tantos outros lugares,” assegura.

Essa ligação próxima traduziu-se numa forte adesão popular aos projectos da Junta. Jardins foram pensados com os moradores. Eventos culturais surgiram da vontade das associações. Prioridades foram definidas com base em auscultações reais, simples, mas eficazes.

A 27 de Agosto de 2016, na inauguração da requalificação da Unidade de Saúde de Benfica do Ribatejo

Gestão rigorosa e sem “jogos de bastidores”

“Na política, muitas vezes, há quem prefira atalhos, jogos de bastidores e compadrios. Eu nunca fui por aí — e paguei o preço por isso. Mas durmo tranquila, com a consciência limpa e tranquila,” nota na conversa que manteve com o Correio do Ribatejo.

Quem trabalhou com Cândida Lopes reconhece-lhe uma qualidade que por vezes ainda rareia: rigor ético, a pensar nos valores da transparência e no bem comum: “Prefiro perder popularidade a ceder à facilidade”, disse em diversas ocasiões ao longo da entrevista.

Apesar das limitações orçamentais da Junta, Benfica do Ribatejo é, hoje, uma freguesia financeiramente equilibrada, depois do investimento nela feito, com critério e priorizando o essencial. 

“Saio com equipamentos requalificados, viaturas novas e contas organizadas,” garante.

Uma pausa não é uma despedida

Ao fim de doze anos à frente da Junta de Freguesia de Benfica do Ribatejo, Cândida Lopes decidiu parar para estar mais próxima da família. 

“Ser presidente de Junta consome-nos por inteiro. É um compromisso exigente que nos esgota, mas também nos enriquece profundamente”, partilha com um misto de emoção e serenidade. 

“Chegou o momento de respirar, de olhar para dentro, de me dedicar ao que realmente importa: a minha filha, a minha família e o meu equilíbrio,” admite.

A decisão de sair da vida pública activa é ponderada e vivida em paz. Não se trata de um simples afastamento, mas de um gesto consciente, de coragem e de responsabilidade. “Fiz o que me competia. Dei o meu melhor. Agora é tempo de confiar no futuro. Deixo uma base sólida para quem vier a seguir. Que sirvam a freguesia com zelo, competência, honra e lealdade,” afirma.

Cândida Lopes abraça esta pausa como um recomeço. Um tempo necessário para reavaliar caminhos, recuperar forças e abrir espaço à renovação que a democracia exige. A limitação de mandatos, imposta por lei, é para si uma regra saudável, que garante a vitalidade do sistema democrático e impede a estagnação do poder. 

“É fundamental que haja renovação: novas ideias, novas energias, novos olhares que saibam responder às exigências da administração pública e aos anseios da população,” observa. Contudo, não deixa de criticar, com firmeza, quem tenta contornar a lei para se manter no poder: “A perpetuação de mandatos à custa de lacunas legais é um caminho perigoso que afasta os cidadãos da política. Não partilho dessa visão,” sublinha.

Cândida Lopes defende que, no futuro, a alternância seja não apenas uma obrigação legal, mas uma prática natural e saudável na vida democrática.

Deixando uma marca de rigor, dedicação e seriedade, Cândida Lopes despede-se — por agora — com a serenidade de quem sabe que cumpriu a missão. 

Para a ainda autarca a sua saída não é um fim, mas uma etapa, “uma pausa com sentido” e uma “demonstração de amor” à sua terra, à sua família e ao serviço público.

Inauguração da Nova Ponte de Benfica

O legado de uma mulher que rasgou caminhos

O verdadeiro impacto de uma liderança raramente se mede apenas nas obras feitas, mas também na forma como se inspiraram vidas, como se abriram portas, ou mudaram mentalidades. Nesse aspecto, Cândida Lopes admite deixar uma marca profunda: “Espero ter contribuído para uma política mais humana, mais próxima. E, acima de tudo, espero que outras mulheres da nossa freguesia se sintam encorajadas a liderar. O futuro também é delas,” nota.

Na hora da partida Cândida Lopes não esconde a emoção: “Quero agradecer, do fundo do coração, a confiança que depositaram em mim ao longo destes 12 anos. Cada desafio enfrentado, cada conquista alcançada, cada crítica construtiva, ajudou-me a crescer como pessoa e como servidora pública. Ser a vossa Presidente foi uma honra que levarei para a vida,” salienta.

“Destes largos anos de entrega total guardo para mim, no coração, todo o reconhecimento expresso nos sorrisos, nas conversas francas, nas reuniões e nos diálogos profícuos com as associações, empresas, instituições e munícipes de Benfica do Ribatejo. As vossas sugestões e partilhas permitiram-me alinhar os meus passos com os anseios de todos, e contribuir verdadeiramente para o bem comum,” refere.

“A vós deixo o meu agradecimento, sem mágoa, sem ruído, apenas com a serenidade de quem sabe que é preciso acolher o que vem e deixar partir o que já cumpriu o seu tempo,” acrescenta.

“Continuem a cuidar da nossa freguesia com o mesmo orgulho com que a servi. E às mulheres e meninas da nossa terra: nunca deixem que vos digam que não podem. Podem e devem. O futuro também é vosso,” conclui.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Leia também...

“A sustentabilidade ambiental é uma preocupação crescente”

Rúben Loureiro dirige o Serviço de Aprovisionamento e Logística do HDS desde…

“Trabalhamos para servir sempre bem os nossos clientes”

Nascido há oito anos na cidade de Santarém, o Restaurante Chapa 7…

Herman José abre comemorações dos 18 anos do Torreshopping

O Torreshopping assinala a 1 de Abril o seu 18.º aniversário, iniciando…

“Alpiarça vai crescer e afirmar-se na região”

Sónia Sanfona, do PS, conquistou a autarquia à CDU que esteve no poder durante 12 anos.