Entrevista publicada originalmente na edição impressa de 14 de Maio.
A tradicional Semana da Ascensão, ponto alto das comemorações da vila da Chamusca, está este ano a decorrer apenas em espaços fechados com controlo de entradas, não se realizando eventos de rua.
Embora num formato reduzido e com número limitado de espectadores, a Semana da Ascensão está de regresso à Chamusca até 16 de Maio, com a Praça de Toiros a receber duas corridas e o cineteatro a acolher os concertos musicais, limitados a 130 pessoas.
Se em 2020 a principal festa da Chamusca se ficou pela celebração digital, devido à pandemia da covid-19, este ano o município optou por uma solução mista para não comprometer a permanência do concelho fora das zonas de risco, já que um retrocesso no desconfinamento teria impactos para as pessoas e a economia local, como refere o presidente da Câmara, Paulo Queimado, nesta entrevista ao Correio do Ribatejo onde fala da sua visão para o futuro do concelho.
Em que moldes vai este ano decorrer a Ascensão e que momentos destaca?
No ano passado, mantivemos as comemorações, mas num formato exclusivamente online. Este ano, já temos a possibilidade de usar salas de espectáculos e vamos fazer a Ascensão em regime misto, com actividades onde podemos ter o controlo do número de acessos. Escolhemos o cineteatro como sala de espectáculos para ter aqui músicos como João Chora ou José Cid (dia 16), entre outros. A Ascensão tem um forte cariz religioso e, por isso, vamos ter a missa campal e a tradicional Bênção dos Dons da Terra e dos Animais, este ano ao ar livre, com uma paisagem maravilhosa do Tejo, como pano de fundo.
Temos prevista a inauguração de uma escultura da autoria de Rui Fernandes, junto da Praça de Toiros, cujo intuito é valorizar a imagem do toiro bravo. A criação de gado bravo teve sempre uma importância enorme no concelho e queremos dar relevo a isso mesmo.
Para além do formato presencial, teremos uma forte vertente on-line, através do Youtube e Facebook, onde vamos reviver as edições anteriores das festas. Sob o ponto de vista económico é mais um ano sem este balão de oxigénio para a economia local. Contudo, este é o formato possível, onde o princípio é o da precaução, sendo que este certame serve também para mostrar o melhor que se faz no concelho.
Há aqui este papel muito importante no sentido comunitário da partilha durante estas festas. Mesmo em pandemia, tivemos o nosso alojamento local, e turismo rural com ocupação acima dos 90%, as pessoas também vinham para descansar, descontrair, partilhar com a família… Nesta fase queremos promover isso mesmo e deixar a mensagem: venha até ao concelho da Chamusca, nós temos os produtos, os recursos endógenos, temos actividades, desde um passeio de barco no Tejo até ver uma ganadaria, uma panóplia de actividades para descobrir, não só na Ascensão, mas todo o ano.
O Turismo é uma das apostas da Chamusca?
O Turismo é, sem dúvida, uma das grandes apostas. A Chamusca tem um enorme potencial turístico, em particular a Aldeia do Arripiado, não só pela beleza natural, mas porque já ali temos algumas infra-estruturas interessentes e que podem ser potenciadas.
Que estratégia quer implementar para promover o desenvolvimento económico do concelho e quais são as grandes linhas de aplicação do orçamento deste ano?
O nosso Plano de Acção Estratégico está muito ligado com o empreendedorismo e a criação de postos de trabalho. O município tinha uma situação complicada, algumas dívidas, estávamos com o PAEL e o que foi feito foi uma gestão muito rigorosa das contas do município.
Conseguimos, naquilo que estava perspectivado a 12 anos, fazer um reequilíbrio financeiro em três. Isto, logicamente, tendo sempre em consideração o Plano de Investimentos. Mas, o que este executivo determinou, desde o primeiro momento, foi trabalhar para as pessoas e, portanto, o cimento, o betão e o alcatrão ficaram para segundo plano.
Os investimentos realizados tiveram sempre na perspectiva do quadro comunitário em vigor e em linha com as necessidades e o programa que tínhamos apresentado à população. Este é um orçamento muito realista – só de receitas próprias são cerca de 10 ME – e temos projectos que são fulcrais: englobam a regeneração urbana, uma intervenção de fundo a nível do abastecimento de água, saneamento, e uma outra onde a questão das infra-estruturas, comunicações, electricidade vão ser reformuladas.
Temos também requalificação da escola sede, com um valor previsto de cerca de 4,5ME, e mais uma série de projectos para além dos que foram já executados neste último mandato.
Há um grande número de projectos que estão a andar e que fazem com que o orçamento tivesse passado quase para o dobro das verbas habituais.
Que mensagem pretende o executivo transmitir ao município com essas escolhas?
Temos um grande eixo prioritário de intervenção, que é a questão da educação: requalificamos todas as escolas e jardins de infância do concelho, fizemos um Centro Escolar, que era um projecto que estava pensado há mais de oito anos e que nunca teve condições para sair do papel. Só estava financiado a 55%, conseguimos chegar aos 85%, com um reforço de 600 mil euros para esta obra. Para nós, a questão da educação é estratégica e muito importante. As crianças são o futuro e temos que lhes dar todas as condições.
Somos o concelho, a nível nacional, que tem mais financiamento per capita para todos estes projectos. Desde os workshops, à questão do empreendedorismo e à fábrica do empreendedor. O que nos move é trabalhar para as pessoas e o objectivo é mesmo esse: trabalhar para e com as pessoas, no sentido de lhes dar ferramentas para o futuro.
Agora que estamos num processo de Censos, e vamos vendo que os territórios do interior estão a perder cada vez mais gente, precisamos de criar condições para que, quem cá está, tenha as melhores condições de vida possível e que as pessoas percebam que aqui é um bom território para viver. Quando falamos na questão da coesão territorial, do repovoamento do interior, como é que se conseguem dar estas respostas, para que as pessoas se sintam bem e tenham qualidade de vida, queiram investir, criar aqui os seus filhos. É nisso que temos trabalhado.
O impacto económico da pandemia foi certamente notado nas empresas e nas famílias. Que medidas foram implementadas pelo Município para acorrer às diferentes situações e para minimizar os prejuízos e as dificuldades sentidas?
O último ano foi atípico para toda a gente. Trabalhamos com os parceiros da rede, desde IPSS, escolas e Segurança Social para dar respostas. A nossa prioridade foi saber se as pessoas que não tinham estas respostas sociais directas estavam acompanhadas de alguma forma. Temos cinco universidades sénior no concelho, com nove polos a funcionar. Centenas de pessoas que tinham este acompanhamento diário e ficaram aqui um pouco a descoberto.
Foi feito um trabalho excepcional pelos técnicos, que acompanharam de perto todas estas situações e foram ter com elas para aferir as necessidades. Tínhamos agregados inteiros em isolamento que necessitaram, por exemplo, de acompanhamento para testagem.
Lançámos dois programas de apoio, um para as famílias que tivessem mais de 25% de perda de rendimentos e, por outro lado, temos a parte dos comerciantes e dos negócios que tiveram de encerrar por via do estado de emergência.
Na questão das rendas, quem tinha estabelecimentos arrendados continuava a pagar, havia electricidade e outros encargos fixos e a nossa grande preocupação foi o de ajudar a manter postos de trabalho. Demos aqui o apoio em 75% daquilo que eram esses encargos e com os ordenados. Tivemos 77 candidaturas numa primeira fase.
Fomos notando, depois, algumas dificuldades de alguns empresários em garantir o pagamento dos encargos sociais. Com dificuldade em recorrer aos apoios do estado. Assim, demos apoio para conseguir colmatar essas dificuldades, garantir postos de trabalho para que, nesta fase de reabertura, terem uma almofada financeira. Apesar das dificuldades, acho que estão todos de parabéns pela capacidade de resistência e resiliência demonstrada. Já investimos cerca de 165 mil euros em apoios directos ao comércio local.
Um problema que se arrasta há décadas tem a ver com as acessibilidades. Como é que interpreta o facto de a construção de uma nova travessia sobre o Tejo, assim como do IC3 terem ficado de fora do PNI?
Quando se fala de coesão territorial, consideramos que há aqui um elemento chave para garantir esta mesma coesão e desenvolvimento territorial. Para além de termos estas duas acessibilidades a Norte do Tejo, a A1 e a A3, a Sul do Tejo falta a ligação entre Almeirim e Vila Nova da Barquinha.
Tenho defendido, por isso, a reclassificação da importância dos projectos de prolongamento do IC3 para perfil de auto-estrada A23, com a construção de uma entre Almeirim e Vila Nova da Barquinha, e que inclui um novo atravessamento do rio Tejo, nomeadamente com uma nova obra de arte e viaduto a atravessar a zona dos campos de Chamusca e Golegã.
Este é um projecto nacional e que deve ser prioritário pela importância que esta nova ligação rodoviária para facilitar o acesso ao parque industrial do concelho e para a vida de muitos munícipes e visitantes que diariamente têm de atravessar a Ponte Joaquim Isidro dos Reis, onde não se conseguem cruzar dois veículos pesados.
A Chamusca precisa de uma ponte que resolva todos os nossos problemas de travessia nesta zona. Há necessidade de haver rapidez nos transportes, até para reduzir custos e temos também a questão ambiental. Temos toda a fileira da agricultura, que mudou drasticamente nos últimos 10 anos e que precisa de rapidez de escoamento. Todo o processo é, hoje, organizado de forma a ser o mais rápido possível, mas há os constrangimentos do transporte.
Quando pensamos o que é necessário fazer para captar investimento, novas oportunidades de negócio, temos a capacidade de responder, temos um eco parque que responde às necessidades de todo o país, e não só. Depois querem falar de coesão, mas eu pergunto onde é que ela anda… Se formos ver, os concelhos da Lezíria, tirando Chamusca, Alpiarça e Golegã têm uma auto-estrada a passar à porta e a desembocar numa zona industrial… Como é que se pode competir com isto? As oportunidades não são iguais para todos. Por muito que eu diga que este é o melhor concelho para investir, e baixamos as taxas e damos benefícios, etc., qualquer empresário que queira investir 10 ou 15 ME consegue poupar aqui em impostos 5 ou 8% por ano, mas, depois, faz as contas aos encargos que tem em transporte e acaba por não valer a pena.
Ficou desapontado com o facto de estas obras não constarem no PNI2030?
Fiquei desiludido, por um lado, e também muito preocupado. Na questão do eco parque, sobretudo, porque tem uma carga no sistema grande: estamos aqui a resolver um problema nacional de resíduos hospitalares, industriais, etc., agora até o fibrocimento… estamos a resolver, repito, problemas nacionais. E a minha questão é. “porque é que o País não resolve o problema que não é da Chamusca, é de todos?”. Se queremos falar em coesão, em oportunidades iguais de desenvolvimento, temos que repensar isto tudo.
Que balanço faz dos seus dois mandatos? Que bandeira deixa?
Tudo o que é feito a nível de desenvolvimento é com o objectivo de dar melhor qualidade de vida ás pessoas. Tivemos aqui algum receio, durante dois ou três anos, de falar da questão da felicidade. Mas no centro do nosso plano de acção está, efectivamente, a felicidade das pessoas. Uma pessoa para ser feliz precisa de ter um bom sistema de ensino, saúde, segurança, qualidade de vida, bons recursos, cultura, prática de desporto… e nós temos tudo isso.
Há países que já têm um Ministério da Felicidade, não é uma novidade absoluta. Mas esta é uma questão que se consegue medir: quando as pessoas são mais felizes e se sentem bem, têm mais o sentido de comunidade. Na pandemia pensámos que o sentido de entreajuda ia aparecer de uma forma mais vincada, mas o que é certo é que há muito isolamento. Perdeu-se um pouco o sentido de comunidade. O centro da nossa estratégia é a felicidade e tudo o que lhe está associado. Não temos medo de ser incubadora de projectos e ideias e temos a felicidade de ter parceiros que não têm medo de arriscar. Não o fazemos só para nós, se funcionar aqui, poderá funcionar noutros lados.
Como costumo dizer, quando fazemos uma estrada ou um muro, depois de feito e inaugurado está sempre a desvalorizar, neste caso, de trabalhar com e para as pessoas, é o contrário.
Qual é o seu grande desígnio caso ganhe as próximas eleições? Acha que a população lhe dará novo voto de confiança?
Há quem goste da forma como trabalhamos e outros preferiam que fossem feitas outras coisas, há quem queira um muro em frente a casa… são maneiras diferentes de trabalhar. Aqui, trabalhamos no sentido de que se é para um é para todos, na escola-sede havia actividades e nas outras não havia porque era longe…. Mas se é para fazer numa, faz-se para todas. Este é o nosso princípio. As pessoas reconhecem este trabalho e espero que, quando forem decidir quem querem a gerir o município, possam contar comigo.
Filipe Mendes