No início de Dezembro passado tive a felicidade de acompanhar o lançamento de um livro escrito pelo meu pai, que fala da sua passagem pela Guerra do Ultramar. O título, “O tempo de todas as incertezas”, não podia estar mais de acordo com o tempo que vivemos.
Ao longo dos anos ouvi a minha mãe falar de como os seus avós viveram a pneumónica. Ouvi o meu avô falar da crise durante o pós II Guerra Mundial. Ouvi o meu pai falar da tropa e dos 2 anos de guerra em Moçambique. Ouvi, mas verdadeiramente penso, hoje, que nunca compreendi bem o que eles diziam. Sempre fui um entusiasta da história. Li dezenas de livros sobre as provações Inglesas durante os bombardeamentos e imaginei a força que aquela gente teria de ter para passar por algo semelhante. Imaginei como seria, mas sempre de uma forma “distante” porque hoje compreendo que não conseguia entender o que eles passaram.
Não compreendia porque nunca o tinha vivido. Nem nunca achei possível viver situações dessas. Num mês tudo mudou. A Europa, o Mundo mudaram de uma forma inimaginável. Milhares de milhões de pessoas estão confinadas às suas casas, às suas cidades. Milhares de milhões de pessoas vivem ansiosas não com bombardeamentos, mas com o sair de casa e ser infectados. Milhares de milhões vivem a ansiedade do futuro da economia e das suas consequências.
Quem podia imaginar 1,4 mil milhões de pessoas na Índia confinada às suas “casas”. Gente que foi despedida de um dia para o outro e regressa às aldeias, algumas a centenas de km a pé porque não há transportes. Quem podia imaginar confinar às favelas do Rio de Janeiro, milhões que têm de ficar em “casa” com medo do vírus. Quem podia imaginar que a cidade que Nunca Dorme, Nova Iorque, estava fechada, sem gente, com hospitais sem capacidade e médicos a decidir quem vive e quem morre, no País mais “rico” do Planeta.
Estes são tempos de incerteza, mas depois destes tempos teremos uma nova sociedade. Acredito que melhor que a que tínhamos. No meio da escuridão, palavras como a do Papa Francisco, “ninguém se salva sozinho” são luzes que rasgam a noite. Ver inimigos de milhares de anos, Israelitas e Palestinos, a cooperar para salvar vidas e impedir que ambos se infectem porque perceberam que o mal do vizinho é o meu mal, tem de representar alguma coisa de bom e dar-nos esperança.
O tempo que vivemos vai exigir de nós, de todos nós, que consigamos ir ao fundo do nosso ser, da nossa alma, buscar forças que pensávamos que não tínhamos. O tempo que vivemos vai-nos demonstrar, a todos nós, que conseguimos fazer coisas inimagináveis, coisas boas. O tempo em que vivemos vai-nos demonstrar que o Ser Humano, cada um de nós, é mais resiliente, muito mais resiliente do que alguma vez pensou.
Durante a maioria da nossa vida, sobretudo os mais novos pensaram que os problemas que tínhamos no início do ano eram enormes, no último mês relativizámos muitos desses problemas. Hoje percebemos que pequenas coisas que não dávamos importância afinal nos faziam felizes. Estamos, todos, a aprender a dar importância a essas pequenas coisas.
Mas ao mesmo tempo estas vão ser gerações que no futuro vão contar aos seus filhos, aos seus netos o que foram os tempos do COVID-19. E essas futuras gerações, que não passaram por estes tempos actuais, vão pensar como foi possível que os seus pais, os seus avós tenham conseguido superar estes tempos de pandemia e as suas consequências para além das de saúde.
Essas futuras gerações vão olhar para nós com orgulho, com orgulho daquilo que todos fizemos em conjunto, da nossa capacidade de nos superar. Este é o tempo de todas as incertezas, mas ao mesmo tempo o tempo das certezas que juntos vamos ultrapassar estes tempos. O tempo das certezas que apenas juntos o podemos fazer.
Pedro Ribeiro
Presidente da Comunidade Intermunicipal dos Municípios da Lezíria do Tejo