Numa iniciativa conjunta das cinco regiões vitivinícolas do Centro de Portugal – Bairrada, Beira Interior, Dão, Lisboa e Tejo – decorreram, em Santarém, nos passados dias 17 e 18 de Fevereiro, as Jornadas de Enoturismo, depois de quase dois anos de interregno. Nesta que foi a 10.ª edição, um painel de especialistas reflectiu sobre o ‘Enoturismo como factor de inovação’ e objecto de negócio. Todos foram unânimes ao reconhecerem as enorme potencialidade que este sector representa para o País.
As Jornadas, que se desenrolaram no Convento de São Francisco, começaram na quinta-feira, dia 17 de Fevereiro, com o presidente da Entidade Regional de Turismo do Centro de Portugal, Pedro Machado, a destacar os “grandes desafios” que o sector atravessa na actualidade.
Segundo disse, é vital “restaurar a confiança dos consumidores”, não só na fileira do vinho e do enoturismo, mas em todos os sectores da economia.
“É um desafio que nos leva a todos para este desenvolvimento de restaurar verdadeiramente a confiança dos nossos consumidores para que eles possam percorrer Portugal de lés a lés, e consumir a nossa excelência da marca de destino que é Portugal. E esse restaurar da confiança é essencial”, afirmou.
Para Pedro Machado, um outro desafio passa por “restaurar o mercado interno”: “Muitos portugueses redescobriram o seu próprio País e experiências extraordinárias dentro daquilo que é a oferta Portugal e é necessário fazer com que o mercado doméstico continue a consumir Portugal”, analisou.
“Outro dos desafios estratégicos passa por conseguir, nos próximos tempos, captar congressos, seminários e conferências internacionais e apostar em produtos como o enoturismo, turismo industrial, literário, de saúde e bem-estar e desportivo, em linha com a estratégia do Turismo de Portugal”, sustentou.
“Portugal está hoje em 27 mercados internacionais. Trabalhamos com a marca Portugal com as sete marcas regionais em 27 mercados internacionais, é muito importante que sejamos capazes, também, de recuperar esses fluxos”, acrescentou.
“Quando Portugal, e bem, coloca na sua palete de novos produtos turísticos o turismo literário, cultural, a arte urbana, o turismo religioso, naturalmente consolidando os produtos turísticos mais convencionais, estamos, no fundo, a abrir novas oportunidades de negócio para aquilo que é a marca Portugal mas, muito em particular, àquelas regiões e destinos que estão fora de um perímetro que levou Portugal durante décadas a posicionar-se internacionalmente no produto sol, praia e golf, que nos causava problemas estruturais”, disse Pedro Machado.
Nesse sentido, o responsável da Entidade Regional de Turismo do Centro considerou que o enoturismo é uma “grande oportunidade” para o País, sendo necessário “fazer com que as comunidades residentes sintam vantagem económica, vantagem competitiva na indústria do turismo”.
“É preciso alargar esta capacidade de fazer com que os fluxos encontrem novas propostas e encontrem novas razões de valor para que as nossas comunidades, os nossos produtores, as nossas várias cadeias sintam e ganhem vantagem de valor económico para que o enoturismo também represente aqui esse activo”, explicou.
Uma posição sustentada, também, pelo presidente da Entidade de Turismo do Alentejo e Ribatejo (ERTAR): “O enoturismo é fundamental para a promoção turística do nosso País”.
Para Vítor Silva, “Portugal tem a ambição de ser conhecido como o melhor destino de enoturismo da Europa”.
“Achamos que isto é possível. Primeiro, porque Portugal faz turismo muito bem. É o melhor sector de actividade económica que temos e foi o motor que arrastou Portugal para fora da crise”, afirmou, reforçando: “no turismo, temos muitos ‘Ronaldos’. Somos dos melhores que há a fazer turismo, e com pouco dinheiro”.
“Esta ambição de tornar Portugal como o melhor destino de enoturismo não é uma ambição desmedida, é realista. Somos muitos e bons a fazer turismo e temos vinhos incríveis. Quando comparamos os nossos vinhos com os do Chile, ou da Argentina, os nossos são, claramente, melhores. Temos toda a capacidade para nos transformarmos no melhor destino de enoturismo da Europa”, concluiu.
“Um rasgo de inovação e de oportunidade”
Também presente nestas X Jornadas de Enoturismo, Nuno Russo, vereador da Câmara de Santarém e ex-secretário de Estado da Agricultura e do Desenvolvimento Rural, realçou, igualmente, a importância do sector do vinho para a economia portuguesa, com um “contributo significativo para as exportações nacionais” e para o “equilíbrio da balança comercial”.
Em 2019, Portugal ocupava o 9.º lugar do ranking de “maiores exportadores mundiais de vinho”, relembrou, realçando que “temos crescido a um ritmo de mais de 20 milhões de euros ao ano”.
“Mesmo durante a pandemia Covid-19, a agricultura não parou, a produção não parou e o sector do vinho também não”, apontou, acrescentando: “o grande objectivo após esta crise passa por voltar aos níveis de crescimento e aos níveis de exportação.
Para tal, Nuno Russo considera que é crucial lançar medidas que permitam “continuar a garantir o crescimento económico”, designadamente, através da “criação de valor acrescentado” e do “valor da produção nacional”.
Nuno Russo olha, por isso, para o enoturismo como uma “área fundamental” para a “promoção dos vinhos portugueses” e para um “turismo mais sustentável e diversificado”.
Além de “promover os produtos endógenos” ou “experiências gastronómicas realizadas nas diferentes regiões vitivinícolas”, o enoturismo deixa “marcas na memória de quem nos visita e de quem quer conhecer Portugal”, afirmou, considerando ser “relevante, importante e estratégico” para o desenvolvimento do sector vitivinícola, mas também, associado ao “turismo ao nível nacional”, uma vez que o sector “tem a capacidade de acrescentar valor ao vinho e ao turismo”.
“Para o mundo rural o enoturismo surge como um novo fôlego. Um rasgo de inovação e de oportunidade num tempo em que se buscam traços de identidade que nos distinguem e nos garantem uma sensação de pertença a territórios únicos e a comunidades destintas. As sinergias criadas pelo turismo e a vitivinicultura têm vindo a provar que esta relação estreita em muitos casos impossível de dissociar garantem e estimulam o desenvolvimento quantitativo e qualitativo dos espaços rurais”, disse.
Segundo analisou, “o enoturismo, principalmente na última década, suscitou interesse no nicho de mercado cada vez mais exigente e experiente em termos de viagens e de lazer” e esse nicho de mercado “tem vindo a crescer e não prescinde de qualidade, singularidade, hotelaria diferenciada, querendo vivenciar experiências únicas que abarcam novos e diferentes públicos”.
“Hoje em dia, o degustar de um vinho é sinónimo de submersão num evento global, que inclui todos os sentidos. A aprendizagem de novas formas de estar na vida, o divertimento, a aventura, o vivenciar da tradição associados à inovação e à modernidade. Todos sabemos que o enoturismo, para além de alargar o turismo a todo o território e diversificar os mercados emissores também reduz a sazonalidade, razões pelas quais tem sido um activo estratégico com relevância nas estratégias, nos programas e nos planos de turismo português quer a nível nacional como regional e até local”, afirmou Nuno Russo, para quem, em Portugal, o enoturismo “tem encontrado chão fértil nas regiões vitivinícolas existentes no país”.
“Esta é uma área fundamental para a promoção dos vinhos portugueses e para um turismo diversificado que valoriza os produtos nacionais. Por outro lado, a experiência enogastronómicas realizadas nas diferentes regiões marcam a memória de quem nos visita e é para todos muito claro que a gastronomia e os vinhos são produtos estratégicos para o desenvolvimento do turismo em Portugal”, sublinhou.
“O vinho e o enoturismo são fundamentais para a promoção interna e externa da excelência dos vinhos produzidos em Portugal e do turismo de qualidade que o país tem para oferecer”, disse, sublinhando que “os vinhos portugueses já encontram eco à escala global pelo prestígio que conquistaram ao longo dos últimos anos”.
“Faz sentido que a oferta deste produto tenha um enquadramento ancestral, genuíno, sóbrio e ambicioso e o distrito de Santarém possui-o com naturalidade. Faz sentido que o País se empenhe num preenchimento territorial que lhe permita uma complementaridade de oferta. E a capital do Ribatejo afirma-se com naturalidade. Faz sentido que se diversifique a oferta turística com base num País multifacetado que não seja só praia ou serra. Lisboa ou Porto. E a região Tejo é um elemento natural dessa estratégia. Faz sentido que a cidade e o concelho de Santarém sejam a montra desse novo potencial turístico que nos permita experimentar o novo impulso de qualidade e de excelência”, concluiu.
Luís de Castro, presidente da CVR Tejo, realçou, igualmente, a “enorme potencialidade” do sector: “nós somos uma região em franco crescimento e o mérito do crescimento da região deve-se aos produtores”.
“Apesar da pandemia, a região tem vindo a crescer todos os anos: em 2015, a região do Tejo certificava um quarto daquilo que produzia e, hoje em dia, já ultrapassou os 50%. E, em termos de exportação, já temos uma percentagem muito superior à que tínhamos em 2015”, afirmou ao Correio do Ribatejo à margem destas Jornadas.
Ao nosso Jornal, o presidente da CVR Tejo realçou o “forte investimento” que tem sido feito na região, ao nível tecnológico e na plantação de castas mais adaptadas, sublinhando que passou a época em que a única preocupação era produzir em quantidade. No seu entender, a região tem vindo a produzir vinhos de qualidade “ímpar” e com equilíbrio no preço, uma relação que, afirmou, tem sido apreciada pelos consumidores.
Para o futuro, o responsável não tem dúvidas que a região vai crescer e conquistar, cada vez mais, cota de mercado nacional e internacional: “Aí, o mérito é dos nossos produtores e do trabalho desenvolvido nos últimos 30 anos. Um percurso que já envolve mais do que uma geração. O que a região tinha de bom, já cá estava. Há agora uma nova geração, e foram renovadas e elevadas as técnicas de produção. Há novos processos introduzidos, quer na vindima, quer na vinificação, e tudo isso, em conjunto, veio proporcionar vinhos de melhor qualidade e que conseguem atingir classificações e prémios que, se calhar, eram impensáveis há 20 anos”.
Nestes dois dias de Jornadas, as manhãs foram dedicadas à partilha de informação, de experiências e ao debate, e as tardes reservadas ao “trabalho de campo”, com a visita a produtores de Vinhos do Tejo em que o enoturismo é uma vertente de relevo para o negócio, tais como a Casa Cadaval, em Muge, e Quinta da Lagoalva, em Alpiarça e Quinta da Lapa, em Manique do Indendente.
As Jornadas de Enoturismo do Centro de Portugal são uma iniciativa promovida por uma comissão organizadora, composta pela Comissão Vitivinícola da Bairrada, Comissão Vitivinícola da Beira Interior, Comissão Vitivinícola Regional do Dão, Comissão Vitivinícola da Região de Lisboa, Comissão Vitivinícola Regional do Tejo, Turismo Centro de Portugal e Escola de Hotelaria e Turismo de Coimbra, e desenvolvida ao abrigo do Programa Valorizar, da Turismo de Portugal. Conta com o apoio da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região Centro (CCDRC) e da Câmara Municipal de Santarém.
Filipe Mendes