O Rugby Clube de Santarém (RCS) atingiu o maior feito da sua história. O clube vai marcar presença pela primeira vez, na 1ª Divisão de Honra da modalidade, após uma final emotiva e renhida, vencida por apenas três pontos de vantagem, contra o Rugby Clube de Setúbal, no Estádio Nacional do Jamor.

Nuno Serra, presidente do RCS, esteve á conversa com o Correio do Ribatejo, onde nos contou o balanço da temporada atual e a estratégia delineada, expôs os desafios futuros que o clube enfrentará na primeira divisão e explicou quais sãos os valores que fazem parte da “família” do RCS. 

Como descreve a temporada e a caminhada efetuada pelo clube este ano?

A caminhada foi boa. Atingimos um resultado muito bom. Nós começámos o ano com muitos novos jogadores, com muitos atletas que subiram dos escalões SUB 18. Tivemos, também, alguns jogadores de grande experiência que se juntaram à equipa e até outros que regressaram e, portanto, conseguiu-se um nível de competitividade que nos levou até à subida de divisão.

Houve também um maior compromisso. Este grupo de jogadores percebeu que, com o seu nível técnico, apostando no nível físico, conseguia ir mais longe e, portanto, foi um fator motivacional. E depois houve algo que muito me orgulha foi o apoio incondicional da grande família do Rugby Clube de Santarém, para suportá-los e incentivá-los. Acho que isso foi fundamental.

Quais foram os principais fatos que contribuíram para este sucesso desportivo da equipa sénior, nesta época?

O sucesso não se deve efetivamente ao trabalho circunstancial de um ano. Deve-se ao trabalho de muitos anos neste clube. Fomos paulatinamente crescendo, criando estrutura no clube, amadurecendo o nosso modelo de jogo, preparando a equipa e clube mentalmente para darmos este passo e trabalhando os escalões de formação tecnicamente para este momento. 

Já tínhamos ido a duas finais. Já sabíamos o que era disputar uma final e, portanto, conseguimos com tudo aquilo que já era a nossa experiência nestes momentos, ir para esta última final que ganhámos, mais tranquilos, mais predispostos, a contornar as adversidades do jogo e foi o que conseguimos fazer. Mesmo nos momentos difíceis fomos os que tiveram mais vontade de vencer, conseguimos dar a volta por cima e acabar por ganhar. 

Como foi preparar a equipa para uma final tão renhida, decidida por apenas três pontos?

Nós, acima de tudo para esta final, tentámos não quebrar a rotina dos jogadores. Nas outras finais foi algo que nós tínhamos feito, acabávamos por criar muita pressão na equipa. Desta vez tentámos fazer tudo ao contrário, como se fossem para um jogo normal, sem grandes pressões, sem grandes alterações às suas rotinas e ao espírito com que eles têm ido para todos os outros jogos e, portanto, deixá-los fazer aquilo que eles sabem fazer bem, que é jogar rugby e foi isso que fizeram, cheios de vontade e garra, e jogaram muito bem. Ganharam.

As finais são sempre renhidas, por isso é que são as finais. As duas equipas podem ganhar. Neste caso penso que Santarém ganhou com grande justiça, foi a melhor equipa em campo e não há nada a dizer. 

Qual a sensação para os atletas e para o clube representarem a cidade e levarem o seu nome a nível nacional?

Para nós, Rugby Clube de Santarém, é muito importante o nome de Santarém. Aliás, nós vamos a muitos torneios de formação e levamos a bandeira de Santarém. Nós temos muito orgulho e é para nós uma honra enorme representar a nossa cidade e levar o seu nome mais longe. E agora, podemos dizer que, ao subir para este escalão maior, Santarém está num patamar desportivo de uma equipa sénior masculina que eu não lembro se alguma vez esteve. 

Segundo o que eu sei, neste momento há três equipas nos escalões maiores do distrito. Há o futsal em Ferreira do Zêzere, há o hóquei em Tomar, e há o Rugby Clube de Santarém, em Santarém. Eu espero que também seja um grande orgulho para Santarém ter uma equipa no escalão maior e olhem para o rugby como um símbolo desta cidade e que o próprio município transporte com rugby um bocadinho a sua imagem.

Que desafios o clube espera enfrentar na Divisão de Honra, tendo em conta a exigência deste escalão? Acredita que vai ser possível a manutenção na primeira divisão?

Nós temos a consciência que vai ser muito difícil. Até porque somos um clube que tem um orçamento muito baixo, em comparação aos outros clubes e isso é o maior desafio: financiamento da nova época. 

O Rugby Clube de Santarém viveu sempre muito do esforço da sua comunidade, dos patrocinadores e do apoio PAFAD que o Município atribui aos clubes. Mas o RCS viveu muito de si próprio, caminhou sempre muito sozinho, por si próprio, o melhor exemplo são as obras de beneficiação da nossa sede que foram sempre única e exclusivamente financiadas por nós próprios. Nós quisemos ser sempre uma parte de solução, o nosso papel não podia ser exigir mais atenção antes de provar que merecíamos. Nós queríamos mostrar que éramos capazes. E fomos.

O nosso desafio agora é efetivamente conseguir a dotação orçamental. Tendo essa dotação orçamental e tendo capacidade financeira para robustecer a equipa que, no fundo, é criar condições que nos permitam enfrentar contra os nossos adversários mais bem preparados e conseguirmos ser o mais regulares possível, ganhando sempre que surja a oportunidade. Teremos de sabermos gerir muito bem o plantel. 

Não quero entrar aqui em grandes melancolias, mas há jogos que são difíceis de ganhar e outros que são mesmo para ganhar. Temos que ganhar os que nos competem ganhar e não ficar psicologicamente afetados com as derrotas. 

São esperadas as chegadas de alguns reforços ao clube?

São, como é óbvio. Estamos a selecionar novos reforços que possam colmatar algumas fraquezas em termos de plantel que temos atualmente. Não é possível sequer pensar, fazer um campeonato na divisão de honra, sem trazer alguns reforços. Apesar de termos excelentes jovens da formação que podem entrar, este é um campeonato muito mais duro, competitivo, em que jogamos um nível muito avançado e onde é preciso muita experiência e complexão física que nos permita aguentar vários meses de jogos, a um ritmo e uma intensidade que não estamos habituados. 

Há pouco referiu que os apoios não são muitos e que o clube tem caminhado por si próprio. Gostava, no entanto, que existissem mais apoios ao clube, nomeadamente por parte da autarquia de Santarém?

Eu acho que chegou o momento de a autarquia de Santarém reconhecer que deve discriminar positivamente o mérito desportivo, em especial a quem atinge este patamar de competitividade e chegou ao topo nacional. Nós estamos muito esperançados que a autarquia dê esse passo, neste momento. Aliás, o presidente do Município, tem conversado com o RCS sobre possíveis apoios e essa regulamentar essa discriminação positiva. O presidente da autarquia sabe quais é que são os apoios financeiros, por exemplo, das outras autarquias que têm os clubes nas divisões maiores, assim como os apoios atribuídos ao rugby noutras cidades de norte a sul do país.

Acredito que a autarquia vai olhar para esta situação do rugby de Santarém também como uma oportunidade de mudar aquilo que é o apoio aos clubes que mais se evidenciam e, acima de tudo, ajudar a dar condições aos clubes desportivos que têm alta competição que possam levar o nome de Santarém bem mais longe. É muito difícil, atualmente, para grande parte do tecido industrial do concelho, dar sozinho esse apoio financeiro. Existe uma grande dificuldade de as empresas apoiarem o desporto em Santarém.

Acha que é com esta conquista que vai despoletar esse investimento?

Eu acho que sim. É uma oportunidade para todos. Porque até agora víamos os apoios, e muito bem, direcionados para a formação e pratica regular desportiva. Mas olhando para o mundo que nos rodeia rapidamente percebemos que os Municípios mais competitivos desportivamente e com mais modalidades a disputar campeonatos de divisões maiores têm muito financiamento atribuído pelos Municípios e, com esse exemplo, conseguem alavancar também mais apoio privado.

Nós no rugby, por exemplo, temos, pelo menos, quatro ou cinco escalões que disputam campeonatos nacionais e não é igual, jogarmos competições distritais ou regionais comparativamente com uma equipa que tem de se deslocar ao Porto, a Arcos de Valdevez, a Loulé, a Évora, a Montemor, a Coimbra …. Isto parece que não, mas em termos de transportes é um custo enorme para os clubes. Mas o retorno de imagem de Santarém também é maior. Levamos o nome de Santarém a todo o lado.

A cidade de Santarém, tem uma equipa de uma modalidade no escalão maior. E isso é uma oportunidade também para Santarém estar nos grandes palcos desportivos. Tudo isto é uma novidade para todos nós. Tem de ser vista de uma forma extraordinária e muito positiva. Há aqui um dado novo, ao qual teremos de saber responder. Tenho a certeza que o Município está a ver com bons olhos tudo isto e dará a resposta merecida ao desporto de competição em Santarém.

Que tipo de benefícios a construção do novo campo vai trazer ao clube?

O nosso campo tem cerca de 10 anos. É um clube que faz 30 anos, mas que só joga num campo próprio há cerca de 11 anos. E isso realmente teve um efeito decisivo naquilo que foi também a chegada a esta divisão de honra. É termos um campo próprio, local regular de treino e um sitio onde os nossos jogadores sintam a sua casa. Efetivamente, durante muitos anos, tivemos um campo e não tínhamos balneários. Agora temos uns contentores que têm servido de balneários e que também fazem a diferença. A partir do momento que os jogadores podem tomar banho no fim dos treinos e se podem equipar lá, tudo isso faz a diferença para chegarmos a patamares maiores. 

E nesse sentido, aquilo que serão as novas infraestruturas do Rugby Clube de Santarém vão certamente, sem qualquer margem de dúvida, incrementar e melhorar aquilo que é o rugby em Santarém. Ter locais de treino onde os atletas possam ter ginásio, as facilidades que permitem à equipa treinar com as melhores práticas de uma forma regular faz a diferença. Tudo isso vai influenciar positivamente os atletas. Para além disso, melhores instalações também vão atrair mais atletas, pais e adeptos. Estamos a contar para o ano que existam mais atletas em Santarém e que nós possamos realmente dar aqui um salto também significativo, naquilo que é o impacto do rugby de Santarém no desporto do concelho. 

A maioria dos atletas do clube são jovens, sendo que muitos deles ainda estudam. Quais são os valores que o clube tenta transmitir-lhes?

Todos os atletas ou estudam ou trabalham. Todos abdicam de uma parte do tempo da vida deles para dar ao clube. Isso é algo que está nos nossos valore. Somos assim e não queremos deixar de ser.. Isto é um clube que vive muito de toda a sua família, dessa união entre todos.

O rugby tem valores muito vincados. Nós temos sempre muito respeito pelos adversários, humildade quando ganhamos e congratular os outros quando perdemos. Quando perdemos aprendemos sempre uma lição e temos de aceitar a derrota e corrigir o que está mal. Um jogador de rugby sabe respeitar todas as pessoas que integram o jogo, seja o árbitro, o público e os adversários.

A lealdade, a integridade são parte integrante de cada jogador. Qualquer jogador de rugby tem de ser integro dentro e fora de campo. Aqueles que entram em campo tem de ser um exemplo dos princípios e os valores que norteiam o clube. Têm de ser um exemplo para os mais novos. 

Nós vivemos isto como uma forma de estar na vida, uma família que vive e respira rugby. Quem entra para ser atleta no RCS passa, rapidamente, a ter mais de 200 amigos que o vão acompanhar pela vida. A inclusão também faz parte daquilo que são os nossos valores.

Com o atual sucesso do clube, acha que estes bons resultados vão abrir portas às restantes modalidades da cidade? 

Eu espero mesmo que sim. Infelizmente, neste momento, somos só nós neste patamar, mas se houvesse mais clubes que tivessem tido a oportunidade de estar no escalão maior, por exemplo, toda esta questão dos apoios para a alta competição já estava resolvida. O RCS estará sempre disponível para qualquer tipo de colaboração que possa trazer mais competitividade ao desposto em Santarém. Seria para nós um orgulho podermos partilhar com outras modalidades e clubes estes patamares de competição. Quantos mais clubes apostarem na competição mais se desenvolve o desporto no Município de Santarém.

Esse desenvolvimento vai beneficiar o rugby e todas as outras modalidades. Se começarmos a ser todos mais competitivos, também os empresários também ficam mais despertos para apoiar o desporto. 

Que mensagem gostaria de deixar aos jogadores, equipa técnica, sócios e adeptos que tornaram possível este momento histórico?

A mensagem principal é para a família do RCS: estas conquistas são deles, são de todo o clube. Temos de as saber viver, com a euforia e a ponderação devida. Com euforia porque é um feito inédito e deve ser celebrado. Gostamos de ganhar e foi algo único. Mas é também temo de viver o momento com a ponderação de que agora temos nas mãos uma nova fase, bem difícil e que a temos de encarar com grande dignidade, carácter e humildade, para honrarmos o nome do RCS e de Santarém.

Nós não contruímos isto sozinhos. Construímos isto porque houve um conjunto de pessoas e de entidades que nos apoiaram. Todos juntos contribuíram um bocadinho para este sucesso coletivo. Teremos sempre na cabeça quês isto é uma vitória de todos e ter a capacidade de perceber que no rugby só ganhamos, como desporto coletivo, com todos. 

O Rugby Clube de Santarém só continuará a crescer se continuarmos a ter adeptos, pais, atletas, dirigentes, treinadores, com este espírito de que somos uma família, uma grande família com o mesmo objetivo.

Aproveitar esta oportunidade, este exemplo, para mostrar nas camadas mais jovens, de formação dizer que estar a jogar em Santarém não é impeditivo de estar na divisão de honra, que jogar no Rugby Clube de Santarém não é impeditivo de se ir a uma seleção nacional, que jogar no Rugby Clube de Santarém é estar neste momento, entre os melhores. Que acreditem sempre que com treino, sacrifício e muita vontade estaremos onde estão os melhores. Só não conseguimos, se não acreditarmos, se não trabalharmos para isso. Tudo é possível e o exemplo que demos foi isso. Atingimos um sonho e atingimo-lo porque trabalhámos para isso, porque acreditámos sempre e porque fomos uma grande família”.

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