A Escola Superior de Saúde de Santarém (ESSS) assinala, hoje, o seu 46.º aniversário ao serviço da comunidade e do ensino superior na formação de enfermeiros e profissionais especializados.

A esse propósito, o Correio do Ribatejo entrevistou a actual directora da Escola, Isabel Barroso, que nos fez o enquadramento da estratégia da instituição, que faz com que a ESSS seja uma das escolas de ensino de enfermagem com melhor empregabilidade a nível nacional.Fazer a diferença pela qualidade”, tem sido o lema do ensino ministrado na ESSS, a única no País a disponibilizar um ‘Master Mundus’, uma formação “altamente especializada” em Enfermagem de Emergência e Cuidados Críticos, numa parceria com a Escola Superior de Saúde da Universidade do Algarve, a Universidade de Oviedo (Espanha) e a Universidade de Metropolia (Finlândia). Isabel Barroso está há uma década na direcção desta Escola e prepara-se, este ano, para passar o testemunho da presidência.

A Escola Superior de Saúde de Santarém é a escolas de ensino de enfermagem com melhor empregabilidade a nível nacional. O que distingue esta Escola das suas congéneres? Existem vários factores que fazem com que esta escola seja o que é hoje. Não dependeu só de mim. Dependeu também do trabalho feito anteriormente: estamos a falar, concretamente, da chamada ‘Nova Era’ no ensino superior que, desde finais da década de 80 – ainda com a professora Lurdes Asseiro e depois com o professor Amendoeira e que eu dei continuidade – é desenvolvido um trabalho muito próximo dos alunos. A nível regional, os nossos estudantes são preferidos. A ESSS continua a ser uma Escola que privilegia a proximidade entre Docentes e Estudantes. Eu defendo que temos de conhecer as pessoas. E, por isso, faço muitas reuniões que visam precisamente isso: eu conheço todos os dirigentes dos serviços de saúde. E há uma confiança grande que se estabelece. Os próprios dirigentes, quando precisam, solicitam-nos para que indiquemos quem são as pessoas que possam integrar determinado serviço. Nesta Escola, primamos por um ensino de qualidade e de proximidade. Há um acompanhamento dos alunos em todo o ensino, quer teórico quer ensino clínico. São os professores da escola que acompanham os alunos nos contextos da prática. A diversidade de locais onde os alunos vão fazer o ensino clínico é também uma mais-valia, continuamos a conseguir que os alunos tenham um desenvolvimento ao longo do curso com uma diversidade muito grande de experiências. Depois, temos a questão da internacionalização: uma aposta – e aí posso dizer que foi uma aposta grande que fiz – quer em relação aos estudantes quer em relação aos professores. Temos vários projectos internacionais neste momento, muitos protocolos com vários países da Europa e América Latina e, neste momento, estamos a começar a expandir para África também. Estamos a receber e temos um protocolo com uma rede académica na área da saúde de países de expressão portuguesa que se iniciou há um ano. Também tem sido nossa preocupação o desenvolvimento da investigação. Estamos com projectos financiados. Todos estes factores, creio, fazem com que a procura por esta Escola tenha vindo a aumentar. Neste momento entre Licenciatura, Mestrado e Pós-Licenciatura temos cerca de 500 alunos.

Quais são os projectos principais que estão a ser desenvolvidos? Neste momento, temos um projecto que vai ter o seu auge precisamente no Dia da Escola (16 de Março). Queremos associar a efeméride ao congresso de Literacia em Saúde e, em particular o projecto YourPel, que foi financiado pela FCT e que, de alguma forma, nos traz grande prestígio em termos de desenvolvimento. O projecto é uma parceria com três Institutos Politécnicos: Santarém, Leiria e Viseu, Agrupamentos Escolares da Chamusca e Golegã e ACES Lezíria – Unidade de Cuidados na Comunidades Chamusca /Golegã, coordenado pelo IPSantarém, sendo a investigadora responsável a professora Doutora Hélia Dias e a Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Santarém a promotora. Trata-se de um projecto que visa “promover e empoderar” a população jovem para a literacia em saúde, nas áreas da alimentação saudável, sexualidade e consumos de tabaco e álcool, ao nível do 3º ciclo do ensino básico, monitorizando os determinantes de saúde e a efectividade das estratégias desenvolvidas com recurso às novas tecnologias, englobando redes sociais e uma plataforma digital. Outro aspecto que para nós é também crucial é o facto de sermos a única Escola de Enfermagem, pública ou privada, integrada em Politécnico ou Universidade, que possui um Master Mundus. Esta é a única formação do género que existe no País (em parceria com a Universidade do Algarve) na área da enfermagem. Trata-se de um projecto que se iniciou no meu primeiro mandato, e que se tem revelado essencial para a Escola, em termos de desenvolvimento e de interligação com Universidades dos cinco continentes. Os enfermeiros que vêm fazer esta formação pedem-nos ajuda, depois, para ajudarmos a montar serviços e apoiar no desenvolvimento de tecnologia nos países de onde são oriundos. Estamos a falar de países africanos e da Ásia, que necessitam de peritos nesta área da emergência. Já vamos na segunda edição desta formação e queríamos apostar num outro, na área da saúde. Temos também um projecto relacionado com a diversidade de formação no primeiro ciclo, em licenciatura, para alem da enfermagem. Estamos também num projecto com mais dois institutos para a criação de um grupo de trabalho que tem professores na área. Da nossa escola estão prof. Amendoeira e estão as duas presidentes do conselho pedagógico e técnico-científico: Teresa Coelho e Irene Santos, que estão a trabalhar com esse grupo em formações na área da saúde.

Quais são os principais desafios para o futuro da Escola? Os desafios são vários. Um deles, é o da interdisciplinaridade. Acredito que temos de caminhar para aí. Esta Escola não pode querer ser tudo. Existem, portanto, duas ou três áreas onde temos de apostar e nos estamos a tornar, de alguma forma, peritos. Uma delas é na área da Enfermagem Comunitária, outra é nas questões da Emergência/Urgência. Depois, temos de caminhar para formações na área da Saúde mas onde outras disciplinas possam ajudar, com o auxílio de professores que já estão afectos ao IPS. A outra grande questão passa pela internacionalização e pela exportação do nosso conhecimento. A grande aposta é, quanto a mim, em projectos de investigação e estamos a trabalhar muito na área daquilo que é a literacia da saúde: queremos tornar-nos junto com as instituições da região, num observatório regional na área dos indicadores de saúde. Estamos a trabalhar neste momento com a autarquia, com o hospital e com o ACES Lezíria nesse sentido. São projectos que eu enquanto professora também estou envolvida por isso estarei cá para ajudar a desenvolver essa área. Também podemos ser e estar junto da comunidade – eu tenho um sonho ainda não concretizado mas que gostaria de ajudar a desenvolver – que tem muito a ver com o facto de podermos ter alguma capacidade de estar mais perto da comunidade, poder prestar cuidados, ter um serviço desenvolvido pela escola com profissionais de saúde. Outra questão importante é a criação de um Centro de Simulação que seja regional, interligado com as instituições de saúde da região (ACES e Hospitais) no sentido de podermos desenvolver – e isto exige equipamento sofisticado e caro – esta área. Todas as pessoas que trabalham na área da emergência/urgência têm de fazer formação continuada. Nesse sentido, é que aparece este projecto para que possamos oferecer esta formação, quer aos nossos alunos, quer a profissionais. A intenção é que sejamos um centro de desenvolvimento não só de extensão à comunidade mas também para que possamos desenvolver investigação e transferi-la para outros países onde já temos várias parcerias consolidadas. Um projecto destes implica muito trabalho e também investimento. E está a ser desenvolvido em rede com o IPS. Por isso, a UMIS, que está integrada no Laboratório de Investigação de Desporto e Saúde está a trabalhar para dar uma outra escala.

Considera que a formação ao longo da vida é vital? Sem dúvida. E isso ainda é mais certo em enfermagem. Nós temos apostado nesse tipo de oferta formativa. A nossa formação pós-graduada é muito procurada, essencialmente por antigos alunos. Contudo, estamos a assistir a um fenómeno interessante, que é o da procura dos nossos cursos por parte de profissionais da zona Oeste. Eu creio que há uma passagem da palavra, em termos de reconhecimento da excelência do nosso ensino. Temos que estar à frente das grandes mudanças. Neste momento, a formação continuada é essencial: estamos em constante desenvolvimento e formação. Por isso, na Escola há que manter toda a formação pós-graduada no âmbito da enfermagem e apostar também em formações de curta duração que sejam creditáveis para formação mais longa e que esteja aberta não só aos enfermeiros mas também aos outros técnicos de saúde. Neste momento, estamos a trabalhar com a Escola de Gestão no curso de Gestão de Unidades de Saúde que está a ter um grande desenvolvimento e que é frequentado por médicos, enfermeiros, dirigentes de laboratório, entre outros profissionais que apostam na diversificação das áreas de conhecimento. Antigamente, trabalhávamos de uma forma isolada. Agora, isso alterou-se e estamos a tentar trabalhar em conjunto no sentido de conjugarmos energias. Vamos abrir também uma pós-graduação em Senologia, uma área ligada ao cancro da mama. Não existe neste momento nenhum curso desses em Portugal. Foi uma proposta também do Hospital e estamos a trabalhar em conjunto para que esse curso possa iniciar-se já no próximo ano e queremos que o curso evolua para um mestrado.

A carreia do profissional de enfermagem está a ser valorizada no País? Há uns anos atrás, havia uma carreira bem estruturada. Neste momento, as coisas estão diferentes. Claro que não voltamos atrás, mas tem que existir um reconhecimento diferente em termos de desenvolvimento académico dos enfermeiros. Ou seja, a valorização é diferente entre ter um mestrado e uma pós-licenciatura, devidamente estabelecida quer pela Ordem quer pelo Governo. Um reconhecimento académico que, depois, não é traduzido na profissão. Os serviços não podem funcionar sem ter os técnicos de saúde qualificados necessários. Eu acho que temos que formar para o mundo inteiro, um paradigma completamente diferente do que era há uns anos atrás. Muitos têm optado por sair do País porque a qualificação que têm, que é a melhor da Europa, e falo em termos globais, porque fomos pioneiros em relação às directivas europeias, faz com que sejam profissionais altamente qualificados. Eu julgo que muita da emigração se faz por uma questão de oportunidades. Por exemplo, o Hospital Universitário de Londres, que é nosso parceiro, absorve alguns dos nossos alunos que, em termos de desenvolvimento de carreira oferece outro tipo de condições. Inclusive, pagam a formação pós graduada, o que não acontece em Portugal. Isto para além de um pacote salarial atractivo e de um início de carreira mais constante.

Entrou na Escola em Janeiro de 1988. Que diferenças encontra desde essa altura e que evoluções aconteceram? Muitas diferenças. Quando entrei na Escola, havia 90 alunos e nove professores. Rapidamente, a formação em enfermagem duplicou, assim como o nível de exigência e qualidade. Faço também parte da primeira leva de alunos formada nesta Escola. Este edifício, que foi feito no final da década de 90 foi projectado para 240 alunos. Hoje, temos cerca de 500… Por isso é que eu defendo tanto a proximidade com os alunos. Houve, de facto, um grande desenvolvimento em termos de abertura para o mundo porque todos tivemos que fazer formação noutros contextos, noutras Universidades por isso esta abertura, principalmente a minha geração, a 2ª da Escola. Há outros recursos, os estudantes são diferentes, mas penso que, em termos essenciais, continuamos a manter a cultura da escola, integrando os alunos em todas as actividades, por isso nada se faz sem ser com os alunos. A grande questão é que evoluímos para melhor. Quando comecei a leccionar, havia uma questão diferente: eu tinha o saber e transmitia-o, sem grandes mudanças. Hoje, estamos numa época diferente. Os professores são actualmente facilitadores do desenvolvimento do próprio aluno. O conhecimento é provisório, não é definitivo. Por isso, devemos estar muito atentos a estas questões. As coisas não são estanques. Estamos sempre, no domínio científico, a testemunhar o surgimento de novas teorias e técnicas. A própria enfermagem é uma disciplina em constante evolução. Neste momento, somos uma Escola que preza por aquilo que desenvolve também ao nível da investigação na área. Antigamente, nós importávamos conhecimento. Neste momento, aquilo que ensinamos aos nossos alunos vem muito da investigação e do trabalho que é desenvolvido em Portugal. Nós conseguimos comparar-nos e podemos afirmar que estamos num patamar de desenvolvimento igual ou superior a outros países. Eu julgo que isto é um grande ganho que, na área da enfermagem, conseguimos alcançar.

Deu aulas, acompanhou estágios de alunos nas áreas da obstetrícia, psiquiatria, pediatria, serviços de medicina e centros de saúde. Estas experiências fizeram de si uma directora mais exigente, uma vez que conhece a realidade por dentro? Eu continuo a dar aulas. A partir das 5h00 da tarde, continuo a ser professora, orientando trabalhos de mestrado e pós-licenciatura e leccionando duas disciplinas. Mantive sempre o exercício da docência e isso faz com que também conheça melhor a realidade, porque estou próxima dos alunos e do seu desenvolvimento. Acima de tudo, sou professora. Estive este tempo todo (dez anos) como dirigente da Escola e os colegas têm reconhecido essa minha competência, mas, acima de tudo, sou professora. Também estive sempre ligada aos projectos de investigação e desenvolvimento.

Que balanço faz destes dez anos em que esteve a frente da Escola? Uma coisa é o trabalho docente, e eu já estou no topo da carreira, sou professora-coordenadora, e tinha muitos anos de experiência em termos de coordenação de cursos e desenvolvimento da Escola. Mas outra coisa é assumir a gestão de uma Escola. Não foi uma tarefa fácil, uma vez que o País enfrentou situações graves que se repercutiram, naturalmente, nas instituições de ensino superior. Mas eu sinto que, apesar dos constrangimentos, consegui que a Escola se tenha desenvolvido. Penso que existiu uma confiança na equipa directiva por parte da Escola e dos próprios estudantes e funcionários no trabalho desenvolvido. Eu apostei muito em trabalho partilhado. Tudo é discutido com as pessoas. As decisões não são tomadas sem essa partilha e são balizadas entre aquilo que é uma orientação que existe em termos da projecção da Escola, mas sempre enquadrada naquilo que são os objectivos e o desenvolvimento do próprio Instituto Politécnico de Santarém.

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