Entusiasmado com a Revolução Russa, João Ferreira Cabecinha surge como um dos primeiros dirigentes do Partido Comunista Português (PCP), em 1921. Integra então a “Comissão Geral de Educação e Propaganda” deste partido, ao lado do escritor Manuel Ribeiro e do poeta Eduardo Metzner. Era nessa altura um destacado sindicalista entre os trabalhadores do comércio. Trabalhava como contabilista numa ourivesaria de Lisboa e chegou a ser presidente de dois importantes sindicatos de Lisboa: a Associação de Classe dos Caixeiros e a Associação de Classe dos Empregados de Escritório. Em 1925 foi um dos primeiros candidatos do PCP a deputado, nas últimas eleições parlamentares antes da instauração da ditadura.

Inválidos do Comércio
Em 1929 Cabecinha esteve entre os fundadores da associação Inválidos do Comércio. Foi um dos 35 membros da sua “comissão iniciadora” e um dos 19 subscritores dos seus primeiros estatutos. Embora já estivesse doente, ainda foi eleito para os primeiros corpos sociais, como membro suplente do conselho fiscal. Morreria alguns meses depois.
Esta associação criou à época o mais avançado lar de idosos em Portugal, ainda hoje um expoente de qualidade. Durante a grande crise da década de 1930, foi inovadora ao criar um centro de emprego e um serviço de apoio social com refeições gratuitas. Chegaria a ser uma das maiores associações do país, com 50 mil sócios.
João Ferreira Cabecinha é um exemplo dos sindicalistas que deram um contributo central para a fundação de Inválidos do Comércio. Nomes como Amílcar Costa, António Augusto de Sousa, José Gregório de Almeida e Júlio Silva, entre outros.

Horário de trabalho
Sob o regime de Sidónio Pais, em 1918, Ferreira Cabecinha teve que passar à clandestinidade durante alguns dias, como dirigente de uma das mais importantes greves que nesse ano se realizaram em Lisboa, dos empregados no comércio. Reclamavam um aumento dos seus salários, cujo valor real tinha sido brutalmente reduzido no contexto de crise e inflação da 1ª Guerra Mundial. Essa greve teve uma forte adesão nas maiores casas comerciais da época (Grandella, Armazéns do Chiado, Ramiro Leão e Casa Africana). Várias pessoas foram presas, desde um grupo de simples caixeiras do Grandella até ao então secretário-geral da Federação Portuguesa dos Empregados no Comércio, Amílcar Costa.
Mas enquanto sindicalista, Ferreira Cabecinha empenhou-se sobretudo na redução do horário de trabalho. Em 1919 fez parte da comissão nomeada por um novo governo republicano que regulamentou a primeira lei em Portugal estipulando um limite de 8 horas diárias.

Almeirim
Foi em Almeirim que João Ferreira Cabecinha nasceu, em 1862. Filho de um comerciante local, aí viveu grande parte da sua vida. Morou na Rua da Igreja (hoje Rua João César Henriques).
Alexandre Vieira, antigo director do mais importante jornal operário no tempo da 1ª República, o diário A Batalha, recordaria Ferreira Cabecinha como exemplo “da melhor gente” com quem tinha contactado nas lides sindicais e que “contribuíra esforçadamente […] para a criação e aperfeiçoamento dos organismos de resistência do operariado”.
Em 1930, os sindicatos dos caixeiros e dos empregados de escritório, em conjunto com a associação Inválidos do Comércio dedicaram-lhe uma homenagem póstuma. Entre outros oradores, Amílcar Costa pôs em relevo os “dotes morais e intelectuais” de João Ferreira Cabecinha e os “benefícios que da sua acção haviam resultado”.

Luís Carvalho

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