Rodrigo Castelo, o chef ribatejano que recentemente conquistou uma Estrela Michelin com o restaurante ‘Ó Balcão’, será este ano distinguido com a Medalha de Ouro da Cidade de Santarém, a mais alta condecoração municipal, durante o Festival Nacional de Gastronomia. Em entrevista ao Correio do Ribatejo, Rodrigo, 44 anos, expressa a sua profunda ligação à terra que o viu nascer e o orgulho que sente por levar a gastronomia ribatejana ao mais alto patamar. Além de reflectir sobre o impacto deste reconhecimento e da Estrela Michelin no seu percurso, o chef – que até nem gosta do epíteto e prefere o termo ‘Cozinheiro’ – revela a sua visão para o futuro da cozinha regional, que passa pela sustentabilidade e pela promoção dos produtos locais. Com o Ribatejo sempre no coração, Rodrigo Castelo continua a trilhar um caminho que equilibra tradição e inovação, mantendo-se fiel às suas raízes e comprometido com a excelência.
Rodrigo Castelo, natural de Santarém, é hoje uma das maiores referências da cozinha ribatejana e nacional. O seu percurso, marcado pela paixão pela sua terra e pelo respeito profundo pelos produtos locais, culminou em 2024 com a conquista de uma Estrela Michelin para o restaurante Ó Balcão. Esta distinção foi o reconhecimento de um trabalho dedicado à valorização da gastronomia regional e da inovação culinária. Mas o caminho de Rodrigo começou longe da restauração e, por isso, a sua história é também feita de resiliência e determinação.
Nascido em 1980, Rodrigo Castelo cresceu no seio de uma família onde a comida tinha um papel central. Foi o pai quem lhe incutiu o gosto pela cozinha e o respeito pelos produtos da terra. O seu percurso profissional começou na indústria farmacêutica. Depois, seguiu a paixão pela cozinha e frequentou o curso de Engenharia de Produção Animal na Escola Superior Agrária de Santarém. Foi aí que aprendeu muitas das técnicas de salmoura, cura, fumados, pickles e escabeches que emprega para extrair a melhor textura e sabor dos produtos ribatejanos, utilizados em receitas, muitas delas, ligadas a memórias de infância e de família. Foi então que decidiu concretizar um sonho antigo e, em 2013, inaugurou o Taberna Ó Balcão em Santarém, hoje rebaptizado como apenas ‘Ó Balcão’.
Este restaurante, situado num antigo edifício onde antes funcionava uma taberna, rapidamente se destacou na cena gastronómica pela forma como Rodrigo recuperava receitas tradicionais e transformava os produtos da região, em particular o peixe de rio, com uma abordagem inovadora e criativa. Ao longo dos anos, o Ó Balcão foi crescendo e ganhando notoriedade, tanto pelo trabalho técnico apurado do chef, como pela sua ligação inabalável ao Ribatejo.
A conquista da Estrela Michelin
Em Fevereiro de 2024, o trabalho de Rodrigo Castelo foi finalmente reconhecido e elevado ao estrelato, com a atribuição de uma Estrela Michelin ao Ó Balcão. Esta distinção, há muito ambicionada pelo chef, é a prova da excelência e da qualidade da cozinha que ele tem vindo a desenvolver.
“É um percurso feito de forma natural, mas com muita ambição”, afirmou Rodrigo. “Sempre procurei ser um bocadinho melhor todos os dias. Sou o resultado das vivências que tive, das pessoas com quem me cruzei e daquilo que aprendi, tanto dentro como fora da restauração”, acrescentou em entrevista ao Correio do Ribatejo.
Para Rodrigo Castelo, a Estrela Michelin é o reconhecimento de um trabalho de anos, mas é também uma prova de que a cozinha ribatejana tem espaço no panorama da alta gastronomia. “Ter a oportunidade de mostrar o que de melhor temos na nossa região e ver esse trabalho reconhecido é um grande orgulho”, partilhou o chef, visivelmente emocionado. O impacto desta distinção foi imenso, trazendo novos clientes ao restaurante e reforçando o estatuto de Rodrigo como um dos principais chefs de Portugal.
A importância da equipa e dos produtos locais
Apesar do foco natural na figura do chef, Rodrigo faz questão de destacar o papel fundamental da sua equipa no sucesso do projecto. “O sucesso do Ó Balcão é o resultado do trabalho de todos nós. Eu e a minha mulher, Ana, idealizámos este projecto juntos, e ao longo dos anos fomos construindo algo que sentimos que faltava em Santarém”, explicou. Desde a sua abertura, o restaurante tem evoluído constantemente, não só na qualidade dos pratos, mas também na forma como promove e valoriza os sabores do Ribatejo.
Rodrigo Castelo é um defensor acérrimo dos produtos locais e da sustentabilidade, algo que foi também reconhecido com a atribuição da Estrela Verde Michelin, que distingue os restaurantes pelas suas práticas ecológicas. Para o chef, a sustentabilidade é mais do que uma tendência – é uma prioridade. O uso de peixes predadores do rio, por exemplo, é uma das formas inovadoras que encontrou para promover a sustentabilidade na sua cozinha. “Estamos, também, no coração da agricultura, e a cozinha começa na agricultura. Tenho o privilégio de estar rodeado por produtos fantásticos, e é isso que faz com que a nossa cozinha tenha tanta personalidade”, afirmou.
A ligação à terra e a cozinha de ‘quilómetro zero’
A identidade ribatejana está no centro de tudo o que Rodrigo faz na cozinha. O chef considera que a sua cozinha é uma extensão de quem ele é, e do que viveu ao longo dos anos. “Nós somos ribatejanos, e a nossa cozinha reflecte isso. Faz todo o sentido cozinhar o que somos e onde estamos”, afirmou ao nosso jornal. Este princípio orientador está presente em cada prato servido no Ó Balcão, onde Rodrigo procura usar produtos de ‘quilómetro zero’, aproveitando ao máximo os recursos disponíveis na região.
Para o chef, ‘cozinhar o Ribatejo’ é uma forma de honrar a sua terra e de partilhar com os clientes a intensidade dos sabores que o definem. “Quando cozinhamos aquilo que somos, chegamos ao cliente com outra intensidade”, explicou. A ligação de Rodrigo à sua terra e às suas raízes é um dos principais factores que diferenciam o seu trabalho e que conferem aos seus pratos uma personalidade única.
O Festival Nacional de Gastronomia: uma plataforma para o Ribatejo
Rodrigo Castelo tem sido um dos maiores promotores da gastronomia ribatejana, não só através do seu trabalho no restaurante, mas também pelo seu envolvimento em eventos de grande destaque. Um desses eventos é, precisamente, o Festival Nacional de Gastronomia de Santarém, onde Rodrigo tem desempenhado o papel de embaixador nos últimos anos. Para ele, o festival é uma plataforma fundamental para a promoção dos sabores e dos produtos do Ribatejo, e a sua importância vai muito além das fronteiras da cidade. “O festival é uma oportunidade para mostrar ao país e ao mundo o que de melhor temos na nossa gastronomia”, afirmou.
Ao longo dos anos, o festival tem evoluído, e Rodrigo tem estado envolvido activamente no seu desenvolvimento. “Todos os anos tentamos fazer um bocadinho melhor do que no ano anterior, sempre em prol do festival e dos visitantes”, explicou o chef. A sua dedicação ao evento reflecte-se não só na sua presença como chef, mas também no seu envolvimento na organização e na forma como procura inovar a cada edição.
Rodrigo não tem dúvidas que, hoje, a cozinha tradicional portuguesa está a passar por um grande momento: “cada vez mais, os chefs estão a voltar às raízes, a estudar as receitas dos nossos antepassados. Isso está a ser muito valorizado, o que é ótimo. E os festivais de gastronomia desempenham um papel importante nessa promoção”, transmitiu ao Correio do Ribatejo.
Medalha de Ouro da Cidade de Santarém
Este ano, o Festival Nacional de Gastronomia de Santarém será particularmente especial para Rodrigo Castelo, uma vez que será agraciado com a Medalha de Ouro da Cidade de Santarém. Esta distinção, entregue pela Câmara Municipal, reconhece o contributo de Rodrigo para a valorização da gastronomia local e o seu papel na promoção dos produtos da região. Para o chef, este prémio é motivo de grande orgulho. “Santarém é a minha cidade, e é um privilégio enorme ser reconhecido desta forma”, partilhou, emocionado.
Rodrigo vive intensamente a sua cidade e a região do Ribatejo, e essa paixão reflecte-se não só na sua cozinha, mas também no impacto que tem tido na comunidade. A Medalha de Ouro é, por isso, uma prova de que o trabalho desenvolvido ao longo dos anos tem feito a diferença. “Eu vivo Santarém com muita intensidade, e este reconhecimento é uma validação de que estamos no caminho certo”, afirmou o chef, que nos confidenciou que um dos seus grandes sonhos é ver o seu clube do coração, a União Desportiva de Santarém, chegar à primeira Liga.
Rodrigo Castelo não esconde, igualmente, a importância da sua família e do tempo que gostaria de dedicar-lhes. “O meu objectivo pessoal é ter muito mais tempo para a minha família e para os meus amigos. O tempo é muito pouco, o tempo é o bem mais precioso da nossa vida e o que quero é ter tempo para a minha mulher e filhos, mãe, irmã, cunhado e sobrinhos”, confessou o chef, reconhecendo que a vida agitada da restauração muitas vezes o afasta daqueles que mais ama. Entre os seus desejos futuros, está o de equilibrar melhor a sua vida profissional com o tempo dedicado à família mais próxima, destacando que esse é um dos seus maiores objectivos pessoais.
Um futuro cheio de projectos e ambições
Apesar do sucesso e das distinções já alcançadas, Rodrigo Castelo não se dá por satisfeito. O chef tem muitos projectos em mente para o futuro, embora prefira não revelar todos os detalhes. “Sou um pouco supersticioso, por isso prefiro não falar muito dos meus planos. Mas posso garantir que há muitas coisas boas a caminho”, confidenciou. Entre os seus principais objectivos está, claro, manter a Estrela Michelin, algo que considera uma grande responsabilidade. “Manter a Estrela é uma responsabilidade enorme, mas estamos sempre a trabalhar para sermos melhores”, afirmou.
Rodrigo Castelo também tem planos para continuar a inovar na sua cozinha, sempre com o Ribatejo no centro das suas criações. Para o chef, a sustentabilidade e a valorização dos produtos locais continuarão a ser pilares do seu trabalho. “A sustentabilidade faz parte do ADN da nossa cozinha, e acredito que é o caminho certo para o futuro da gastronomia”, explicou.
O Ribatejo no coração e na cozinha
Ao longo dos anos, Rodrigo Castelo tem provado que a cozinha é muito mais do que a simples preparação de pratos. Para ele, a cozinha é uma forma de expressar a sua identidade e de partilhar com os outros as histórias e os sabores da sua terra. “Cozinhar é a minha forma de honrar o Ribatejo”, afirmou. E é essa dedicação à terra e às suas raízes que faz com que os pratos de Rodrigo tenham uma alma e uma personalidade únicas.
Com a conquista da Estrela Michelin, Rodrigo Castelo cimentou o seu lugar entre os grandes nomes da gastronomia portuguesa. No entanto, o chef continua a ver o seu trabalho como um processo em constante evolução, sempre em busca de novas formas de surpreender e de elevar a cozinha ribatejana. “O sucesso nunca é garantido. Temos de continuar a trabalhar e a inovar, e é isso que me motiva todos os dias”, concluiu.
Quando lhe perguntámos que escolhesse um prato que resumisse o seu trabalho, Rodrigo respondeu que seria algo que representasse a essência do Ribatejo: “uma paisagem com animais à beira do Tejo, como um javali, um touro bravo, patos a voar e peixes a saltar no rio. É isso que eu cozinho – a essência do Ribatejo, a lezíria, o Tejo e os produtos da nossa terra”.
Rodrigo Castelo é, sem dúvida, um exemplo de como a paixão pela terra e a dedicação ao ofício podem transformar uma vida. Com o Ribatejo no coração e a ambição de elevar a gastronomia portuguesa, o chef continuará a brilhar no cenário nacional e internacional, sempre fiel às suas raízes e à sua visão de uma cozinha que combina tradição e inovação: “o mais importante é nunca deixarmos de acreditar nos nossos sonhos e é fundamental trilhar um caminho próprio. Quando seguimos as nossas convicções, conseguimos construir uma identidade única”, concluiu.
Filipe Miguel Mendes