O músico scalabitano Vítor “Fininho”, fundador da banda “Sui Generis” e falecido em Março de 2012, é recordado pelos amigos no 10º aniversário da sua morte.

Descrito como “artista multifacetado, com acentuada tendência para o rock”, Vítor Barreiros, de seu nome, “Fininho” distinguiu-se desde cedo no panorama musical da cidade, criando um público interessado que vibrava com a sua figura irreverente sempre que o som da sua viola, ou a sua voz, ecoavam nos concertos que organizava com a banda Sui Generis.

“Cidadão contestatário, inconformado e activista, Vítor amava a sua família acima de tudo, e incluía nela todos os seus amigos, dizendo sorrindo, que tinha uma grande família”.

Dez anos após a sua morte, a 22 de Março de 2012, o seu espírito irreverente é relembrado, num texto de Luís Godinho, que realizou, também, em 2016, um documentário sobre a vida do músico de Santarém.

Vítor Fininho: O meu amigo

Faz hoje 10 anos, a 22 de Março de 2012, que vi partir um amigo. Refiro-me ao Vítor, o Vítor das guitarradas, do Hendrix, do Santana, do Sui Generis. Esse mesmo, o Vítor Fininho. Mas recuemos um pouco no tempo.

Faz agora pouco mais de quarenta anos, era eu outro dos fiéis admiradores da banda “Sui Generis”, quando de surpresa sou convidado pelou meu “guitar hero” local, o Vítor Fininho, para tocar nesse que era o seu grupo. Hoje não recordo exactamente o que foi para mim esse dia, já lá vão tantos anos, mas seguramente que terei andado o dia inteirinho com os pés acima do chão, tanta foi a felicidade. Passei a fazer parte dum grupo muito particular, cujos lemas eram desde sempre o gozo puro da musica, as partilhas de grupo, os encontros desinteressados e as actuações quase sempre mal pagas, porque o cachet não era o mais importante desde que chegasse para pagar as despesas.

Lembro-me que a semana era passada a correr, na espectativa do próximo sábado de espectáculo, que tanto poderia ser em Viseu, ou logo ali ao lado bem perto de casa, numa festarola qualquer, como quando tocámos com o António Variações, nas festas da Ribeira de Santarém. Foram tempos memoráveis, de viagens em caravana numa cansada Ford Transit, do velho Vasco, carregadinha até mais não de gente e material, e mais o Renault 16, da Elvira, dos jantares previstos no contrato, onde invariavelmente era servido frango com batatas fritas ou batatas fritas com frango, mas sempre muito, lá isso era verdade. E claro, muitas grades de cerveja, que aquilo ia dar para suar. E depois vinha a hora de tocar, e aí é que era. Era ver parzinhos, a dançar o “satisfaction” dos Rolling Stones, com “satisfaction”, pois claro, bem agarradinhos como se o mundo estivesse para acabar. Então fazíamos a música durar durante muitos, muitos minutos, onde as desbundas individuais marcavam presença, sobretudo nos longos improvisos do Vítor Fininho. Ah guitarras, o quanto gemeram….

O Vítor era o Líder da banda. Era o amigo a quem recorrer quando era preciso um desabafo. Era o companheiro mais velho, de ideais fortes. Não conheço dessa altura, grupo de rock que tenha concretizado o ideal da convivência” pela estrada fora” como o “Sui Generis” do Vítor Fininho fez. Estou à vontade para o dizer porque fui parte do projecto.

Os anos passaram e o Sui Generis findou (nunca oficialmente), mas quase trinta anos depois, em 2008, O Nelson Ferrão lembrou-se de sugerir uma reunião do grupo para um espectáculo.

Então, cinco dos elementos do início da aventura, O Vítor Fininho, o vítor Zé, o Jorge, eu e o Joaquim Firmino passámos dois mezinhos inteiros a ensaiar para o dito concerto, agendado para Maio.

Em dois meses, reviveram-se andanças, momentos passados outrora, alegrias, tristezas. Voltámos a discutir, a refilar uns com os outros. Enfim, voltámos atrás vinte e tal anos. Em dois meses, sinto hoje, que estive à beira dum paraíso. Por dois meses voltámos a ser o Sui Generis do Vítor Fininho. Depois, naquela noite mágica, tocámos.

O Vítor Fininho teve o teatro “Sá da Bandeira” cheio com os amigos que vieram do norte e do sul e que trouxeram, alguns, os filhos para sentir aquela coisa que os pais falavam que era o Sui Generis. E foi ver o Vítor Fininho, feliz, aos pulos, agarrado à sua guitarra vermelha, a tocar desenfreado a cantar, com o sentir nas palavras. Era o Vítor Fininho que eu conheci, o mesmo daquelas noites passadas a desbundar sem horas nos ensaios, na garagem apertada do Vítor Zé.

Grande noite, aquela no dia 10 de Maio de 2008.

Depois o Vítor começou a deixar-nos devagarinho, a lutar com o inimigo duro que lhe minava a saúde. Lutou mais quatro anos e um dia foi vencido… ou talvez não. O Vítor venceu. Partiu, deixou-nos é certo, mas o Vítor era um homem bom, carregadinho de profundas convicções. Algumas vezes o vi sentado num banco da Igreja a rezar. Ele dizia, já quase no fim, “ Não podemos deixar de ter fé”.

O Fininho, hoje, creio que esteja onde estiver, de certeza que está em paz, a tocar o “You time is gonna come” ou o Whole lotte love ou a trip ou o Olha ó meu, eu sei lá!…

Até um dia, Vítor, noutro concerto dos Sui Generis

Luís Godinho

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