No conflito em curso no leste da Ucrânia, desde a anexação da Crimeia em 2014, o presidente russo Vladimir Putin tem habilmente manipulado o sentido de pertença à “Mãe Rússia” para justificar e ganhar apoio para as suas ações na região. Esta exploração do patriotismo russo desempenha um papel crucial na narrativa que Putin utiliza para justificar a sua intervenção militar e manobras geopolíticas.
Em primeiro lugar, é importante compreender a importância histórica e cultural do conceito de “Mãe Rússia” na mente dos russos. Ao longo dos séculos, a Rússia tem sido um ponto focal de poder e orgulho para os seus cidadãos. A ideia de uma entidade materna poderosa e protetora está profundamente enraizada na identidade nacional russa.
Putin, como ex-agente do KGB e enquanto líder político habilidoso, reconhece o poder dessa identidade compartilhada e utiliza-a como uma ferramenta para os seus próprios objetivos.
Ao retratar a Ucrânia como uma extensão natural da Rússia, Putin apela diretamente aos sentimentos de orgulho e lealdade dos russos em relação à sua nação. Ele retrata as ações russas na Ucrânia como uma missão de proteção dos compatriotas étnicos russos e a preservação dos interesses russos na região. Esta narrativa é habilmente construída através da manipulação da história compartilhada entre os dois países e da exploração das divisões étnicas e culturais dentro da própria Ucrânia.
Além disso, Putin alimenta o medo e a incerteza na sociedade russa, retratando a expansão da NATO e a influência ocidental na região como uma ameaça direta à segurança nacional russa.
Ele pinta a Ucrânia como uma peça-chave na tentativa do Ocidente de cercar e enfraquecer a Rússia, alimentando assim a ideia de que a intervenção militar russa na Ucrânia é uma resposta defensiva legítima.
No entanto, por detrás dessa retórica patriótica e nacionalista, está uma estratégia política calculada para consolidar o poder de Putin e reforçar a sua posição como líder indiscutível da Rússia. Ao apresentar-se como o defensor dos interesses russos e o protetor dos russos étnicos no exterior, Putin fortalece o seu apoio doméstico e desvia a atenção dos problemas internos enfrentados pelo país, como a corrupção, a estagnação económica e as restrições às liberdades civis.
Entretanto, a tragédia humana continua na Ucrânia, alimentada pela manipulação política e pelo jogo de interesses geopolíticos.
E sendo os sentimentos de pertença tanto uma força unificadora quanto uma semente de divisão é nesse terreno complexo que encontramos justificações para guerras, onde o sentimento de pertença pode servir como uma espada afiada (Rússia) ou como um escudo protetor (Ucrânia).
Pedro Carvalho