Nesta sexta-feira, dia 7 de Junho, assinalaram-se sessenta anos sobre a data de inauguração da Praça de Toiros de Santarém, velha aspiração dos aficionados ribatejanos, que constatavam a exiguidade e o desconforto do antigo tauródromo instalado nas ruínas do Convento de São Domingos, ele próprio também em acelerado processo de degradação.

Desde o longínquo ano de 1825 que as touradas tinham lugar numa praça de toiros de madeira, que com o passar dos anos deixou de oferecer garantia de segurança para os espectadores que aí afluíam aos festivais e corridas de toiros, para além de ser, como se compreenderá, exígua e desconfortável.

Em processo difícil e demorado, tramitado entre 20 de Maio de 1891 e 4 de Maio de 1892, o antigo Provedor Padre João Rodrigues Ribeiro logrou adquirir à Câmara Municipal de Santarém a antiga praça de toiros instalada nas ruínas do Convento de São Domingos, que o Município pretendia demolir pelo facto de os encargos com a sua manutenção se tornarem incomportáveis. Negociou-se uma permuta de imóveis, cedendo a Misericórdia as antigas instalações do Hospital Velho, sito na Rua João Afonso, e recebendo em troca o degradado tauródromo escalabitano.

Providenciaram-se alguns melhoramentos inadiáveis e de pronto a praça de toiros retomou a sua actividade, acolhendo cartéis de luxo para a época, actuando nesta praça algumas das principais figuras do toureio a nível mundial, a par de dezenas de amadores que, fora das datas do calendário tradicional, promoviam festivais e vacadas de beneficência, nomeadamente a favor do Asilo dos Rapazes, dos Bombeiros e da própria Santa Casa de Misericórdia.

Com a realização da Feira do Ribatejo, a partir do ano de 1954, na Chã das Padeiras e na Chã de S. Lázaro, a centralidade lúdica de Santarém transferiu-se do Campo Fora de Vila para este novo campo de feiras, sendo, importante, que o tauródromo não ficasse muito afastado do certame, pelo que logo começaram as primeiras diligências no sentido de se construir uma nova praça de toiros, situada nas proximidades do recinto da Feira. 

Para o efeito foi criada uma Comissão Pró-Praça de Touros, constituída pelos ilustres aficionados Dr. António Manuel de Passos de Sousa Canavarro, Eng.º João Luís de Almeida e Noronha Botelho Falcão, Dr. Luís Hilário Barreiros Nunes, Dr. João Rodrigues Trancas, Eng.º António Ferreira Quintas, Eng.º Rafael Cabrita Alves, Sr. Joaquim Manuel Sobral Bastos Temudo Baptista e Sr. Celestino Pedro Louro da Silva Graça, sendo Provedor da Mesa Administrativa da Santa Casa de Misericórdia de Santarém o Dr. Artur Proença Duarte.

O projecto da nova praça de toiros foi concebido pelo Arq.º Pedro Cid, que gentilmente ofereceu o seu labor à Misericórdia de Santarém, e da construção da obra se ocupou a empresa de construção civil “Alves Ribeiro, Lda.”, que a 10 de Janeiro de 1964 deu início aos trabalhos, os quais estavam concluídos cento e quarenta e oito dias depois, isto é, a 7 de Junho do mesmo ano estava a praça engalanada para acolher a primeira enchente da sua existência, com a realização de uma memorável corrida de toiros de gala à antiga portuguesa, a que se dignou presidir o Almirante Américo de Deus Rodrigues Tomaz, na sua qualidade de Presidente da República. 

Lidaram-se oito toiros pertencentes às ganadarias de José Infante da Câmara, Oliveiras Irmãos, Joaquim Lima Monteiro, Herdeiros de Paulino da Cunha e Silva, João Gregório, Manuel João Coimbra Barbosa, José da Silva Lico e Dr. Fernando Salgueiro. Integraram o cartel os cavaleiros Dr. Fernando Salgueiro, Manuel Conde, Clemente Espadanal, José Athayde, Pedro Louceiro, David Ribeiro Telles, José Mestre Baptista e José Maldonado Cortes e as pegas foram confiadas aos prestigiados Grupos de Forcados Amadores de Santarém e de Montemor.

Os encargos com esta construção ascenderam a cerca de nove mil contos, valor que no final da temporada de 1966 estava praticamente arrecadado, mesmo sem considerar a potencial receita relativa à venda de quatro lotes de terrenos da antiga praça de toiros. À data de 1970 o lucro líquido da praça atingira já um montante superior a 2.500 contos, o que, então, era uma soma muito considerável.

Para a obtenção das verbas necessárias para fazer face aos encargos da construção da praça de toiros – “uma realização arrojada em todos os aspectos que tiveram de ser considerados, entre os quais avulta o aspecto financeiro”, como judiciosamente referiu o Provedor Dr. Proença Duarte – houve que promover muitas diligências, nomeadamente, através de subscrição pública, a qual era realizada não apenas com a oferta de valores pecuniários, como ainda de materiais de construção e até de dias de trabalho, por gente modesta que não tinha possibilidades de despender qualquer montante, mas não se eximia de roubar algum tempo ao merecido descanso e aplicá-lo nas obras, com a superior e compreensiva concordância da empresa construtora.

Trabalhava-se de dia e de noite… só, assim, foi possível concretizar obra de tamanha dimensão sem atrasos nem derrapagens financeiras!

Ao longo das seis décadas de actividade na Praça de Toiros de Santarém cumpre registar a ocorrência aqui de alguns dos principais fastos da Tauromaquia portuguesa, que permitiram dar uma grandiosa imagem do brilhantismo de alguns dos mais conceituados toureiros e forcados de todas as épocas e a imponência de algumas das mais referenciadas ganadarias lusas.

A gestão taurina da primeira época esteve a cargo da Comissão Pró-Touradas, que diligenciara a sua construção e entrega do imóvel à Santa Casa de Misericórdia de Santarém, entidade que nas temporadas de 1965 e 1966 cedeu a sua exploração à Sociedade do Campo Pequeno, Lda., onde pontificava essa figura imensa que foi Manuel dos Santos. A importância da praça extravasou fronteiras e conquistou o interesse da empresa Pagés, concessionária da Real Maestranza de Caballería de Sevilha, levada ao tempo pelo conceituado empresário taurino D. Deodoro Canorea, que concessionou o tauródromo escalabitano por três épocas, porém apenas a explorou directamente em 1967, cedendo a exploração dos anos seguintes à Sociedade do Campo Pequeno, Lda.

Em 1970 Celestino Graça propôs-se assumir a exploração da Praça em representação da Santa Casa de Misericórdia de Santarém, nas seguintes condições: à Misericórdia de Santarém era garantido, no mínimo, um valor idêntico ao que era pago pelo anterior concessionário, mesmo que se registassem prejuízos ou o lucro apurado fosse inferior àquele valor, e todo o lucro eventualmente conseguido reverteria integralmente para a Santa Casa. E assim foi durante seis épocas, ou seja, até à data do falecimento de Celestino Graça (24 de Outubro de 1975), sendo que na temporada de 1972 ainda houve lugar para um significativo melhoramento que consistiu na electrificação da praça com um dos mais modernos sistemas de iluminação da Philips, inaugurado a 23 de Setembro desse ano com um espectáculo notável, que culminou com uma noite de fados à luz de velas.

Posteriormente, a Mesa Administrativa da Santa Casa chamou a si a gestão do processo de organização das corridas de toiros, por intermédio de Comissões de Irmãos por si nomeadas, ou por adjudicação da concessão, cumprindo destacar que durante muitas temporadas os resultados foram muito positivos, tanto no ponto de vista financeiro como na perspectiva taurina, embora nas últimas temporadas a praça tivesse perdido prestígio e fosse confrangedora a escassa afluência de público, mesmo em alguns casos com cartéis interessantes.  

A partir da temporada de 2019, através da generosa acção da Associação “Praça Maior”, a que se seguiu, dentro do mesmo espírito e disponibilidade, a Associação “Sector 9”, iniciou-se um notável trabalho de recuperação da Monumental “Celestino Graça”, quer ao nível do próprio imóvel, em preocupante estado de degradação, como inclusivamente ao nível da sua categoria taurina, pois os aficionados, depois do extravagante ciclo de enchentes artificiais no tempo do Dr. Moita Flores como presidente do Município, haviam virado as costas a Santarém, votando à decadência o tauródromo escalabitano.

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