José Carvalho Araújo é desde Outubro de 2023 o preparador físico do Unggul FC, clube que compete na 1.ª Divisão Nacional de Futsal da Indonésia.

Natural de Santarém, adaptou-se bem à realidade indonésia, um país que considera “lindo, com boa comida e condições de vida e de trabalho impecáveis”.

Treinou as camadas jovens da UD Santarém e passou ainda pelo UFC Almeirim, AD Fazendense, SL Cartaxo e pelas Selecções Distritais da AF Santarém.

Quando e como começa a sua ligação ao desporto? 

Começou desde muito jovem. Aos três anos comecei a praticar Hóquei, no HC Santarém, depois pratiquei diversas modalidades, como natação, futebol e futebol de praia. Sempre tive o desporto na minha vida desde muito cedo.

A partir de que idade pensou que a sua vida profissional seria ligada ao desporto? 

Quando era criança sempre sonhei ser jogador de futebol, mas como não tinha talento para tal, não deu para o concretizar. 

Aos 17 anos, chegava a altura de perceber o que queria fazer da vida, e eu sempre soube que a minha vida era o futebol, e para isso teria de ser treinador. A partir daí, comecei a gerir todos os meus passos com esse objectivo, fosse através da via Académica, na qual tenho uma licenciatura, um mestrado, duas pós-graduações e actualmente estou a meio do meu Doutoramento, fosse no terreno, onde já treinei 10 clubes de futebol, futsal e futebol de praia.

Assim, aos 18 anos saí do Ribatejo e fui tirar a minha Licenciatura em Desporto no Politécnico da Guarda, e comecei a treinar futebol. O meu primeiro clube, foi o GD Estoril Praia onde realizei o meu estágio curricular. Depois tirei o meu mestrado em treino desportivo pela ESDRM que me deu o UEFA B, e foi aí que voltei, cinco anos depois, à minha terra, ao Ribatejo.

Treinou vários clubes do Ribatejo. Que recordações guarda dessa altura? 

Foram anos interessantes, de grandes aprendizagens, conquistas e onde pude conhecer e cruzar com muitas pessoas que ainda hoje fazem parte da minha vida. Treinei as camadas jovens da UD Santarém, quando o clube estava a tentar relançar de novo a formação, depois tive no UFC Almeirim, no AD Fazendense, no SL Cartaxo, e ainda nas Selecções Distritais da AF Santarém. 

No UFC Almeirim era treinador adjunto das seniores femininas com o mister Pedro Coelho, que competiam na 2.ª Divisão Nacional feminina. Foi um grupo de trabalho incrível, as jogadoras faziam muitos sacrifícios para poderem jogar, e a alegria e o amor que tinham pelo futebol contagiou-me muito. 

Ainda no Almeirim, com o mister Alfredo Amaral, fomos Campeões Distritais Sub15 femininos, os primeiros da história da AF Santarém. Foi o meu primeiro título enquanto treinador e ainda hoje, passado tantos anos, recordo com muita alegria esse momento. 

No ano seguinte tenho a oportunidade de ir para o AD Fazendense, para treinador adjunto das seniores femininas, com o mister Paulo Moreira, que competiam na 3.ª Divisão Nacional feminina, no qual por uma questão de diferença de golos não nos qualificamos para a fase de subida. Aí tínhamos uma equipa muita heterogénea, jogadoras dos 15 aos 32 anos, o que fez com que o plantel fosse riquíssimo em termos de ideias, formas de ser e de estar, que contribuíram para um espírito de equipa muito forte. 

Nesse ano chegámos muito longe na Taça de Portugal, só tombando para uma equipa de divisão superior, essa campanha na Taça é das melhores recordações que tenho dessa época. 

Por último, fui para o SL Cartaxo para treinador adjunto dos Sub21 masculinos, quando esta última direcção, liderada pelo João Neves, tomou posse. A aposta da direcção era fazer reerguer e acordar o gigante adormecido do Ribatejo que era o SL Cartaxo, e foi com essa premissa que trabalhámos. É com grande gosto que vejo que o SL Cartaxo está a crescer e perto de voltar a ser o gigante de outrora. 

No final dessa época, mudo-me para o Algarve, onde fui treinador adjunto dos Sub15 do CD Odiaxere, no qual não fomos campeões por um ponto. De seguida fui coordenador geral do UAC Lagos, no qual fizemos história no futebol de praia feminino (onde ainda jogaram muitas jogadoras ribatejanas) e no masculino, e, por último, na época 2022/2023 rumei aos Seniores B do Portimonense SC onde conseguimos alcançar uma histórica subida de divisão, liderada pelo mister Mario Leão.

Como é que surge a oportunidade de se mudar para a Indonésia?

Em Outubro de 2023 recebo um contacto para a possível ida como preparador físico para a Indonésia, para a modalidade de futsal. O treinador principal, o João Almeida, histórico treinador de futsal português ligou-me e estivemos a falar. Aí, o meu agente, Victor Hugo da Union Sports Agency, tratou de tudo o resto e fomos então para o Unggul FC, que compete na 1.ª Divisão Nacional de Futsal da Indonésia.

É, neste momento, preparador físico na Indonésia. Como foi a adaptação a esta nova realidade?

A adaptação até foi mais fácil do que podia pensar. O país é lindo, a comida é boa, as condições de vida e de trabalho são impecáveis, e as pessoas são muito respeitadoras e afáveis, o que leva a ser mais fácil a adaptação. No trabalho, o campeonato da Indonésia é um campeonato exigente e diferente, jogamos sempre ao sábado e ao domingo, temos que estagiar metade da semana no sítio dos jogos, e as viagens são muito longas, sejam as de autocarro ou de avião. Sendo um país maioritariamente muçulmano também existem várias condicionantes devido à religião.

Todos esses aspectos levaram a que a adaptação fosse mais exigente, porém procurámos rapidamente nos adaptarmos a ela, para podermos trabalhar da melhor maneira possível para atingirmos os resultados que pretendemos.

Em que consiste o trabalho do preparador físico? Quais os cuidados a ter para se preparar os jogadores para competir a este nível? 

O trabalho de um preparador físico neste contexto divide-se em quatro vertentes: no campo, no ginásio, no escritório e no jogo. No terreno temos de realizar os treinos de recuperação dos atletas, gerir as cargas de treino e de jogo, gerir o treino físico, a activação funcional e o retorno à calma, realizar testes físicos ao longo da época para percebermos o impacto e a evolução dos jogadores, os banhos de gelo, o controlo alimentar dos jogadores, os suplementos a ser utilizados, pré jogo, durante o jogo e pós o jogo, pré-treino e pós-treino, o sono. No ginásio, temos um trabalho fundamental que é o de prevenção de lesões, o de fortalecimento muscular, o de manutenção das capacidades físicas (para jogadores lesionados) e a preparação do retorno dos jogadores lesionados. No escritório, gestão das cargas semanais e o impacto da carga sobre cada jogador, realização de relatórios fitness (GPS+PSE+ Daily Welness Report), planeamento dos treinos de ginásio e de recuperação dos jogadores. Por fim, no jogo, temos a responsabilidade de controlar a carga dos jogadores, de activação funcional e do retorno a calma e de auxiliar o máximo possível o treinador principal. 

Que condições encontrou no seu novo clube? 

O Unggul FC tem condições de topo, seja em termos de recursos físicos, materiais e humanos. Temos todas as condições para fazer um bom trabalho. As instalações são do clube, e dispomos de um campo de futsal, ginásio, gabinete de fisioterapia, sala de reuniões e de apresentações, gabinete para o staff. Fora o campo de basquetebol, de badminton, e de futebol de seis que pudemos utilizar quando pretendemos fazer diferentes tipo de treino. E, mais importante de termos todas estas coisas, é a qualidade dos mesmos, pois, todos os espaços e todo o material que temos à disposição é de elite.

Em Portugal a evolução do Futsal é relativamente recente, vários clubes têm ligação aos clubes de Futebol. Como é a situação do Futsal na Indonésia? 

Sim, na Indonésia é diferente. Na 1.ª divisão, todos os clubes apenas são clubes de futsal. Os adeptos do Unggul FC são adeptos do futsal do Unggul FC, assim como todos os outros e isso faz com que tudo seja canalizado unicamente para o futsal. 

O futsal na Indonésia é adorado pelos adeptos, chegamos a ter jogos com pavilhões lotados, com sete mil pessoas a verem os jogos. Os jogadores e treinadores são reconhecidos nacionalmente, e onde quer que vamos há sempre alguém a pedir para tirar fotografias, mesmo em cidades a 500, 600, ou 1000 kms de distância. O apoio que os clubes têm por parte da população é muito grande.

Continua a ter ligação a Santarém?

Sim, é a cidade onde nasci e vivi. Tenho 27 anos, vivi 20 em Santarém. Tenho ainda muitos amigos de infância com quem comunico constantemente, bem como muita gente que conheci ao longo do meu tempo do futebol. 

Desde que fui para o Algarve e depois para a Indonésia, o meu tempo passado em Santarém é cada vez menor, mas cada vez que volto a Santarém, costumo ir aos meus antigos clubes, porque em todos eles deixei gente muito querida, que fizeram e fazem parte da minha vida. Acompanho à distância todos os clubes que treinei, bem como tudo o que se passa na AF Santarém, porque fui muito feliz na minha cidade e em todos os clubes que estive.

Como ocupa os seus tempos livres? 

A verdade seja dita, não costumo ter muito tempo livre, uma vez que trabalho e estudo, e sempre fiz isso. Desde que comecei a treinar há oito anos que continuei a estudar, por isso muitas vezes que não estou a trabalhar, estou a fazer algum trabalho para o doutoramento. Porém, obviamente que também procuro ter tempo para mim. Nos meus tempos livres, gosto muito de ler, de passear, de fazer exercício físico, de jogar futebol, de rever amigos e familiares.

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