Em Portugal, o enoturismo assume-se como uma actividade com cada vez maior relevância. Dos pequenos aos grandes produtores, o vinho é cada vez mais um motivo para quem quer visitar o país. Há, contudo, uma lacuna nesta actividade: “É um sector que oficialmente ainda não existe.” É precisamente para responder a este desafio que surgiu a APENO (Associação Portuguesa de Enoturismo), pelas mãos de Maria João de Almeida, wine writer e consultora de vinhos. A presidente da APENO destaca ao Correio do Ribatejo a falta de “regulamentação” no enoturismo e fala dos “desafios imensos” que existem para afirmar o enoturismo como um real sector de actividade.
Fundou a APENO em 2020. Que objectivos tem a associação?
Falamos muito em enoturismo e, de facto, a actividade cresceu substancialmente ao longo dos últimos anos. No entanto, e na verdade, é um sector que não existe porque não existem números… Não temos números que digam quantas pessoas trabalham na área. Quantas adegas em Portugal praticam o enoturismo, quantas actividades é que existem em cada uma delas, quantos visitantes … Ou seja: há todo um sector que tem que ser organizado e precisa de bases fortes para que sejas uma referência a nível mundial. Portugal tem um potencial enorme neste campo. Somos um pais pequeno, mas lindo, com imensas actividades possíveis. Da praia à montanha, actividades motoras, bicicleta, bird watching, há tanto por explorar, tanta coisa bonita para conhecer e a APENO surgiu, precisamente, para tentar organizar o sector de uma forma mais objectiva. Os organismos políticos são importantes, são eles que regem o País, mas temos que ter associações como esta para ser mais incisivas e que sejam o complemento dos organismos estatais. Temos, no fundo, que conseguir trabalhar em rede, para que o nosso enoturismo seja organizado e uma referência a nível mundial. Fala-se muito na Toscana, por exemplo, mas nós temos tanto potencial como eles.
O que é preciso então fazer em Portugal para que o sector se organize e cresça?
Um dos factores mais importantes, quanto a mim, é a formação. É essencial para oferecer um bom serviço. E, oferecendo um bom serviço, um serviço mais completo, e profissional é meio caminho andado para o sucesso. Por vezes, falta essa formação para que possamos ser mais objectivos. A digitalização, também, ajudará muito na internacionalização: como enoturista, se eu não puder ir à Africa do Sul, mas interessar-me, por exemplo, em visitar uma adega em alguns casos já o posso visitar digitalmente. Cada vez mais os vídeos e experiências em 3D, vão ser uma ajuda para podermos ir mais longe, dar a conhecer o nosso país a mais enoturistas mesmo que eles não venham cá. Estes dois aspectos são fundamentais. Nota-se ainda uma grande necessidade de profissionalização, o enoturismo é um sector que precisa ainda de se organizar. No entanto, apesar das lacunas que existem, há gente a fazer bem. Muito bem. E, tal como acontece com os vinhos, temos enoturismos que não ficam atrás de nenhum outro no mundo.
Do que conhece da região Tejo, qual é a leitura que faz do seu potencial em termos de enoturismo?
Eu acho que a região Tejo tem um grande potencial. É um território muito rico, com uma cultura muito rica: estamos a falar do rio, do cavalo, do campino, gastronomia, dos monumentos… há uma riqueza imensa que tem que ser mostrada. Uma coisa que poderia melhorar o território seria a questão do alojamento, é preciso ter mais. Quando falamos de adegas, e isto acontece muito lá fora, muitas vezes oferecem alojamento e aqui não existe muito… Apenas duas adegas têm essa oferta. Se quisermos pernoitar num local que produza vinho, conhecer a história do produtor, conhecer a fonte, não temos essa hipótese. É necessário mais alojamento, mais formação e mais diversidade. Com mais serviços é mais fácil captar o enoturista.
O que espera do sector para o futuro?
Eu acredito que será um caminho complicado de percorrer. Existem muitas campanhas e fala-se muito, mas, na verdade, ainda há um caminho longo e difícil a percorrer. Não só por questões burocráticas mas, principalmente, porque é preciso mudar mentalidades e promover um verdadeiro trabalho em rede. Para a equipa da APENO, o importante é trabalhar, unir esforços e fazer parcerias nacionais e internacionais, provar a sustentabilidade do enoturismo e a sua importância como factor dinamizador das exportações, entre outras medidas.