O livro “Corações que Partem”, escrito por Ana Isabel Santos e ilustrado por Maria Inês Gonçalves, foi apresentado na quinta-feira, 6 de Outubro no ISLA de Santarém.

A obra é uma parceria entre o ISLA, a câmara municipal da Azambuja, e a junta de freguesia de Vale do Paraíso e conta a história, fictícia e algo generalizada, das famílias que fugiram da guerra na Ucrânia. A obra é escrita em português e acompanhada de uma tradução para ucraniano.

A obra nasceu da vontade das autoras encontrarem uma maneira de ajudar, especialmente as crianças, que chegaram ao centro de refugiados de Vale do Paraíso, concelho de Azambuja, um dos primeiros sítios da região a abrir portas aos refugiados da guerra na Ucrânia. A obra tem como objectivo ser um instrumento que as crianças devem ler acompanhadas pelos pais ou por um técnico que as acompanhe para as ajudar a partilhar os sentimentos.

A sessão de apresentação do livro contou com a presença de representantes do ISLA, das autarquias parceiras, e das turmas de 3º e 4º ano da Escola dos Combatentes.

Este foi um projecto a quatro mãos. Como nasceu o livro?

(ANA) A ideia nasceu porque em Vale do Paraíso nós recebemos 150 refugiados logo no inicio de março, tinha estalado a guerra a 24 de Fevereiro. A Câmara municipal e a junta de freguesia receberam 150 refugiados e isso teve um grande impacto em mim. Sou psicóloga e pensei o que poderia fazer por eles sem ser o apoio psicológico porque a língua é uma grande barreira. Então o que é que pensei… Se calhar escreveria um livro, porque assim eles podem ficar com uma história que pode ser contada e acaba por ser um instrumento de trabalho. E pensei em desafiar a Inês, porque apesar de ser arquitecta de formação, tem gosto pela ilustração e tem o curso de ilustradora. Pensei que seria a pessoa certa, porque ela conseguiu transformar o previsto de todas as etapas com desenhos aparentemente simples para que haja uma projecção da fantasia. Que é para não estar tudo na história, para estar no desenho e para além da história. É também uma ferramenta de trabalho.

Qual é o objectivo do livro?

(ANA) É a elaboração do trauma. Porque com a leitura acompanhada por um adulto que pode ser a mãe, mas também um técnico profissional, e no fim há uma explicação por cada etapa, para trabalhar o luto, a separação, a envolvência e a insegurança.

Acompanharam os refugiados que foram para o Vale do Paraíso?

(ANA) Eu não acompanhei, mas a Inês sim.

(INÊS) Sim, eu acompanhei os refugiados. Fiz voluntariado, mas não com o livro, nem no âmbito desta iniciativa.

O livro foi criado com base nas vivências que lhe transmitiram?

(ANA) Ele foi pensado antes, naquilo que a criança poderá ter dentro dela nesta dificuldade, nesta dor, no trauma que é. Houve uma imagem, e a Inês pode falar nisso, porque fizemos lá actividades de recreio e de envolvimento com a população.

´Há uma imagem que transporta isso, mas o livro foi pensado não com base nessas vivências.

(INÊS) Foi um processo criativo um bocadinho inverso do comum, porque normalmente existe a história e depois ilustra-se. Aqui nós pensámos nos momentos que queríamos transmitir.

As personagens ainda não estavam bem definidas, o que é que haviam de ser e depois através de um desenho da minha filha que costuma fazer sempre corações com olhos, naquela andava a fazer muitos desses desenhos na escola, eu disse à Ana “Porque não fazermos uns corações?”. Foi daí que surgiu toda esta ideia do amarelo e do azul, as cores da Ucrânia, misturadas com as cores de Portugal, e depois surgiu o texto e a história. Como a Ana dizia está aqui uma das imagens que é a integração em Vale do Paraíso, com as bicicletas que foi também um dos momentos, das actividades que fizeram com eles. A população de vale do paraíso fez passeios de bicicleta com as crianças. A imagem surgiu dessas actividades que fizeram lá com os refugiados.

Qual é a importância de haver um acompanhamento das crianças para ajudá-las a integrarem-se na comunidade?

(ANA) É um trabalho muito importante, mas muito difícil e delicado. São crianças cujos pais ficaram na guerra, que podem desaparecer e que há uma angústia de morte permanente. Isso não é comparável com outra integração de outros refugiados. Estas crianças têm uma situação traumática para elaborar. Através do desenho e da história e da escrita, da linguagem, é a forma de poderem elaborar estes lutos e esta situação traumática. Há aqui uma diferença grande. Estas crianças vieram abruptamente para cá com a mãe ou com outro familiar, ou mesmo sem ser familiar e deixaram para trás tudo. Podem voltar a encontrar ou não. A figura do pai poderá ficar para sempre dentro deles, mas fisicamente poderá já não vir a acontecer. Isso é muito traumático.

Os vossos corações também são corações que partem com toda esta situação?

(ANA) Os nossos corações têm de ser corações que ficam para quem está. O título corações que partem tem um significado associado ao partir de quebrar e ao partir de sair. Quando pensamos neste título, foi nesse sentido.

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